domingo, 29 de novembro de 2009

Você para a fim de ver o que te espera, só uma nuvem te separa das estrelas




Uma graça, simpática, com personalidade e voz especial. A afinadíssima Ana Cañas é um show.

Para seduzir, olhar
Para divertir, bobagem
Para o carro, devagar
Mas para enfrentar, coragem
Para acreditar, mentira
Para discutir, opinião
Para levantar, sol
Mas para dormir, colchão
Para entender, conflito
Para se ganhar, amigo
Para deletar, mensagem
Para o verão, viagem
Para fofocar, revista
Para distrair, TV
Para uma dieta, açúcar
E para amar, você
Para encontrar, vontade
Para atravessar, a ponte
Para desejar, sorte
E para ouvir, Marisa
Para Capitu, Machado
Para uma mulher, Clarice
Para Guimarães, Brasil
Na terceira margem do rio
Para o secador, molhado
Para o colar, anel
Para o batom, um beijo
Sempre muito apaixonado
Para se pintar, espelho
Para se perder, aposta
Para dividir, segredo
Para namorar, se gosta
Para um biscoito, avó
Para comprar, essencial
Para todas as coisas, nó
E para terminar, final

Símbolos



Outro dia vi belas imagens de mandalas de areia feitas na Índia, por monges tibetanos, em comemoração ao “dia do agradecimento”. Apreciei as cores, os desenhos no interior do círculo e quis aprender algo sobre esse exercício de paciência e perfeição, tão delicado e belo quanto efêmero. As belas mandalas de areia são transitórias, passageiras, como a própria vida? Como a beleza? Como o êxtase? Associei as mandalas de areia aos enfeites feitos com tanto esmero na rua atrás do clube, próximo ao antigo playground, para o dia de Corpus Christi. Várias pessoas passavam horas ajoelhadas para criar o tapete colorido feito com areia, serragem, farinha, borra de café, flores, folhas e outras coisas, das quais não faço a menor ideia, para a procissão do dia santo. Todo aquele esforço e boniteza durava um dia e acabava no final da procissão. Como foi bom, menina ainda, curtir coloridos tapetes de rua em uma cidade tão movimentada como São Paulo. Seria essa a primeira lição sobre o esforço desprendido, abnegado, pleno de bom sentimento e realizado para ser entregue ao mundo, livre, sem que nada seja retido pelo autor, salvo o prazer da realização, a gratidão pela capacidade de criar? Em outra associação lembrei de algum puzzle imenso, composto por pecinhas minúsculas, verdadeira tortura, que poderia durar um ano ou mais para ser montado para depois, a depender do autor da façanha, virar um quadro meio esquisito. O puzzle montado e emoldurado, eu imagino, seria o exercício de paciência e perseverança congelado na parede, sem nada que aproveitasse ao mundo. Segundo li, para o budismo e o tantrismo, a mandala seria um diagrama linear concêntrico, enfeitado com cores simbólicas (básicas: azul, vermelho, amarelo, verde, em três tonalidades), que reproduziria o universo concebido pela cosmogonia indiana. Acrescente a esse conceito o rito caracterizado pela dedicação, atenção, concentração, meditação e talvez dessa experiência resulte a paz, ou, o inconsciente encontre o  princípio de tudo, consoante os estudos de Carl Jung sobre os arquétipos e os distúrbios emocionais. Outro texto ensinou-me que o preparo de um monge budista para tornar-se apto a criar uma mandala, o processo detalhado de criação e o resultado teriam a mesma importância. As mandalas de areia seriam desfeitas pelo vento ou varridas e a areia, considerada abençoada através do processo de realização, seria jogada sobre a terra e nos rios para proteção dos lugares. Faço outra associação, não pela semelhança, mas pela dedicada forma de meditação e recordo-me dos ícones da igreja católica ordotoxa pintados por monges, em constante oração, segundo regras bem definidas (em outra oportunidade resumirei um livro que tenho sobre a elaboração dos ícones ortodoxos, tão plenos de significados), em monastérios isolados.  

Ao longo do tempo o círculo continua a ser considerado símbolo de proteção e de cura, presente na kabala (nada sei sobre a kabala) e nos vitrais rosáceos das catedrais medievais católicas romanas na Europa. Através de símbolos buscamos o sagrado que, talvez, também esteja em nós.



quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Movimentação


De alguma forma... De alguma forma tênue, talvez lúdica, alguém com a mente aberta, mais do que aberta: alguém com a mente escancarada, possa interpretar ser esse, de fato, um movimento de respeito, digno de ser considerado,  elogiado e enaltecido pela eficácia, pela rapidez, pela coragem, pela maturidade  e, principalmente, pelo resultado alcançado. Um senhor movimento rápido.

Acho que já comentei sobre o bom humor, não?

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A bird doesn't sing because it has an answer, it sings because it has a song


Não é texto de mau agouro, pra baixo, infeliz ou exagerado e não devemos tratá-lo assim. Ainda existem pessoas incapazes de dizer o nome da doença, batem três vezes na madeira, fazem promessa pra santo, imaginam que o câncer é contagioso, têm preconceito e se afastam. Talvez o câncer seja um dos nossos monstros internos e não temos condição alguma para reconhecê-lo, quanto mais para enfrentá-lo.

Para ter câncer basta estar vivo? Não, em absoluto. Mas, cada vez mais, para ter câncer basta envelhecer, além de manter hábitos insalubres como fumar, esturricar-se ao sol, não administrar o stress, descuidar da boa alimentação, não praticar exercícios. Prevenção é a melhor pedida, assim como a detecção precoce: são dois aliados de primeira.

