sábado, 31 de outubro de 2009

Cinquentinhas


Dor não tem nada haver com amargura, tudo o que acontece é feito pra gente aprender cada vez mais

Punção, você já fez punção? A punção não é exame de eficácia duvidosa pela considerável possibilidade de contaminação do material puncionado? - pergunta/responde a neófita, a repetir a justificação de outro médico, em relação à punção da tireóide que não acusou o carcinoma. Não, em absoluto. A punção é fundamental para o seu caso. Pois estou em novo caso, 'coisa' inesperada, surgida do nada, descoberta no exame de ultrassom, enquanto eu pensava sobre a meleca que se esparramava do meu pescoço para o final da minha bochecha, na mais expandido exame da área na qual se encontrava a tireóide que eu já fiz. Precisava essa meleca toda? Precisava? Precisava. Descoberta ‘a coisa’ surge a necessidade de sabermos o que ‘a coisa’ é. Surge a conversa com o convênio sobre ‘a coisa’ e o convencimento sobre o não envolvimento da ‘coisa’ com a 'coisa anterior' - ao menos, a esperança de que ‘as coisas’ não tenham qualquer relação. Em seguida, a fase de marcar dia e horário, de preferência no sábado, para a famosa punção. Bastaria ligar? Não, o protocolo do hospital define que para esse tipo de exame o paciente compareça com o ultrassom para que o médico decida sobre a punção. Mas o ultrassom foi feito aí, sábado passado, e vocês tem o resultado. Passados quinze minutos e sete pessoas depois, ligo para o meu filho e peço o nome do médico escrito no laudo do exame que descobriu ‘a coisa’. Pesquiso, encontro o médico, relembro o exame e peço para que ele realize a punção. Encaixe imediato, na manhã deste sábado.
Quatro punções no mesmo local, a última mais demorada, as mãos bem treinadas e seguras a manejar a seringa com a fina agulha e a segurar o aparelho de ultrassom com a imagem aumentada no monitor ao lado. Eu olhava para o monitor e queria fazer algo para ajudar e o ficar quieta e relaxada era o máximo que eu podia fazer. E rezar. Rezar eu podia. Às vezes, o médico olhava para o meu rosto e perguntava se estava tudo bem e de certa forma eu me sentia grata por estar lá, por ter encontrado um médico capaz e por ter coragem para fazer outro exame e pesquisar ‘coisa nova’, com a imensa esperança de que não seja nada, no mínimo, uma ‘coisa a toa’ e bem amistosa.

Imagem de Doisneau

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Menina-mulher

Fui menina menina mesmo, criança feliz que brincou de boneca, de esconde-esconde, jogou queimada, brincou de polícia e ladrão, pulou amarelinha, adorava o balanço, o gira-gira e a estrutura parecida com uma casa feita com um monte de barra de ferro aredondado para ficar dependurada. Desde cedo nadei feito peixe, com minhas pernas longas corria com facilidade e aos dezoito anos, quando pude usar o primeiro salto meio alto e arrumar o cabelo, não queria mais salto nem cabelo arrumado, queria ser livre e feliz. Por isso, até hoje, não gosto de coisa artificial, não consigo ficar parada muito tempo e não entendo muito sobre penteados estruturados feito ninho de passarinho ou montanha de algodão. Acho que essa moça teve que dormir sentada para não estragar o cabelão. Meu Deus, quanto esforço.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Azul e branco

“Κλείσε στην καρδιά σου την Ελλάδα και θα αισθανθείς κάθε είδους μεγαλείον“
Dionísio Solomós

“Leve a Grécia no teu coração e sentirá todos as formas de grandeza“

O inigualável espírito grego e a alegria de viver que somente os gregos têm.
A convicção da importância da liberdade do sublime ser humano. O mundo e a vida compreendidos como dádivas a serem apreciadas com sabedoria e gozo. Justiça, sensatez, as belezas mental e física, a harmonia e a ordem sobre o caos. O grego é eminentemente social e compartilhar as refeições, bons vinhos e a vida, está entre seus prazeres e é motivo de celebração descontraída e informal, algo que satisfaz a alma.

