sexta-feira, 20 de março de 2009

Here comes the Super Sparkling Girl

O principal material empregado em medicina nuclear é o tecnécio-99m, emissor gama com energia aproximada de 140 KeV, que pode ser detectado com um contador de cintilância. A cada seis horas a radiação emitida pelo tecnécio cai pela metade. Sua eliminação ocorre pelos rins.

Ora direis contar estrelas, acompanhada pela aparente banalidade na execução de exames realizados nas catacumbas hospitalares, normalmente no antepenúltimo subsolo, onde estão instaladas as unidades de medicina nuclear.
A começar pelo preparo: Pode tudo, menos utilizar roupa com qualquer metal e uma única condição proibitiva: a gravidez. Quando a enfermeira quis minha confirmação de que não havia qualquer possibilidade de eu estar grávida, não pude evitar o meu melhor rostinho de terna desprotegida e meiga dúvida. O bom humor faz toda a diferença.
Quero saber mais sobre o fármaco (sim, utilizam a palavra fármaco e acho que é para inibir mais ainda o paciente) que será aplicado por essa agulha diretamente espetada na veia da minha mão: O que é, quais são os efeitos, as contra-indicações, quanto tempo ficará no meu organismo e o que devo fazer para não prejudicar outras pessoas, afinal, por um período serei a Super Sparkling Girl com poderes sensacionais.
E quem diria que fármaco e tecnécio seriam palavras latinas? sânscritas? gregas, portanto, incompreendidas pelas maioria dos mortais.
A enfermeira trabalha no mesmo lugar há quinze anos e não vê a hora de mudar-se ‘para o interior’ (não importa qual interior) para dedicar-se ‘ao social’. Durante a série de perguntas de praxe começou a olhar-me com ar de comiseração e foi saber do biomédico se o tal do fármaco deveria ser aplicado na sala de espera ou ‘diretamente no aparelho’. Como, não entendi? Esse tecnécio é meu! Pois, lá fui eu deitar naquela coisa dura, estreita e fria, na sala com cor de praxe (por favor, senhores engenheiros, arquitetos, decoradores de salas de exames, se a cor das paredes não afeta o resultado dos procedimentos realizados, então, utilizem matizes diferentes do bege sem qualquer graça, para que os pacientes pacientes possam se sentir menos pacientes do que são), a agulha espetada na mão e o amigo fármaco injetado por uma seringa, enquanto as imagens eram vistas por alguém, eu não sabia quem, até que mexi um pé (sim, eu mexi um pé) o que fez surgir aos pulos e gritos uma criatura com metro e meio, avental branco, bigode, óculos e forte sotaque da zona leste: Não pode mexer! Não pode mexer! Pena que eu ainda não estava Super Sparkling.
Olho para a enfermeira, pergunto se o rapaz nervoso não gostaria de ir agora pro interior com ela pra se dedicar ao social e espero a volta da criatura à sala. Infelizmente, não é a primeira vez que me submeto a cintilografia e sei muito bem como me comportar, principalmente, quando sou bem orientada. Não devo me mexer naquele exato momento de total descontração e alegria? Então, diga: não se mexa, que virarei estátua. Uma estátua muito lindinha.
Reconhecido pelo biomédico o exagero da própria atitude, enquanto eu colocava meus tênis e pensava para onde ir durante as duas próximas horas de espera antes do retorno para nova leitura do contador de cintilância, aproximou-se com mais candura e orientou-me a beber água, muita água e a fazer xixi, muito xixi. E tomar cuidado na hora da higiene para que não ficasse qualquer resíduo que fatalmente brilharia no resultado do exame. Manchete de primeira página: A Super Sparkling Girl fez xixi brilhante.
Água, muita água, adoro água, um lanche básico e estava pronta para minha leitura quando toca o celular e falo sobre trabalho. Não agora, não depois dessas últimas semanas tão puxadas com excesso de coisas realizadas. Dou um tempinho, leio mais sobre a psique humana, ligo para meu filho, comento em que fase estou e combinamos o horário que ele me buscará – lógico, após eu passar na sorveteria que gostamos, não resistir a um sorvete de misk na casquinha super crocante, comprar uma caixa de isopor média com sorvete para casa e tomar um café esquisito no Starbucks, que vejo da janela na lanchonete do hospital.
Na realização do exame, na fase séria e cansativa, o mesmo filho de italianos, torcedor do palmeiras e apreciador de mar, que antes estava tão nervoso e outra biomédica. Dois profissionais? O chato é que podemos perceber, pelo cuidado que dedicam e pela retomada de imagens em determinadas posições, que encontraram algo. Não sei o que. Reconheço que fazer novamente esse exame me entristeceu.
O primeiro fiz em 2007, após a cirurgia e o regime de iodo, para detectar eventual metástase. Sim, às vezes eu escrevo detalhes insignificantes para não comentar outras coisas.

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