Brasil terá quase meio milhão de novos casos de câncer em 2010

O país terá mais de 489 mil novos casos de câncer em 2010, segundo estimativa divulgada pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca) nesta terça-feira (24), no Rio de Janeiro. Os tipos de câncer mais frequentes na população serão o de pele não melanoma, o de próstata e o de mama feminina.
O levantamento mostra que o câncer será mais prevalente nas mulheres (52%) do que nos homens (48%). Apesar de homens adoecerem e morrerem mais do que as mulheres, a população feminina é mais numerosa, especialmente nas faixas etárias mais avançadas, o que explica o resultado.
O envelhecimento é a principal causa de câncer em todo o mundo. A esperança de vida da população brasileira, que era de 62 anos em 1980, será de 76 anos em 2020. De acordo com o diretor geral do Inca, Luiz Antonio Santini, 43% dos casos ocorrem em pessoas com mais de 65 anos. Segundo ele, a expectativa de aumento do número de novos casos no Brasil nos próximos dez anos é de 34,6%.
O coordenador de Prevenção e Vigilância do Inca, Cláudio Noronha, acrescenta que o número de casos cresce na mesma proporção que o envelhecimento da população.

Câncer mais comum mata pouco

O tipo de câncer mais comum, em ambos os sexos, é o de pele não melanoma, que soma aproximadamente 114 mil casos novos, ou 23% do total de casos estimados para 2010. Esse levantamento é separado dos outros, na estimativa, por se tratar de uma doença com bom prognóstico e que implica baixíssimo risco de morte. Segundo Cláudio Noronha, 10% destes casos poderiam ser evitados com o controle da exposição ao sol.
Sem considerar o câncer de pele não melanoma, o número total estimado de novos casos é de 375.420, o que significa dois casos a cada mil brasileiros por ano ou 200 para cada 100 mil pessoas.

Estimativa de casos de câncer para 2010 (mulheres):
Total de casos 253.030


Estimativa de casos de câncer para 2010 (homens)
Total de casos 236.240

Estimativa do número de casos novos de câncer (exceto pele não melanoma) para o ano de 2010:
Total de casos novos 375.420 (51% mulheres e 48% homens)
(INCA - Instituto Nacional do Câncer e Ministério da Saúde)

O tipo mais comum de tumor nos homens é o de próstata, seguido de pulmão, cólon e reto, estômago, oral, esôfago, leucemias e pele melanoma. Entre as mulheres, os cânceres mais frequentes são os de mama, colo de útero, cólon e reto, pulmão, estômago, leucemias, oral, pele melanoma e esôfago.
Os dados utilizados para o cálculo têm como base o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, e os Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP). O Inca esclarece que a estimativa atual não pode ser comparada com as anteriores, porque reflete um contexto que se modifica ao longo do tempo.

Prevenção

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a tendência de mortalidade é menor em países desenvolvidos, onde a população tem mais acesso aos serviços de saúde. “Em média 40% das mortes por câncer poderiam ser evitadas”, afirma Luiz Antonio Santini.
Além do envelhecimento e da exposição ao sol sem proteção, são fatores de risco o tabagismo, o consumo de álcool, o sedentarismo, a ingestão de comidas gordurosas.
Estima-se que 30% dos novos casos de câncer previstos para 2010 (exceto os de pele não melanoma) poderiam ser evitados com o combate ao tabagismo. E uma alimentação rica em frutas, verduras e fibras, além de pobre em gorduras, poderia prevenir 35% deles.

Diferenças entre regiões

Exceto no caso do câncer de próstata, que é o mais comum em homens em todas as regiões do país, cada região possui perfil diferente em relação à prevalência de câncer masculino. Nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste, o tumor mais comum é o de pulmão. Já no Norte e no Nordeste, é o de estômago.
Em relação às mulheres, o câncer de mama só não é o mais comum no Norte, região em que o tumor de colo de útero é o mais prevalente. No Sul e no Sudeste, o câncer de cólon e reto é o segundo mais frequente. No Centro-Oeste e no Nordeste, o segundo câncer mais comum é o de colo de útero.
O câncer de pulmão será mais frequente nas mulheres do Rio Grande do Sul (21 para cada 100 mil mulheres). É lá, também, que estará o maior número de casos de câncer de próstata (80 para cada 100 mil homens) e de pulmão (48 para cada 100 mil). Já o câncer de estômago será mais incidente entre os homens e mulheres do Ceará (17 para cada 100 mil homens e 10 para cada 100 mil mulheres, respectivamente).

Detecção precoce

Em relação aos cânceres mais incidentes entre as mulheres – mama e colo de útero – alguns hábitos estão associados à prevenção. A amamentação, a prática de atividade física e alimentação saudável, além da manutenção do peso corporal estão associadas a um menor risco de desenvolver câncer de mama. A primeira gravidez após os 30 anos, o uso de anticoncepcionais orais, menopausa tardia e reposição hormonal são fatores de risco associados ao câncer de mama.
O Inca recomenda exame clínico das mamas anualmente a partir dos 40 anos e mamografia bienal dos 50 aos 69 anos. A partir dos 40 anos, caso o exame clínico esteja alterado, é preciso realizar mamografia.
A incidência do câncer do colo de útero é cerca de duas vezes maior em países em desenvolvimento do que em países desenvolvidos. Este é um tumor passível de ser evitado, prevenido e detectado precocemente por meio do exame de Papanicolaou, conhecido como "preventivo".
Mulheres de 25 a 59 anos devem fazer o exame Papanicolaou periodicamente. Se o resultado for normal em dois exames anuais seguidos, o preventivo deve ser repetido a cada três anos. As mulheres da região norte, onde a incidência da doença é maior, têm menos acesso aos serviços médicos do que as das outras regiões.
Já os homens a partir dos 50 anos devem procurar um posto de saúde ou um médico para realizar exames de rotina. Se, apesar de não ter sintoma de tumor na próstata (dificuldade de urinar, frequência urinária alterada ou diminuição da força do jato da urina, entre outros), o homem tiver histórico familiar da doença, precisa relatar isso ao médico para fazer os exames necessários.