Θήρα
Σαντορίνη
3.700 a.C. na ilha de Creta a civilização minóica e 128 quilômetros distante, ao norte, na ilha de Thira (Θήρα) em sua parte sul, perto da Akrotiri, existem afrescos, mosaicos e cerâmicas minóicas que demonstram a ligação existente entre essas duas importantes ilhas gregas.
Chamada de Strongilí (Στρογγύλη, redonda) há os que acreditam que sua antiga formação incluía as ilhas de Thirassia e Aspronisi, transformadas após a imensa erupção vulcânica ocorrida em 1600 a.C., que deixou a cratera que marca o meio da ilha, a caldeira coberta de água.
Há estudos que demonstram a existência de fragmentos da ilha em locais bem distantes, em outros países, tamanha a força da erupção ocorrida. Um pouco mais de história não esclarecida? No passado, naquele arquipélago, teria ocorrido o desaparecimento do continente da Atlântida.
Além de Strongilí a ilha também foi chamada de Kalistí (Καλλίστη, a mais bela) e Santorini, em homenagem à Santa Irene, nome proveniente da invasão veneziana durante a terceira cruzada. Para os gregos ela é Thira (Θήρα). A Thira nascida da maior explosão de vulcão ocorrida na terra.
Acreditam que Jules Verne em “A ilha misteriosa”, teria relatado a erupção do vulcão de Santorini.
Labirintos brancos formados por ruas, vielas, becos, pátios, casas, varandas e o azul do Egeu ao fundo são parte da paisagem fantástica apreciada por todos, sem exceção. Um imenso penhasco escuro e a cratera do vulcão que fica exatamente no centro do semicírculo formado pelo arquipélago. O porto e as opções divertidas para a chegada ao topo do penhasco, inclusos os 587 degraus existentes. Fira, mais penhascos multicoloridos, Nea Kameni, Palia Kameni, Firostefani, Imerovigli, Oia e o mais esplêndido pôr-do-sol existente, soberbo na mistura das inúmeras tonalidades de rosa, vermelho, lilás e roxo. Praia vermelha, areia vulcânica, Kamari, Perissa, a montanha do profeta Elias, cinzas vulcânicas, parreiras e o sensacional vinho grego. A geografia da ilha é outra de suas fantásticas atrações. Brisa fresca e as encantadoras vilas incrustadas no alto das montanhas. Santorini não é a ilha ideal para quem busca apenas praia e sol, mas lá, garanto, a praia será esquecida.
Mais ilhas que formam as Cíclades? Paros, Ios e Mikonos.
De fato, naquele paraíso não importa se você se hospeda em uma vila milionária ou na mais simples pousada, é o cenário que torna Santorini mágica e inesquecível.
Aos curiosos: uma das vilas mais exclusivas? The Tsitouras, em Firostefani, de propriedade do advogado grego Dimitris Tsitouras, a quem Versace convenceu deixar de lado o Direito para se transformar em designer.

A vila foi construída em 1780 e foi utilizada como escola, agência do correio e residência. Em 1985, foi adquirida por Tsitouras que a transformou na sede de sua coleção de antiguidades, com mais de 4000 ítens, e no hotel que recebeu de Callas a Joan Kennedy, Gaultier, Moschino e outros, mais ou menos famosos.
Composto por seis ambientes distintos: The house of sea (495 euros o casal), the house of winds (830 euros o casal), the house of portraits (835 euros o casal), the house of porcelain (695 euros o casal), the house of Nureyev (695 euros o casal), the TC villa (3.500 euros acomodações para uma a seis pessoas) as diárias para a temporada 2010, tiveram considerável redução e incluem taxas, translado do e para o aeroporto de Santorini, café da manhã à la carte, mini bar e sunset cocktail. As imagens do Tsitouras ilustram este texto.

Obs.: Small pets are allowed

Resonant chemistry


Une liaison pornographique, 1999, de Frédéric Fonteyne, é um filme de amor não realizado, com a excelente Nathalie Bayer (melhor atriz do festival de Veneza com esse filme) e Sergi López.
Nathalie Bayer, de quem sou fã, é uma das melhores atrizes francesas, em cena tem um carisma inigualável, ganhou quatro César, trabalhou com Truffaut, Godard (sob sua direção ganhou um César) e Chabrol. Sua filha única, Laura Smet, também atriz, é fruto de seu casamento de quatro anos com o ídolo da música francesa Johnny Halliday.
O catalão Sergi López atuou sob a direção de Guillermo Del Toro no filme El Laberinto Del Fauno (2006) e fez o papel do insuportável marido de Juliette Binoche no filme Décalage Horaire (2002) de Danièle Thompson.
Une liaison pornographie tem elenco pequeno, os principais personagens são conhecidos por ela e ele.
Um homem e uma mulher se conhecem através de anúncio publicado numa revista - experiência inédita para ambos - marcam encontro num café, ela define as condições e os dois partem para um hotel antigo próximo. Os dois são independentes, livres, não estão envolvidos com outras pessoas, são solitários e, aparentemente, buscam sexo sem envolvimento. Não querem compartilhar suas vidas, sequer trocam informações básicas como nome e profissão. São pessoas sérias e com princípios. Nem o filme nem o comportamento dos personagens é pornográfico. Na realidade, os dois se encantam, se apaixonam, compartilham de ideias semelhantes, numa das tardes auxiliam a um morador idoso do hotel e solidários o acompanham na ambulância até o hospital. Os dois querem se envolver e são felizes juntos mas, às vezes e sem motivo, por insegurança, pela ausência da iniciativa apropriada, pela falta de coragem, oportunidade como a deles é perdida. Este filme, inteligente e introspectivo, expõe com elegância uma relação sexual não convencional. Nathalie e Sergi se expressam com autenticidade, naturalidade e compartilham de química inigualável. Une liaison pornographique é um filme maduro, erótico e romântico.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Cada dia mais rica de humanidade


