terça-feira, 6 de dezembro de 2011


Este é excelente presente, coisa para ser lida e relida, esquecida e reaprendida com certa frequência. Poema de Constantino Kavafis certamente postado em outra ocasião aqui, sempre sábio e pertinente. Aproveitem.

"Se partires um dia rumo a Ítaca, 
faz votos de que o caminho seja longo, 
repleto de aventuras, repleto de saber. 
Nem Lestrigões nem os Ciclopes 
nem o colérico Posídon te intimidem; 
eles no teu caminho jamais encontrarás 
se altivo for teu pensamento, se sutil 
emoção teu corpo e teu espírito tocar. 
Nem Lestrigões nem os Ciclopes 
nem o bravio Posídon hás de ver, 
se tu mesmo não os levares dentro da alma, 
se tua alma não os puser diante de ti.

Faz votos de que o caminho seja longo. 
Numerosas serão as manhãs de verão 
nas quais, com que prazer, com que alegria, 
tu hás de entrar pela primeira vez um porto 
para correr as lojas dos fenícios 
e belas mercancias adquirir: 
madrepérolas, corais, âmbares, ébanos, 
e perfumes sensuais de toda a espécie, 
quanto houver de aromas deleitosos. 
A muitas cidades do Egito peregrina 
para aprender, para aprender dos doutos.

Tem todo o tempo Ítaca na mente. 
Estás predestinado a ali chegar. 
Mas não apresses a viagem nunca. 
Melhor muitos anos levares de jornada 
e fundeares na ilha velho enfim, 
rico de quanto ganhaste no caminho, 
sem esperar riquezas que Ítaca te desse. 
Uma bela viagem deu-te Ítaca. 
Sem ela não te ponhas a caminho. 
Mais do que isso não lhe cumpre dar-te.

Ítaca não te iludiu, se a achas pobre. 
Tu te tornaste sábio, um homem de experiência, 
e agora sabes o que significam Ítacas."

Voltar também faz parte do bom caminho

Acostumar-se com algo é ultrapassado, talvez até inapropriado. Novidades sempre. Nossa (combalida) capacidade de adaptação é constantemente desafiada. Como? Mais de um ano longe deste blog? Ah, querida, você encontrou tanta novidade (gráficos, estatísticas, novo layout interno, dados sem-fim, informações úteis e inúteis) e pensou ser bem mais interessante sair desta página e cuidar da vida, curtir um bom livro e música de primeira, bater um longo papo com pessoas queridas, passear com o cão, ir ao cinema, preparar alguma gostosura (aprendeu a cozinhar gostosuras e, principalmente, aprendeu a gostar de cozinhar). Mas persistente e um tanto curiosa respira fundo, alonga a coluna, cruza os braços e finca o pé direito enquanto pensa: Este aqui também é meu pedaço, sem dúvida amorosamente compartilhado, e resolve ficar enquanto quiser ficar. Eu sei bem como é. Você oscilou entre o que chatice tanta mudança e o fato desta coisa cheia de textos e fotos e vídeos e poesias ter sido, em parte, o que ajudou a segurar o que se apresentou para ser segurado - e o que se apresentou para ser segurado foi um monstrengo malvado e indócil do tamanho do mundo, ou, uma pena suave e frágil, porque o todo não passa de nada dependendo da perspectiva; assim, o caos se  torna a melhor fonte de criação e superação. Afinal, o caos é o princípio de tudo.
Lições, preciosas lições, que somente um ser totalmente desprovido de sensibilidade e inteligência - da mediana, nada muito especial - deixaria de reconhecer e aprender e entender que a vida, bom a vida tem uma criatividade surpreendente e a disposição de dedicada e incansável professora que, carinhosamente, sorri para determinado aluno, depois, dá uma carinhosa piscadela, joga o giz na cabeça do aprendiz, uma pedrinha, uma bolinha de gude, um tijolo, uma pedreira inteira, até a adorável criaturinha acordar e, finalmente, aprender. E a dedicação da vida não se limita à pedreira jogada sobre a cabeça (ainda bem que ela, a vida, não sofre da síndrome da Rainha de Copas de Alice), mas também de repetir a lição até confirmar que a garota realmente aprendeu - no caso, em especial, a dizer não, simples assim.
Em outra ocasião virá texto sobre a depressão e tudo o que essa coisa ruim faz com a gente. Quem sabe algo sobre solidão adorável e construtiva. Sobre odisseias internas, tão assustadoras e dolorosas quanto abençoadas e admiráveis. Sobre Cíclopes e Lestrigões apavorantes e imaginários. Sobre vida e entusiasmo. 
No mais, se quiser e puder guarde bem esta imagem: Os 50 são adorável e exclusiva ponte entre os 40 e os 60. É a segunda adolescência desprovida da angústia e dos incômodos da primeira. É a época mais espetacular da nossa vida. Acredite. Por isso, cuide para atravessar essa ponte tão especial com o máximo de leveza que puder, acompanhado pela essencial fluidez. Tudo apenas começa.