Investimentos

O gasto mundial com câncer é de cerca de US$ 286 bilhões, sendo que US$ 219 bilhões são investidos nos Estados Unidos. Apenas 5% do total é investido em outros países. No Brasil, segundo Santini, foram gastos, pelo SUS, em 2007, R$ 1.800.000. “A previsão é que os investimentos sejam duplicados em cinco anos, com um aumento de 20% ao ano”, informou. De acordo com ele, a partir do ano 2000 houve um aumento do número de sessões de radioterapia, quimioterapia e internações. “O aumento do número de casos vem sendo acompanhado pelo aumento das políticas públicas de saúde”, garantiu.

http://noticias.uol.com.br/ultnot/cienciaesaude/ultnot/2009/11/24/brasil-tera-quase-meio-milhao-de-novos-casos-de-cancer-em-2010.jhtm

domingo, 22 de novembro de 2009

We know earth is woman, the sky primal man


Por ser crente e descrente, matricial e fiel, ferozmente a si próprio


Sobrenomes terminados em akis, aki, são originários da ilha de Creta, e foi esse texto sobre os sobrenomes gregos que recebeu o comentário da grega - para os gregos todos os filhos, netos, bisnetos, tataranetos até a vigésima sétima geração de gregos são gregos - que impressiona pelas excelentes qualificações de seu perfil e, mais ainda, pelo seu vasto conhecimento da boa literatura. Para você, leitora crítica e generosa, poesias portuguesas e a imagem típica grega da entrada de um kafenion, onde costumam tomar café não coado, jogar gamão, brincar com o kombolói entre os dedos da mão e trocar a sabedoria milenar, para agradecer sua presença sempre bem vinda e suas palavras da hora certa, do momento exato. Saúde e paz.

Esses estranhos que nós amamos
e nos amam
olhamos para eles e são sempre
adolescentes, assustados e sós
sem nenhum sentido prático
sem grande noção da ameaça ou da renúncia
que sobre a luz incide
descuidados e intensos no seu exagero
de temporalidade pura

Um dia acordamos tristes da sua tristeza
pois o fortuito significado dos campos
explica por outras palavras
aquilo que tornava os olhos incomparáveis

Mas a impressão maior é a da alegria
de uma maneira que nem se consegue
e por isso ténue, misteriosa:
talvez seja assim todo o amor

José Tolentino de Mendonça

*        *        *

aprende a falar – diz
a rosa: escreve de noite
e que o meu múltiplo sol
te guie inúmeros
os caminhos. põe-te numa sala
com a luz apagada
onde chegue acesa
a de uma outra, e
frágil,
ao papel que para ela
voltas. Então falas
das paixões, da pétala
que cai no interior
do coração
e navega na sombra do
sangue, de assombro em
assombro.

Manuel Gusmão

*        *        *
Os milagres acontecem
a horas incertas
e nunca estou em casa
quando o carteiro passa.

Hoje, abriu a primeira flor
e eu disse é um sinal.
Olho em volta: estou só
trago esta sombra comigo.

Ana Paula Inácio


*        *        *
Só a rajada de vento
dá o som lírico
às pás do moinho.

Somente as coisas tocadas
pelo amor das outras
têm voz.

Fiama Hasse Pais Brandão

*        *        *
A minha juventude passou e eu não estava lá.
Pensava em outra coisa, olhava noutra direção.
Os melhores anos da minha vida perdidos por distração!
Rosalinda, a das róseas coxas, onde está?
Belinda, Brunilda, Cremilda, quem serão?

Provavelmente professoras de Alemão
em colégios fora do tempo e do espa-
ço! Hoje, antigamente, ele tê-las-ia
amado de um amor imprudente e impudente,
como num sujo sonho adolescente
de que alguém, no outro dia, acordaria.

Pois tudo era memória, acontecia
há muitos anos, e quem se lembrava
era também memória que passava,
um rosto que entre outros rostos se perdia.

Agora, vista daqui, da recordação,
a minha vida é uma multidão
onde, não sei quem, em vão procuro
o meu rosto, pétala dum ramo úmido, escuro.

Manuel António Pina

É a sensação exclusiva do organismo acalmar-se por momentos


O cansaço em demasia chega a ser engraçado pelo efeito contrário provocado. Por estar muito cansada não consegui dormir direito, não me alimentei como deveria, sequer relaxei. As horas que seguem ao cansaço demasiado não podem ser acompanhadas por qualquer expectativa, salvo a ocupação da mente com coisa leve, boa música, algum filme interessante capaz de prender a atenção. Aos poucos soltar-se em silêncio e calma para não desperdiçar energia, não cobrar-se, tampouco permitir cobranças. O cansaço demasiado requer solidão e paz. No segundo dia, cumprida a quietude, é natural o regresso da força e do ânimo para retomar a vida: Marcar hora para o banho do cão, para cortar os cabelos, preparar almoço gostoso e aproveitar o sábado para colocar a leitura em dia, retirar as folhas secas dos vasos e dormir. Dormir à tarde, dormir à noite,  
finalmente, o tempo do corpo não resistente ao sono. Dormir.