Cida Garcia encantou e encanta a Machado, de Minas Gerais, encantou e encanta São Paulo, Rio de Janeiro, onde quer que Cida vá ela encanta as pessoas, os lugares. Agora, Cida novamente encanta Portugal. Alguns meses do ano lá, outros aqui, no Brasil, foi dela que recebi um email sobre a bela livraria do Lello, na cidade de Porto, em Portugal.
Por coincidência, nesses dias de idas e vindas, de caminhos novos, esquecidos, alterados e desconhecidos, lembrei das igrejas antigas do Brasil colônia, do Brasil do primeiros séculos e do quanto me impressionam, nas quais não consigo me concentrar e orar, sinto o aroma da madeira envelhecida e meus olhos se enchem com os detalhes, os enfeites sem fim. Foi a esse tempo que algumas imagens da livraria Lello e Irmão me levaram. Essa livraria que eu desconhecia e que Cida, com seu constante carinho, me ensinou.


Foi delicioso o exercício de imaginar a sensação, a impressão ao entrar em outro tempo e mundo, através da porta da Lello e Irmão. Ainda mais para mim, fascinada por livrarias e papelarias elegantes, nelas permaneço horas em pura leveza e felicidade.
Procurei algo sobre esse lugar mágico e aprendi que o início de sua história data de 1869, então conhecida como Livraria Internacional de Ernesto Chardron, posteriormente vendida à Lugan & Genelioux e, em 1894, adquirida por José Pinto de Sousa Lello e seu irmão Antônio Lello, com a mudança da razão social para Sociedade José Pinto Sousa Lello & Irmão a Livraria Lello e Irmão. O imóvel que aparece nas imagens teria sido construído em 1906 e à época descrita como a mais bonita livraria do mundo.

Deve ser fantástica a iluminação que vem através do vitral, apreciar os detalhes da madeira entalhada, da escada vermelha, em um andar feita de madeira e em outro de cimento armado. Por enquanto, curtir as imagens pesquisadas na internet, apreciar essa bela obra, imaginar qual de seus recantos teria sido escolhido para cenário de um dos filmes da saga do bruxo Potter e, algum dia, em Portugal, encontrar todo esse encanto.

Rua das Carmelitas, 144, próxima da zona histórica do Porto, cidade do Porto, Portugal.

Para os amantes de livros, the top shelves, segundo o Guardian:
- Boekhandel Selexyz Dominicanen, na Holanda, "a bookstore made in heaven".
- Livraria Lello e Irmão, Porto, Portugal.
- Secret Headquarters, Los Angeles, EUA.
- Borders, Glasgow, Escócia, UK.
- Scarthin Book, Derbyshire, UK.
- Posada Books, Bruxelas, Bélgica.
- Pendulo, cidade do México, México.
- Keibunsya, Kioto, Japão.
- Hatchards, Londres, UK.

Em tempo de compra de livros pela internet, da provável briga entre os livros tradicionais e os livros on line, além do kindle electronic, não podemos esquecer das livrarias.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Uma alma precisa de outra alma

Cansaço, hoje, seu nome é o meu. Acordar cedo para a consulta com a turma da cabeça e pescoço, a turma que eu considerei esquecida, deixada de lado para nunca mais, cuja missão foi cumprida em maio de 2007. Por que retornar agora, em 2009? Somos tão mal orientados, hiposuficientes diante de profissionais especialistas capazes de tratar com leviandade assuntos tão importantes, capazes de nos transmitir ideias equivocadas, procedimentos errados, indevidos e incompletos.
Imagem de Lazlo Balogh



