terça-feira, 31 de março de 2009

Amanda Hammar

Late night city traffic stills at last.
My bare feet press into the worn rug
that holds imprints from childhood.
I was visiting after years, no longer in place there or anywhere. You came to join me
in the dimly-lit room, whisky in hand.

I’ve been faithful to your mother
for fifty-five years of marriage you said,
your gaze looking past me to measure
the weight of so much history.
Even though there were moments . . .
perhaps I kissed someone else once.

As she slept soundly up the hallway,
our voices conspiratorially low,
I tried to reckon with the revelationof
over half a century’s fidelity,
but even more so with your need
to assert this fact of loyalty.

What burden were you hoping to lift,
what price to calculate, what prize to claim.
And why choose me as your witness.
Was it an oblique bid to free me
from my own stubborn devotion
to a love that bore no fruit.

* * *

house
too long abandoned
weeds pushing apart
scarred bricks
beams of weathered wood
exposed like ribs
no longer able to hold in
the soft heartbeat of
home

* * *

a man is lying dead
on a busy street
in carefree cape town
the crumbs of excess
elude him

he is far from home
and alone
an ordinary young man
in want of an ordinary life
or just a piece of bread

and so he eats his own shadow
consumes the last twinkle in his eye
swallows handfuls of poisonous hope

his teeth crack biting the pavement
the world passes by
except those who know
the taste of a shadow
and stop to mourn him

segunda-feira, 30 de março de 2009

Wakako Kaku

You’ve got a voice to sing songs
not to make speeches, right?
You’ve got ears to hear songs
not to listen to everything so you miss nothing
Your fingers are for caressing your beloved earlobes
not for pointing accusingly, right?

You’ve got limbs just to dance, don’t you?
Your hands are not for clinging to something
nor for clutching a knife
Your knees are not there for you to hug in a crouch
Your heels are not for stomping

Your skin is there to feel the breeze on your finger as it points to the sky
Your shoulders are there to catch flower petals
Your lips are for kissing
Your cheeks are there to be kissed, isn’t that right?

When each and every one of them
is used just as it is supposed to be
your body comes alive, doesn’t it?

You’ve got eyes to see the morning glow, don’t you,
however long this night might linger?

* * *
For every day’s delicious evening meal: Applause!
For the barest subsistence level – only delicious rice and pickles: Applause!

For all the piles of dog turds on the roadside: Applause!
For the rare experience of stepping on it in my new leather shoes
on my first date: Applause!

For a baby about to be born: Applause!
For a younger brother who died at childbirth –
Thank goodness he didn’t have to experience life’s hardships: Applause!

As for Grandpa who died at ninety,
for his having lived as long as ninety years in the kind of world we live in today: Applause!

Bravo for works of art by great geniuses: Applause!
As for artists endlessly beset by self-doubt, for the pleasure of their long journey: Applause!

For the well-formed person: Applause!
For the manliness of a macho who shows off in his vanity: Applause!
As for a man who constantly complains, for his frankness without vanity: Applause!

For a girl who is about to marry: Applause!
As for a girl who remains single, for her noble self-pride: Applause!

For a healthy, vibrant body: Applause!
For a man in his illness: Applause, because by that his power to survive is tested.
As for an incurable disease, for the dazzling sense it gives one that one is living at this very moment: Applause!

For a good man who will be saved as he is: Applause!
For a bad man who, because of the depths of his sin, has more room to be saved: Applause!

For the redness of a red winter camellia blooming on the fence: Applause!
For the dead winter camellia that, falling, scatters its seeds on the ground: Applause!

domingo, 29 de março de 2009

Mimos desenfreados

As palavras soltas daqui, às vezes, parecem cobrar atitudes diferentes dos meninos enquanto, aparentemente tendenciosas, parecem deixar de lado as atitudes das meninas, que sem dúvida norteiam grande parte das atitudes adotadas pelos meninos.
Em outras palavras, toda a geração colhe os frutos plantados por três ou quatro centenas de desvairadas.
Assim, em prol do equilíbrio, eis o relato de um grupelho de mulheres que disputavam o posto de quem mais havia se dedicado ao homem que leva ao lado - em nítida confusão entre o amar o e pagar mais, para manutenção da dupla e para o controle sobre a dupla. Quanto aos meninos beneficiados por tais medidas, alguns insistem em qualificar as mulheres que os tem ao lado de generosas, enquanto a outra parte não expõe a situação e nem de longe comenta.
Sentada próxima com uma amiga, presenciamos a disputa animada dessas meninas e confirmamos nossa conclusão, que jamais entraríamos nesse páreo tão duro, quanto vazio. Somos inaptas para tamanho desvario e acreditamos em outras formas de provar e dizer, sem alarde e todo o dia, o simples e verdadeiro eu te amo.