A cabeleireira, dona da Akita branca chamada Princesa, segurava-se para não entregar os pontos, para secar por dentro as lágrimas por conta da perda da companheira. Não há dúvida que cachorro vira companheiro, amigo, ocupa lugar da prole, do namorado, preenche o vazio e permite mais qualidade para a tão apreciada solidão. Cachorro é terapia. Querida, sei que para você é importante continuar firme e forte como se nada tivesse acontecido, por mais que tenha acontecido. O abraço por você dado em homenagem ao próximo sábado, foi por mim transformado em abraço de força. Que este domingo, presumo o dia da semana do seu passeio mais longo com a Princesa, lhe seja leve, você encontre paz e passe da falta para a saudade com rapidez. Sem dor, sem sofrer.

Cabelo curtinho, curtinho, mais curtinho ainda. O cabelo curtinho que há anos deixei de ter. A nuca desnudada como gosto, as mechas despenteadas como quero, a cabeça de menina-mulher que nunca deixarei de ser. Cortar curtinho os cabelos tem gosto de liberdade, de querer-se bem.

Época de plena saturação da total falta de respeito, honestidade e educação. Ando com vontade de chamar algumas mães de lado e puxar suas orelhas pelas porcarias de filhos tão malcriados que tiveram. Mulheres, seus filhos parcos educados por vocês, são os maridos, pais, colegas, amigos, companheiros, vizinhos de outras mulheres. Mulheres, não permitam mais que suas crias, tão estragadas e complexadas, existam somente para infernizar aos demais. Como vocês puderam criar homens tão fracos, carentes e crentes que o grito resolve qualquer parada? Será que vocês, mulheres, também foram assim criadas? Mulheres, que droga de filhos algumas de vocês fizeram.

Vejo novas cores em lugares antigos, sinto novo carinho. A vida é presente divino.

As pessoas mais lindas são as que sabem rir e riem do humor feito com inteligência.

When all is said and done



Here's to us one more toast and then we'll pay the bill
Deep inside both of us can feel the autumn chill
Birds of passage, you and me, we fly instinctively
When the summer's over and the dark clouds hide the sun
Neither you nor I'm to blame when all is said and done

It's been there in my dreams the scene I see unfold
Who at last flesh and blood to cherish and to hold
Jealous fools will suffer yes I know and I confess
Once I lost my way when something good had just began
Lesson learned its history all is said and done

In our lives we have walked some strange and lonely treks
Slightly worn but dignified and not too old for sex
We’re still striving for the sky no taste for humble pie
Thanks for all your generous love and thanks for all the fun
Neither you nor I’m to blame when all is said and done

It’s so strange when you’re down and lying on the floor
how you rise shake your head get up and ask for more
Clear-headed and open-eyed with nothing left to try
Standing calmly at the crossroads,no desire to run
There's no hurry any more when all is said and done
Standing calmly at the crossroads,no desire to run
There's no hurry any more when all is said and done

I do, I do, I do, I do





Don't go wasting your emotion, lay all your love on me. Don't go sharing your devotion, lay all your love on me. I was cheated by you and I think you know when, so I made up my mind, it must come to an end. Look at me now, will I ever learn, I don’t know how but I suddenly lose control. There’s a fire within my soul, just one look and I can hear a bell ring, one more look and I forget everything, mamma mia, here I go again.

Como pude deixar em segundo plano a admiração que tenho por Meyl Streep e, por um tempo, acompanhar crítica incorreta e maldosa feita sobre o filme Mamma Mia - "os pulinhos de uma gordota sexagenária"? Jamais! Desconsiderei a perfeição com a qual Streep sempre desenvolve suas personagens e também me apoiei em entrevista do incrédulo filho mais velho de Pierce Brosnan, sobre a incapacidade de cantar do ator. Sim, confesso, que achei meio ridículo assistir a musical com a trilha sonora do Abba, realizado com excelentes e experientes atores, mas distantes desse gênero de entretenimento e nem o paradisíaco cenário das ilhas gregas me atraiu. Genuíno preconceito. Quanto ao quarteto sueco ABBA curti algumas músicas, poucas e sem entusiasmo, porque nas décadas de setenta e oitenta eram outros os meus ídolos musicais. Assim, levei um ano para assistir Mamma Mia e o fiz somente por ter passado na TV, numa noite de sábado perfeita para relaxar em casa. Lógico que mudei de idéia, gostei muito do filme curti a diversão dos próprios atores - há cenas nas quais Collin Firth e Stellan Skarsgard seguram o riso, assisti pela segunda vez e ouço o CD da trilha sonora, não a original cantada pelo afinado ABBA, mas pelos próprios atores. Palmatória, eis minha preconceituosa mãozinha. O enredo todo mundo conhece e não há dúvida que é uma delícia assistir aos cinquentões Brosnan, Skarsgard e Firth, os três personagens muito bem sucedidos, a recordarem a juventude hippie e a encontrarem a verdadeira felicidade em Kalokeri (verão em grego), afinal, lá está a fonte de Afrodite, a deusa do amor. Assim, um reencontra e assume o amor de sua vida, o lobo solitário encontra sua loba metade e o terceiro assume sua sexualidade de forma bem britânica. Quanto às meninas cinquentenárias não poderia ser outra, além de Christine Baranski, com seu jeito sofisticado-afetado e super bem humorado, a procura do quarto marido e a encantar os garotos da ilha You're so hot teasing me, so you're blue but I can't take a chance on a chick like you, that's something I couldn't do. There's that look in your eyes I can read in your face that your feelings are driving you wild. Ah, but you're only a child. Well I can dance with you honey, if you think it's funny. Does your mother know that you're out? And I can chat with you baby, flirt a little maybe. Does your mother know that you're out? Julie Walters (a professora de dança de Billy Eliot, 2000, a divertida Gwen Traherne de Wah-wah, 2005, a excelente Evie Walton em Driving lessons, 2006 e de tantos outros filmes, sem mencionar a saga Potter) a conquistar o mais arredio dos garotos cinquentinhas If you change your mind, I'm the first in line. Honey, I'm still free, take a chance on me. If you need me, let me know, gonna be around. If you got no place to go when you're feeling down. Let me tell you now my love is strong enough to last when things are rough, it's magic. You say that I waste my time, but I can't get you off my mind, no I can't let go 'Cause I love you so. Colin Firth com boa voz a tocar o violão e relembrar o último verão I can still recall our last Summer, I still see it all our last Summer, memories that remain, we were living for the day, worries far away, a folia de todos na véspera do casamento Gimme me a man after midnight, won't somebody help me chase the shadows away. Take me through the darkness to the break of the day. Take it now or leave it, now is all we get, nothing promised, no regrets Voulez-vous, ain't no big decision, you know what to do. La question c'est voulez-vous. What's the name of the game. Does it mean anything to you. Got a feeling you give me no choice, but it means a lot, what's the name of the game. Your smile and the sound of your voice. Can you feel it the way I do. Tell me please, 'cause I have to know. I'm a bashful child, beginning to grow. And you make me talk, make me feel, make me show. What I'm trying to conceal. If I trust in you, would you let me down. Could you feel the same way too. No final, a encantadora I have a dream com a melodia enriquecida pelos instrumentos típicos
das ilhas gregas I have a dream a song to sing to help me cope with anything if you see the Wander of a fairy tale you can take the future even if you fail I believe in angels something good in everything I see. I believe in angels when I know the time is right for me I'll cross the street I have a dream