Aos que tiveram câncer na tireóide, aos que conhecem pessoas que tiveram câncer na tireóide e aos que batem três vezes na madeira ao ouvirem a palavra câncer: Por favor, desconsiderem qualquer piadinha ou frase infeliz como a que costuma ser dita por profissionais mais infelizes ainda: "Se você tivesse que escolher um câncer, escolha o da tireóide." Isto é non-sense, é lixo, é brincadeira sem gosto, é resultado de comportamento amador. Quantas pessoas tiveram câncer na tireóide e após a cirurgia se consideram curadas? Quanto muito, vão ao endocrinologista uma, duas vezes por ano, para os exames que definem se a dosagem de hormônio sintético está equilibrada e para a infalível receita do remedinho para emagrecimento? Quantas pessoas que tiveram câncer na tireóide conhecem as possíveis consequências? Estão atentas aos sinais e aprendem mais sobre seus organismos? Quantas pessoas tiveram câncer na tireóide e analisam regularmente a dosagem da tiroglobulina?
Tiroglobulina é uma glicoproteína produzida pelas células foliculares da tireóide. Qualquer doença associada com uma massa ou com o aumento da atividade do tecido tiroidiano irá aumentar os níveis séricos de tiroglobulina. Devido ao seu aumento ocorrer em praticamente todas as doenças tiroidianas, a tiroglobulina não tem valor na discriminação entre doença benigna e maligna, porém tem um importante papel na abordagem do câncer de tireóide após cirurgia ou ablação radioisotópica do tecido tiroidiano normal em pacientes portadores de neoplasia - qualquer tiroglobulina detectavel deveria indicar doença persistente. Após a cirurgia, os níveis de tiroglobulina sérica podem se elevar temporariamente, retornando aos níveis normais dentro de 4 a 6 semanas. Em conjunto com a varredura com I131, a tiroglobulina pode detectar a presença de metástases.
Nas doenças neoplásicas da tiróide, a tiroglobulina (Tg) é fundamental e de alta sensibilidade no seguimento dos pacientes com câncer diferenciado da tiróide (papilífero e folicular), enquanto que a dosagem de calcitonina é obrigatória para o diagnóstico e seguimento do câncer medular da tiróide.
Como a tireóide, ou a ausência dela, afeta nossos ossos, nosso coração, nosso organismo? Por favor, façam exames, aprendam mais, observem seus organismos e, principalmente, não temam, não temamos. Vivemos mais, por isso, devemos fazer exames periódicos para que possamos identificar o início de qualquer enfermidade.


À tarde outras duas consultas com especialistas distintos. Tempo dedicado para espera e mais tempo ainda dedicado pelos profissionais para entender o que acontece ou deixa de acontecer com este outro eu paciente. O hospital do câncer tem sido escola; cansativa, desgastante e sensível escola. No intervalo entre a consulta matutina e as duas vespertinas, no tempo que deveria ser dedicado ao almoço calmo e em paz, corri ao escritório para adiantar a demanda recém surgida.
No comecinho da noite, exausta, cansada por dentro, encontro a amiga querida que durante conversa séria me convenceu a vir a esse lugar. Imagine a que ponto chegamos, nos encontrarmos na sala de espera dos consultórios de um dos ambulatórios do hospital do câncer. Falamos sobre os livros que líamos, sobre exames, consultas, descobertas, trabalho, filhos, vida e você, querida amiga, tão gentil, ainda esperou minha última consulta para me levar de carona pra casa. Eu sei, entendi o cigarro aceso, assim como entendo sobre ansiedade, sobre depressão, sobre válvula de escape, sobre solidão, só lhe peço de novo para desconsiderar as mágoas. Deixe as mágoas de lado, querida, deixe-as para trás. Mágoas alimentam e interessam apenas aos que as praticam.


À noite, depois do banho e da energia revigorada para molhar a terra nos vasos das plantas sedentas, brincar com o cão e sentar ao lado do filho para explicar o que faço, o que pode ser ou não, vejo o telefonema antes não visto e por curto tempo retomo o rumo - foco, querida, foco limpo e cristalino, a importância devida à tudo nesta vida. Eu sei, entendo, mas não basta que somente eu saiba e entenda.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Gatos alimentados e bem tratados são fiéis, constantes e pulam menos

Façamos assim, deixe-me pensar um pouco, sim, façamos assim: não permitiremos que quaisquer deficiências de conhecimento - o termo deficiência parece pesado, mas minha criatividade anda em baixa; eu falava sobre deficiência de conhecimento, então, não permitamos que o conhecimento limitado também limite a atuação e atrapalhe o bom resultado. Sem dúvida, ao longo de tantos anos, ainda mais aos que tiveram a alternativa - e o trabalho duro, dobrado, bem mais sacrificado - de atuarem em cargos de chefia de diversas áreas de uma mesma empresa e acumularam muito mais conhecimento e experiência, algumas demandas são mais fáceis, ao menos, conhecidas, por estarem mais aptos a efetuá-las. Sim, eu sei, nem sempre a coisa é justa e no final do mês a gente entende bem a diferença, mas, puxa vida!, tente parar de pensar que o “pulo do gato” - a bobeira que alguns pensam ser o segredo do segredo, que não se passa nem para filho dileto - é composto por todas as informações existentes. Como? Mas você recebeu o modelo integral e guardou o pulo, a cama, a ração e o inexistente gato e não disse que aquele modelo foi mandado pela própria matriz? sequer explicou o que deveria e não sabia explicar? - desculpe, combinamos que deixaríamos as deficiências de lado - e o pior: não disponibilizou a forma para que o recheio pudesse ser feito com mais eficácia, rapidez e resultado? Finjo que não importa sua entrega somente do índice - que não dizia nada, ao contrário, só complicava a coisa - do mesmo jeito que finjo não importar o tempo dedicado para encontrar estrutura mais simples e inserida no padrão internacional definido. A coisa pode parecer confusa, mas no fundo se trata de segurar sua própria limitação, sua insegurança e, por fim, aprender que existem pessoas que querem ajudar e são capazes de fazer a coisa andar mais, com mais eficácia e bem melhor. Será que você ainda não percebeu que esse seu jeito foi a principal causa do comportamento idêntico de quatro pessoas tão distintas, que lidaram com você? Eu sei, também tenho um caminhão de coisas a aprender, principalmente, como conviver com tantos pulos de inexistentes gatos que você insiste em alimentar.
Imagem de Skree Sukplang

Fluidez


Preciso ir à praia, mergulhar o corpo todo na água, sentir o aroma do mar, impregnar-me do iodo presente no litoral. Preciso ir à praia e mergulhar o corpo todo no mar. Deixar na água que vai o cansaço e qualquer chateação, pegar da água que vem, boa energia e vida.

sábado, 24 de outubro de 2009

Mulher é elástica

Ânimo. É preciso ânimo para a maratona médicos-exames. É preciso organização e perseverança para conseguir horários, de tal forma cadenciados, que a ida à determinado local resulte no maior número possível de procedimentos realizados. É preciso jeito para esquecer significados de palavras como sono, irritação, cansaço e em vinte e quatro horas realizar tarefas, concluir processos, ir à vários lugares, fortalecer a paciência, controlar o jejum, o mal estar, os medicamentos, manter a mente lúcida para reconhecer efeitos, a fala clara para explicar o máximo e a mente calma para entender tudo. É preciso buscar em cada especialista tudo o que puder ser aprendido e agregar o conhecimento recém adquirido de forma positiva. É preciso não se assustar, é preciso aproveitar bem os momentos de espera e, principalmente, é preciso fortalecer a fé e manter o bom humor em alta para que haja paz.
O braço roxo e dolorido pela barbeiragem da assistente do laboratório, que encheu inúmeros frasquinhos de sangue, foi compensado pela recém apresentada bomba injetora de iodo, que trouxe o brilho cintilante e multicolorido às imagens obtidas pela máquina, 2009 - uma odisséia na maca, que circulava sobre minha cabeça com luzes vermelhas em alta velocidade. Se algum contato extraordinário de grau certo aconteceu, foi naquele exato momento. Relaxei, sim. Colaboro o quanto posso, às vezes, um pouquinho mais do que realmente posso.



É preciso fôlego e concentração para priorizar o que se realiza naquele exato momento, assim, obrigações são cumpridas e minuto algum é desperdiçado ou devido. Por sorte, e isso não fez parte de qualquer planejamento, no sábado passado acordei super animada, tive fôlego e vida de gata e durante doze horas seguidas fiquei no escritório para realizar várias tarefas. A chuva forte me fez esquecer a hora do almoço, mas, à noite, quando meu filho foi me buscar antes da saída com a namorada - a ideia original era voltar a pé, esticar as pernas e a mente, entrar em alguma livraria ou cinema - eu parecia uma boneca de pano cansada e chorosa, uma criança que reclamava com o pai sobre a vida que não queria mais. Lógico que ele me coloca na linha, lógico que isso passa. E na segunda seguinte, feriado decretado pelo sindicato, mais algumas horas passadas no escritório, daquele feita não para colocar em dia, mas para adiantar a lida e acrescentar mais tempo a meu favor no invisível banco de horas.