A minha cena para o ano de 2009, especialmente escolhida neste mês de novembro, sem dúvida é a do trajeto do hotel de Donna ao porto da ilha imaginária de Kalokeri (o filme foi rodado nas ilhas gregas de Skiathos e Skopelos ), ao som de Dancing Queen, na qual todas as mulheres ao longo do caminho largam seus afazeres e ingressam na fila puxada por Meryl Streep, Julie Walters e Christine Baranski. Se lá eu estivesse largaria tudo para cantar, dançar, rir e me jogar no mar having the time of my life. You can dance, you can jive, having the time of your life. See that girl, watch that scene, digging the dancing queen, getting in the swing. You are the dancing queen, young and sweet only seventeen. Dancing queen feel the beat from the tambourine. You can dance, you can jive having the time of your life. See that girl, watch that scene digging the dancing queen


Mamma mia, 2008, de Phyllida Lloyd, com Meryl Streep, Amanda Seyfried, Stellan Skarsgard, Collin Firth, Christine Baranski, Julie Walters, Pierce Brosnan.

Cinquentinhas


sábado, 21 de novembro de 2009

A fresca fruta vence o sol rasante


Dizia
que viajar é poder partir-se para o lugar
em frente,
que cada lugar só impressiona porque sugere
a visibilidade do próximo.
E que no fim, quando abandonamos tudo
e já não ouvimos senão o repique dos sinos,
as paisagens deixam de existir para não
passar do que a respiração liberta.
“O que nos conduz é podermos sepultar o
corpo noutro lugar;
porque em todos os sítios passados deixámos o corpo
à vista do lugar mais próximo.”
Percebi, sem que mostrasse algum temor,
que havia descoberto a transparência do mundo,

que fora auxiliado pela face
suspensa dos viajantes.
E lembrei-me como o tempo havia de ensinar,
desde a juventude à velhice,
que onde a beleza assola habituamo-nos a uma pausa nos
olhos, nas mãos e nos olhos que são o que nos diz do
pouco do que nos fica sempre.

*        *        *

Não é difícil um homem apaixonar-se.
Ferir a sua paisagem,
cinzas de um passado caído, fluente.
Ao fim de vidas partilhadas pode ser que
diga “estremeci
durante anos sem te abraçar.” Agora é tarde.
Agora é tarde sobre a terra cercada.
Por planícies ficou o desespero,
a dor lilás dos homens soçobrados
na paciência noturna.
Só depois do terror os cães ladram fielmente
aos portais da manhã, só
após o gume das vidas partilhadas.
“Passei a vida a fugir para a tua boca,” e
confundo já o teu rosto
com um qualquer.


*        *        *

Nem a demanda conseguirás
que se acabe – mesmo que a ti a fortuna se confie,
nem o estudo será para teu gáudio – ainda que dos sábios inspirado,
nem te assistirá o talento e o consolo abrandará o teu anseio,
nem que fosse o amor podias viver livremente.
E nem mesmo o profeta ditando versos terá discípulos
se jamais concilia os escrivães com a sua mágoa,
nem o jovem será de graça favorecido – pois ela o trairá,
nem o rio que outrora batizaste lembrarás
se sob a névoa o não vires primeiro.
Donde ides então para que vos siga piamente
– acaso atalharemos o país de cerradas dunas como campas,
quando na distância os dois brilharmos – os
dois entre solenes risos de guardar silêncio?
Longe do que pensaríamos algum dia consentido,

longe de nos julgarmos sob funesta sina,
do que irá passar-se brevemente o saberemos:
– muitas vezes soubemos quanto a beleza tarda,
mas só ela tolera dispormos do mundo fugazmente
e com essa cega mágoa ir mais além.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Just oppening my eyes to see my point of view