Foi nesse meio tempo que curti e conclui o livro, A Pérola, de John Steinbeck, e aprendi mais sobre comportamentos e reações humanas. Incorporei uma parte de Kino e alimentei minha parte Juana, para sozinha virar duas, três de mim. Levei comigo o livro Doidas e Santas, de Martha Medeiros, composto por crônicas escritas entre 2005 e 2008, mais fácil de ler nos dias de várias senhas e diversos sinais sonoros emitidos por painéis eletrônicos, que nos indicam os números de guichês e consultórios, os novos lugares frequentados por esta menina que não perdeu a mania de nos dias mais puxados, desafiar o bom senso e caminhar por lugares antes nunca caminhados, para se sentir capaz? para desafiar o limite? para fazer algo diferente por escolha? não sei.



Ultrassom só faltou fazerem da minha alma e dos meus pés. Eu não sabia que faziam ultrassom nos olhos! Pois fazem, sim. A doutora não permite que dilatemos a pupila de pessoas desacompanhadas... por favor, diga a doutora para deixar de lado o preconceito social, sexual e de credo, por que não pretendo encontrar acompanhante algum nas próximas duas semanas. Olhos mais do que dilatados - os diversos colírios pingados limparam meus olhos, fizeram com que eu enxergasse mais e melhor - minhas pupilas pareciam duas jabuticabas. Posso forçar a visão, doutora? Daqui vou direto ao escritório, aumento o tamanho das letras na tela do computador, faço o que for necessário para cumprir minhas tarefas.
Com a promessa de que no máximo eu conseguiria uma dor de cabeça, naquele dia, a lida rendeu além das seis horas de dilatação e mais uma vez tirei meu filho de seus compromissos para me buscar, perto da meia noite, tendo por co-piloto o alegre cão, que mantinha a cabeça para fora da janela do carro, as orelhas compridas e peludas balançadas pelo vento. Além de outras tarefas, as várias páginas traduzidas direitinho seguiram para Londres, como deveria ser.


Neste sábado, jejum absoluto, sede - como a gente sente mais sede quando não pode beber água - foram quatro horas seguidas de exames. Exausta depois da brincadeira, no último exame soltei sonora gargalhada, tomei um baldinho de suco de melancia, um banho refrescante e dormi.





Alguém se lembra do desenho animado Os Incríveis? Não o da Pixar, que é legalzinho (só não sei por que usaram o mesmo nome), mas os três incríveis, o homem mola (que tinha a mesma voz do Batatinha), o elástico e o homem água? Não? Alguém? E Os Herculóides? Banana Split? Rin tin tin? Shazzan? Corrida maluca, Manda Chuva, Pepe legal e Mightor? Ah, do Coelho Ricochete, todo mundo lembra, né? Bob pai e bibo filho? O túnel do tempo? Perdidos no espaço? Terra de gigantes?
Alguém sabe cantar a música do Hurashimataro? E dos elefantes no Mogli? Enfim, nestas duas semanas me senti a mulher elástica. Super elástica.

Mulher e garota

Iiiiiuuupiii! Presente de aniversário adiantado. Ganhei minha agenda 2010 moleskine, com capa vermelha e um monte de adesivos para fazer a festa. Adorei. Vermelha! Não é qualquer vermelho, mas um clássico que não puxa pro escuro, quase vinho, nem pro claro, o rosa escuro. É o vermelho na medida exata. Cor de batom importado que eu gostava de usar nos dias de inverno, sem qualquer outra maquiagem no rosto. Clássico. Rosa escuro é rosa escuro e vinho é vinho, mas o vermelho desta agenda de capa dura para anotações diárias - diferente da agenda 2009, capa mole e preta para anotações semanais - trouxe aquele algo a mais, inesperado, pra mexer com a gente e deixar tudo mais leve. Afinal, as maratonas podem ser entremeadas por pausas geniais. Fiquei tão animada que me deu vontade de usar batom, passar rímel nos cílios. Deu vontade de me redescobrir, me encontrar. Muito prazer.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

O sonho extravasou pro dia e encheu a vida

A vida só é possível
reinventada.

Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... — mais nada.

Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...

Só — no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só — na treva,
fico: recebida e dada.

Porque a vida, a vida,
a vida, a vida só é possível
reinventada.