Ajustar o dial

Às vezes o dia assume contornos próprios e os acontecimentos se encaixam com perfeição impressionante. O mais interessante, além dos fatos encadeados, fluidos e caracterizados por cadência que foge ao nosso controle, como se tivessem vida própria, é o reconhecimento do tempo certo, do momento exato, nem antes, tampouco depois para importantes revelações. Aprendo a considerar esses dias como presentes capazes de ampliar nossa acuidade, percepção e, principalmente, nossa intuição.
Pensei em algo que caracterizasse o melhor comportamento para esses momentos e imaginei o dial de rádios antigos.
Às vezes, é necessário ajustarmos o dial de nossa vida, o campo de vibração de nossa energia, mudarmos de nível e  de estação, para não nos aproximarmos de energia ruim externa. Ajustar nosso dial é procedimento fundamental.

Rapidela

Livros para ter na bolsa, ao lado, esquecer da vida, ou, relembrar o que merece ser relembrado? Livros deliciosos de ler? A volta ao dia em 80 minutos, de Julio Cortázar, tomos I e II, da editora Civilização Brasileira. Irreverentes, ternos e provocativos, segundo a crítica. Imperdíveis. Louis, enormíssimo cronópio... Parece que o passarinho mandão mais conhecido como Deus soprou no flanco do primeiro homem para animá-lo e lhe dar espírito. Se em vez do passarinho fosse Louis quem estivesse ali para soprar, o homem teria saído muito melhor, sobre o concerto de Louis Armstrong no dia nove de novembro de 1952, em Paris.


Que tal conhecer um pouco mais Tomas Eloy Martinez através de seu livro O vôo da rainha - Soberba, da série plenos pecados da editora Objetiva?  Será que foi à toa que o texto sobre o mais grave pecado capital, consoante a doutrina religiosa vigente, tenha sido encomendado ao talentoso Martinez? Para quem divertiu-se com o hilário A casa dos Budas ditosos, de João Ubaldo Ribeiro (sobre o pecado da luxúria), apreciou o Clube dos anjos, de Luis Fernando Veríssimo (sobre o pecado da gula), além do Mal secreto, de Zuenir Ventura (inveja), Xadrez, truco e outras guerras, de José Roberto Torero (ira), Canoas e marolas, de João Gilberto Noll (preguiça) e Terapia, de Ariel Durmam (avareza), a história sobre o jornalista fisgado pela soberba, em hipótese alguma, pode ser deixada de lado.



Sim, sim Marlon Brando está excelente em O poderoso chefão (The godfather), 1972, de Coppola, filme que o deixou tão encantado, meu filho, a ponto de você colocar parte da trilha sonora como toque das ligações recebidas de seu progenitor - você e seu senso de humor irreverente - mas, Brando não é só este e outro filme do mesmo diretor, o genial Apocalypse Now, 1979, muito menos seu caricato personagem em a  Ilha do Dr. Moreau (The island of. Dr. Moreau), 1996, de John Frankenheimer e está bem longe do Don Juan de Marco, 1995, de Jeremy Leven. A exemplo dos filmes iranianos, sudaneses, tailandeses e chineses que você assistiu ao meu lado, em época que ninguém falava ou conhecia sobre filmes iranianos, providenciei dois mimos, querido, para você conhecer um pouco mais sobre Brando sem seus quilinhos a mais: Uma rua chamada pecado (A streetcar named desire *), 1951 e Sindicato de ladrões (On the waterfront), 1954, os dois de Elia Kazan (marque bem esse nome, filhão, porque qualquer filme de Elia Kazan vale a pena ser assistido). E se você se comportar direito, quem sabe, ganhará de presente O último tango em Paris (Last tango in Paris) 1972, mais um Coppola! e Duelo de Gigantes (Missouri Breaks), 1976, de Arthur Penn.
Você entende o quanto Brando era genial, meu filho, a ponto de em seu segundo filme (*) ter sido indicado ao Oscar?
Penso melhor e antes dos dois filmes complementares de Brando, providenciarei um pouco de Peter Sellers em Dr. Strangelove or: How I learned to stop worrying and love the bomb, 1964, de Stanley Kubrick, Patton, 1970, de Franklin J. Schaffner e O encouraçado Potemkin, 1925, de Serguei Eisenstein. Apocalypse Now, Patton e O encouraçado Potemkin eu assisti com seu avô.

Elástica

Nove horas seguidas no hospital do câncer entre consultas, exames e esperas -  segundo uma das médicas, no dia habitualmente mais movimentado da semana - é demais para qualquer um. É testar a resistência física, a mental, a paciência, os vários limites do cansaço, diminuir a resistência do sistema imunológico, sentir dor na garganta e no corpo, ficar com vontade de chorar, de entrar com roupa na máquina de lavar, dormir, dormir e dormir um pouco mais. É meio eficaz de mostrar-nos o quanto é pequeno o nosso ínfimo comparado ao pequeno ínfimo do outro, do outro e do outro, em ilimitado, abençoado e amoroso ordenamento sequencial a poupar todos, sem exceção, pois não há o pior, nunca há. É comover-se com crianças, idosos, mulheres e homens sozinhos a manter a dignidade de alguma forma, da mais valente forma, a desafiar enfermidade tão cruel e devastadora. É ver a impaciência de mães jovens e despreparadas, com outros anseios e interesses, claramente infelizes com a dura realidade por elas indesejada, a esperar pelo tratamento de seus filhos pequenos. É ver o garotinho cego a falar sozinho, a cantar sozinho - entre os puxões agressivos de sua mãe, ansiosa  por viver em outra esfera, em outro mundo, acompanhada pelos fones em seus ouvidos - ter seu choro tão condoído consolado por uma professora aposentada, que dele se aproximou com o jargão do palhaço Arrelia: como vai? Como vai? Como cai? Tudo bem? Tudo bem, bem, bem?, a quem ele pediu faça carinho em meu ombro, tia. Nove minutos naquela realidade proporcionam lição fundamental para o resto da vida. Nove horas seguidas foi o meu mais novo limite. Limite. Ao sair de lá (a parte da corda mais retesada, do elástico cada vez mais puxado, o procedimento por mim inventado para, de algum jeito, me convencer que posso mais, que aquele não é o máximo, nunca é) e ver o fim de tarde desta cidade, o calor, o abafado, de propósito não pegar o táxi disponível e caminhar até o metrô, seguir pelo subterrâneo da mais paulistana das avenidas e de seu final seguir a pé rota definida, ir ao supermercado para o pernil de cordeiro do almoço de sábado, o salmão do almoço de amanhã e ainda perder uma hora, a mais cansativa de todas, na farmácia por conta do programa criado para facilitar a vida dos pacientes que, por enquanto, dependem daquela droga de medicamento. É reconhecer o cansaço e não ter o ânimo de sempre para corresponder à alegria do cão, mas, boa aluna, estudar as lições de alguma forma aprendidas hoje.

Meu filho, jogue fora de vez essa porcaria de cigarro, causa certa de câncer, e saiba, meu filho, tenha sempre em mente que ter filhos, quando os seus vierem, seus filhos deverão receber o seu amor ilimitado, mais dedicado e incondicional.

Mais frutas vermelhas e suco de cranberry. 

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Callas


Para entender toda essa história, talvez tenha que ser grego. Ou não. Ouvir Maria Callas emociona e nos proporciona prazer inigualável. Insubstituível Callas. Profissional de primeira linha, dedicava-se com afinco para conquistar a perfeição musical. Sou sua fã e toda vez que a ouço descubro uma parte nova de sua incrível magia.

A foto ao lado, com Marilyn Monroe, chamou minha atenção pelo inédito: Desconheço outra foto na qual Monroe apareça ao lado de alguma mulher e não a deixe totalmente ofuscada com sua exuberância e sex appeal. Esta é a única foto que Marilyn parece meio apagada, um tanto embasbaca, não por outra sexy bomb blonde, mas por uma castanha com traços exóticos, mulher clássica, helênica. Uma verdadeira diva.


Deixaste toda a esperança vós que desapareceste da memória


Ser ao mesmo tempo algoz e vítima ensina a ter o braço mais suave, a mente mais aberta e o coração bem mais leve. Você pode falar? Não, não posso.  Ao invés da infinita condescendência, a exata medida do pesado nada recebido. Ao mudo, a mudez. O tempo, medida tão preciosa, insubstituível e em hipótese alguma desperdiçável, trouxe a metamorfose da tolerância e expandiu suas asas para reconhecer o mundo. Você pode falar? Não, não posso. Eis o espelho mágico que devolve a imagem refletida e, paradoxo da física, ao mesmo tempo é refratário. Ao isolamento e ao silêncio seletivo, sempre tão insuportáveis,  ao nada da dura incomunicabilidade  diluída pelo caminho. Como é bom desconhecer incoerente fila, sair da linha, ganhar espaço.

Clarice Lispector, o sol escuro do Brasil


Há pouco mais de meio século, a força de transformação da literatura da América Latina assombrava os países centrais, que haviam alcançado a modernidade graças ao desenvolvimento de suas indústrias, suas descobertas tecnológicas, suas redes de comunicação, seus trens e aviões. Mas sua linguagem e sua capacidade de narrar a sociedade estavam apergaminhadas, cansadas, e supriam a falta de ideias e sangue novos com jogos teóricos que não levavam a lugar nenhum. Na América Latina, o afã de criar esse mundo novo expresso pela revolução cubana parece ter se concentrado na literatura.
Enquanto os países do Rio da Prata, México e Colômbia respiravam a plenos pulmões os novos ares, o gigante Brasil mantinha-se impermeável a tudo o que não vinha de si mesmo. O Brasil mudava de pele, mas se alimentava de sua própria música e de sua própria herança literária. Certa vez perguntaram a João Gilberto por que ele fazia tão poucos shows no estrangeiro, onde sua música tinha um sucesso clamoroso.
"Para quê?", respondeu. "No Brasil meu público é tão numeroso como no resto do mundo e, além disso, ele me escuta com mais felicidade".