* * *

Les mots remplissent tout l’univers, comme la lumière, mais à la différence de la lumière,
ils n’ont pas d’ombre.
Le refrain fait baisser la température.
C’est tout de même curieux, un objet sans ombre.
Faute d’avoir une ombre, je pensais vaguement que chaque mot avait son opposé,
son antonyme. Je pensais trop vaguement : tous les mots n’ont pas d’antonyme.
Un mot qui n’a pas d’antonyme me paraît, comme un corps sans ombre, une curieuse anomalie.
La température appartient à un ordre.
Pourtant, il en est bien ainsi.
J’ai tenté de comprendre ce que peut recouvrir cette notion d’antonyme. Jusqu’à présent,
elle me paraît assez floue.
Homme est antonyme de Femme, et réciproquement, mais Fille et Garçon ne sont pas antonymes.
D’ailleurs Fils non plus n’a pas d’antonyme. Il semble
qu’on ne naisse pas antonyme de l’autre sexe, mais qu’on le devienne
par les opérations de conjugaison.
Contrairement à ce que j’aurais pensé a priori (mais apparemment, j’avais à ce sujet
toutes sortes d’idées fausses) l’antonymie ne fonctionne pas seulement
par couple, loin de là. Chez les antonymes, la polygamie semble
correspondre à la norme, et la monogamie fait figure d’exception. Dans tous les cas,
cependant, existent des systèmes non clos, du type Hier,
Aujourd’hui, Demain. Hier et Demain sont antonymes d’Aujourd’hui, Aujourd’hui
et Demain sont antonymes d’Hier, mais seul Aujourd’hui est antonyme
de Demain. En effet, Hier n’est pas l’antonyme de Demain, le passé
n’étant pas l’exact opposé du futur.
Forme a de nombreux antonymes, dont Fond, et Sujet, qui de leur côté n’ont pas d’antonyme.
De même pour Esprit qui a pour antonyme, entre autres, Lettre,
tandis que Lettre ne dispose d’aucun antonyme. Du moins dans mon dictionnaire.

* * *

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Imagem de Doisneau

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

O que a memória ama fica eterno


Domingo à tarde, calor, sol, tempo colorido, caminhada como o filho e o cão - que tal desviar um pouco o percurso? Subimos a escada, o cão comportado teve sua guia amarrada no corrimão e na primeira olhada encontramos a carinha do Tom Jobim, aí, em cima, ao lado da foto da neta de Jorge Amado, entre modelos, corpos, imagens geniais de Otto Stupakoff, a visão única do talentoso fotógrafo, que também captou a beleza de Sharon Tate e o olhar tão característico de Jack Nicholson. Pausa. Adorável e tranquila pausa.

Mulher é desdobrável

Desculpe, senhora, mas preciso de silêncio, preciso recuperar energia, preciso de um pouco de paz para seguir em frente e dar conta de tudo no monte de horas que virão pela frente, até este dia acabar. Eu sei, entendo, reconheço seu orgulho por ter filhos formados, entendi que sua filha mais velha tem ciúmes dos irmãos, que sua filha do meio deixa a criança com a senhora para ir trabalhar e que a senhora trata sua neta como filha - se a senhora tivesse ideia do vespeiro que se mete ao tratar mãe e filha como se irmãs fossem - mas ontem voltei do escritório bem tarde, hoje acordei às cinco e meia da manhã para estar aqui, por conta desse exame chato, e a senhora não para de falar um segundinho sequer, nem se cansa de tanto falar. Sim, sim acho que foi seu celular que tocou. Como? Não vai tirar uma folguinha do monólogo para abrir o armário e tirar o celular da sua bolsa? Ai, meu Deus, agora é a descrição da dor do exame por conta do anzol que está em seu peito. Faço o quê? Pronto, chegou mais uma senhora para ouvir seu monólogo e eu poderei encostar minha cabeça na parede e fechar meus olhos, mais uma, duas, três, quatro? A enfermeira fala tão alto, fala alto e é atrapalhada, a atendente anda pelo corredor e o salto alto faz toc toc toc toc toc com percussão, não reconheço bem o som, escola de samba talvez. De repente, formamos um petit comitê de mulheres vestidas com o mesmo avental, modelito padrão, algumas quietas, outras falantes, todas com algum receio, uma das médicas não consegue encontrar a paciente que sumiu e falam meu nome: Nunca antes fiquei tão feliz ao ser chamada para a mamografia.