Em meados do século 20, o grande nome da literatura brasileira continuava sendo o de Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908), que escreveu uma sucessão de obras mestras mediante o simples recurso de observar atentamente a paisagem interior dos pensamentos e dos sentimentos para contá-los de uma maneira incomum, inesperada. Um de seus maiores herdeiros é João Guimarães Rosa, que impressiona mais do que tudo por seu virtuosismo verbal e pelo ouvido finíssimo com que capta a música das vozes do sertão, no nordeste profundo de seu gigantesco país.
Entretanto, a única filha direta e legítima de Machado de Assis é Clarice Lispector, cuja obra misteriosa começa a difundir-se nos Estados Unidos com tanto ímpeto quanto a de Roberto Bolaño. O chileno foi consagrado pela revista The New Yorker, e o influente The New York Review of Books rendeu tributo a Lispector com um ensaio extenso de Lorrie Moore, a jovem deusa do minimalismo.
Moore adverte que a fama magnética de Lispector se deve em parte aos estudos sobre sua obra reunidos por Hélène Cixous, a quem as universidades francesas devem o apogeu dos estudos sobre a mulher. Na França, recorda Cixous, a extraordinária abstração da prosa de Lispector fez com que a vissem como uma filósofa. Quando ela assistiu a um encontro de teóricos sobre sua obra, abandonou a sala na metade da homenagem, dizendo que não entendia uma só palavra do jargão.
Uma das primeiras vezes que se ouviu falar de Lispector em Buenos Aires foi no final dos anos 70, quando circulou a lenda de que ela havia se queimado viva em sua casa no Rio de Janeiro.
Em 1969 o mítico editor argentino Paco Porrúa havia publicado na editora Sudamericana alguns de seus livros: os romances "A Maçã no Escuro", "A Paixão Segundo G.H." e "Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres", assim como os admiráveis contos de "Laços de Família". Lispector rompia com todas as convenções da arte de narrar e arrancava de cada palavra um tremor secreto, enigmático. Suas revelações eram como as de um teólogo oriental participando de uma dança ritual africana.
Quando a lemos, deslumbrados, na revista "Primera Plana", pensamos que era imperativo viajar para o Rio de Janeiro para decifrar seus segredos. Sara Porrúa, que na época era mulher de Paco, quis ser a primeira nessa busca.
As primeiras notícias que enviou dissipavam a fábula de que Lispector fora queimada viva. Sua cama havia se incendiado acidentalmente quando dormiu com um cigarro aceso. Mas a haviam resgatado a tempo. Sua estranha beleza tártara (os olhos amendoados e rasgados, as maçãs do rosto salientes, a constante expressão de angústia de seu rosto) havia desaparecido quando queimou o lado direito do corpo, imobilizando-lhe o braço. Nada, entretanto, apagava sua paixão por narrar o mundo.
Sara a encontrou mais algumas vezes e, com sua imagem intensa, inesquecível, perdeu-se nas selvas da Guatemala e transformou-se em personagem de Cortázar.
Dar uma ideia de sua imaginação só é possível através de algumas citações. O começo do romance "Uma Aprendizagem..." (1969) é uma frase que vem do nada. A porta de entrada desse livro é uma vírgula: ", estando tão ocupada, viera das compras de casa que a empregada fizera às pressas porque cada vez mais matava o serviço, embora só viesse para deixar almoço e jantar prontos...".
Antes desse comentário doméstico e trivial, Lispector surpreendeu o leitor com uma advertência que é também uma afirmação de seu ser:
"Este livro se pediu uma liberdade maior que tive medo de dar. Ele está muito acima de mim. Humildemente tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte que eu. C.L."
E no final de "Água Viva", ergue a voz: "Não vou morrer, ouviu, Deus? Não tenho coragem, ouviu? Não me mate, ouviu? Porque é uma infâmia nascer para morrer não se sabe quando nem onde. Vou ficar muito alegre, ouviu? Como resposta, como insulto".
Seu desmedido desafio à morte impregna muitas das crônicas reunidas em "Revelación del Mundo", que incluem todas as que escreveu para o Jornal do Brasil entre 1967 e 1973. Outras, inéditas, serão publicadas no ano que vem em espanhol sob o título de "Descubrimientos".
Lispector continua sendo um enigma velado que assombra em cada frase, em cada desvio da vida. Morreu aos 57 anos de um câncer nos ovários, depois de ter passado os últimos anos fechada na solidão de sua casa do Leme, perto das areias de Copacabana.
Seu autorretrato cabe em uma frase: "Olhar-se ao espelho e dizer-se deslumbrada: Como sou misteriosa".
Texto escrito por Tomás Eloy Martinez, escritor e analista político, publicação The New York Times, tradução Eloise De Vylder.


Sobre Tomás Eloy Martinez: Escritor e jornalista argentino, nascido em Tucumán, é autor de  A mão do amo, Purgatório, O cantor de tango, O voo da rainha, O romance de Perón, Las vidas del General, Pásion según Trelew e Santa Evita. Martinez desenvolveu narrativa que permeia realidade e ficção, através de dados históricos (em todos os seus livros há pesquisa minuciosa) e de sua imaginação, para criar uma realidade inesperada e nova, que permite ao escritor ser outra pessoa, ou muitas outras: "Escrever romances é explorar caminhos desconhecidos." Sua obra mais recente, O purgatório, teve seu enredo inspirado em um sonho: "Uma noite, quando estava escrevendo O cantor de tango, sonhei com uma mulher que havia perdido seu marido e que, anos depois, o reencontrou exatamente como ele era quando havia sumido. Anotei o sonho, como sempre faço" , assim nasceu a personagem Emília Dupuy e o enredo sobre os desaparecidos políticos da última ditadura militar argentina. Em 1975, perseguido em seu país, Martinez seguiu para Caracas através da embaixada mexicana, onde viveu e trabalhou até 1983. "O exílio é um corte repentino e forçado na história pessoal de cada um, é como se um raio ou uma doença caísse em cima de você, assim, de repente. A única coisa que ganhei com o exílio foi não ter medo do mundo, aprender a confiar em minhas próprias fraquezas e a sentir que as minhas fraquezas também poder ser fortalezas." 
Martinez também desenvolveu carreira acadêmica, entre 1984 e 1987, foi professor da Universidade de Maryland e desde 1985, leciona na Rutgers University, em Nova Jersey, além de dirigir o Programa de Estudos Latino-Americanos. É colunista do La Nación e do The New York Times Syndicate, que publica seus artigos em 200 jornais das Américas e da Europa.