Imagem de Anabel Veloso, por Francisco Bonilla

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

O olhar de Deus pondo nas coisas uma claridade inefável

“O câncer é uma moléstia de perfeita curabilidade, quando tratada a tempo.” Esta frase foi dita em 1933, pelo Professor Doutor Antônio Prudente de Moraes, excelente, vocacional e dedicado médico, neto do primeiro presidente civil do Brasil e casado com a admirável Carmen Prudente.
Em 1934, Antônio Prudente fundou a Associação Paulista de Combate ao Câncer - APCC e a incansável e sempre sorridente Carmen criou a Rede Feminina de Combate ao Câncer - RFCC, formada por voluntárias vestidas com aventais cor-de-rosa. O hospital do câncer da cidade de São Paulo continua na mesma rua, uma travessa da Tamandaré e da Vergueiro, mas o prédio construído com ajuda e doações foi reformado, modernizado e a entrada não é mais feita de vidro sustentado
por ferro pintado de azul. Os lençóis, as roupas usadas pelos pacientes e os brinquedos das crianças com os cabelos raspados, não são mais provenientes das doações feitas pela população da cidade e do Estado de São Paulo, graças ao empenho de dona Carmen e das voluntárias. Era ao hospital do câncer que minha mãe me levava para entregar roupas e brinquedos e era ao mesmo local, que eu levava meu filho para aprender o significado de doar. O sorriso e o carinho de dona Carmen sempre me encantaram e me lembro bem de seu cabelo curtinho e meio azulado, igual ao da minha madrinha Fanny. Carmen Prudente era feita de dedicação, decisão e carinho, assim como minha mãe, que a conhecia e admirava. Essas duas queridas mulheres de estatura baixa, perseverantes e com sorrisos encantadores, vieram ao mundo para fazer verdadeira diferença. Ambas abnegadas e benemerentes, escolheram os filhos que quiseram adotar.
Na década de oitenta a palavra câncer surgiu de forma inesperada e me levou de volta ao mesmo hospital, para buscar vacinas que trouxessem algum alívio para meu pai. À época, através da mesma porta envidraçada com a parte de ferro pintada de azul, as crianças com seus cabelos raspados confirmavam a certeza de que a doença desconhece o que é justo, ou não. Agora, passados vinte e quatro anos da morte de meu pai, e um mês depois da conversa séria que tive com pessoa tão querida, um dos anjos que surgiu em minha vida - me inspirei em você e a bendisse o tempo todo para que sua vida seja plena de amor, saúde, bênçãos e proteção - me enchi de coragem, segurei o temor, fingi que sou forte e fui aprender mais sobre câncer, exames e procedimentos. O amparo, o que me permitiu uma certa leveza e me integrou ao lugar, ao movimento daquele hospital, foram as adoráveis imagens de dona Carmen e seu marido, que enfeitam as paredes do ambulatório feminino, foi rever os aventais com a idêntica tonalidade cor-de-rosa das senhoras voluntárias e com tudo isso, trazer minha mãe de volta, bem perto de mim.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Sem limites


Cansaço? Desânimo? Apatia? Ora, existe muito chão pela frente...



Dorothy de Low, 99 anos, Ruth Frith, 100 anos, Olga Kotelko, 90 anos e Reg Trewin, 101 anos, em Campeonato na Australia.
Dorothy joga ping-pong há mais de quarenta anos, competiu em diversos torneiros internacionais e treina com o campeão australiano Paul Pinkewich, idade não identificada.


Imagens de Craig Golding

Cinquentinhas


Na mala a brisa comigo a lua vem e brilha

Às vezes me sinto assim, exatamente deste jeito: Uma garotinha sozinha, que respeita a linha amarela, diante de duas portas a começar alguma jornada.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Mistério columbino

Cristovão Colombo, o famoso navegador genovês, não, Cristovão Colombo, o famoso navegador catalão, irmão de Diego e pai de Hernando, era filho de um pobre tecelão italiano, quer dizer, era filho (legítimo ou ilegítimo - até isso tentam descobrir sobre o descobridor) de um nobre espanhol, iniciou suas atividades marítimas como corsário, fez fortuna, ganhou as embarcações Nina, Pinta e Santa Maria com a condição de se tornar um bom rapaz e, após contato de terceiro grau com seu superior extraterrestre, zarpou direto para a América com o único intuito de proteger os cocoons de venusianos que passavam férias na Terra. Os restos de Colombo, ou melhor, os pequenos pedacinhos de ossos que presumem ser de Colombo, foram da Espanha à República Dominicana, voltaram à Espanha e foram depositados na catedral de Barcelona, de onde sairam para serem examinados em diversos laboratórios super modernos de DNA. O que descobriram? Se considerarmos o vai e volta da urna mortuária do moço e as precárias condições de preservarção dos ossos que podem ser, ou não, dele, além dos ossos exumados de um de seus irmãos e de seu filho, descobriram que o laboratório mais avançado pode não descobrir nada. Mudem todos os livros de história e as perguntas de vestibular. A origem de Colombo é um mistério e talvez ele sequer tenha existido.