Vamos lá, queridinhas, contem quais as melhores e mais inesperadas demonstrações de carinho e amor que vocês dedicaram ao amado e o surpreenderam e o extasiaram e deixaram tão claro o quanto ele é único e especial. Algo feito por e para ele, sem qualquer resultado em favor de vocês.
Serve aquele bendito curso de culinária búlgara que paguei pra cozinheira aprender a preparar as coisas que ele mais gosta? Culinária búlgara? Seu marido gosta da culinária búlgara? Desde quando? Ah, queridinha, comentar sobre as centenas de músicas que você gravou em inúmeros CDs e as milhares de fotos que você tirou, pousou, forçou, publicou e organizou melhor do que qualquer secretária executiva experiente faria, não vale. Mesmo porque espalhar CDs, fotos, cremes, prendedores de cabelo, sacolinhas e bilhetinhos pela casa e pelo carro dele, enquanto ele também estava com aquela garota, só contou a seu favor, não é mesmo? E as aulas de 'pole dance' que fiz e levei um tempão para conseguir me equilibrar naquele cano preso no teto ao mesmo tempo em que eu fazia gestos, caras e bocas super sexies para ficar parecida com a experiente professora. Isso conta muito, porque meu amorzão adora e vive indo com os amigos nessas boates. E ainda tive que fazer dois meses de fisio na academia para colocar a minha coluna no lugar. E você, querida, nem venha com as capas que você insistiu em medir, encomendar e colocar no sofá e poltronas do fofo, porque seu interesse era levar e instalar o fofo e os móveis do fofo em sua casa, para seu exclusivo benefício. Vocês sabem como meu benhê é ciumento e possessivo, né, então, eu comprei um super MacBook Pro só pra ele, assim ele deixa de usar o meu PC. Foi um presentão, vocês não acham? Ela tem razão! Eu sei, por isso o tempo todo dou um jeitinho de lembrar o investimento que fiz para que o meu amore realizasse o sonho do refúgio fora da megalópole e do quanto rebolei para desenhar e redesenhar o projeto e comprei presentinhos básicos, uma pia aqui, um vaso sanitário lá, pratos, talheres, mais pratos, copos, escada, móveis, capas, tapetinhos e mais tapetinhos naturais de grama para reforçar o paisagismo, cortinas, lençóis, os terrenos em volta, ufa, suado real sobre suado real, tudo revertido só para o meu amore, além da chuva que fiz questão que enfrentássemos juntos do frio que fiz questão que sentíssemos juntos da lama que fiz questão que afundássemos juntos e dos banhos de balde que fiz questão que tomássemos juntos e vocês se lembram bem dos meus comentários do quanto eu detestava aquele desconforto todo, por mais que eu jogasse com experiências passadas, tudo isso por e para ele, porque o refúgio e dele, só dele e eu não me meto. Essa, sim, entra para a lista da maior demonstração de carinho e amor desprendido e sem intenção que uma mulher poderia dedicar a um homem. Mas isso não ganha da maravilhosa casa de campo, naquela serra líndissima, que eu comprei pro ursão no começo do ano passado. E como vocês se esquecem da viagem surpresa que fizemos...

Cabelo

O cabelo faz do homem um ser misterioso que carrega na cabeça, na parte do corpo que é mais nítida e mais marcada, uma coisa rebelde como um mar e confusa como uma floresta. Está quase fora do corpo, é uma espécie de jardim privado, onde o dono exerce à vontade sua fantasia e sua desordem. É qualquer coisa que cresce e que transborda como se estivesse livre do domínio da alma.
Gustavo Corção

Marquei hora para cortar o cabelo e considerei o tempo que levaria do escritório até o salão, no dia que volto a pé por conta do rodízio do carro. Gosto de cumprir o horário, ainda mais quando marco no começo da noite e sei que todos querem encerrar suas tarefas e descansar. Só não contava com a conversa interessante, sobre um caso novo, que começou assim que o horário do expediente acabou e eu já deveria estar a caminho do salão. Mas como deixar de atender ao pedido de um colega recém chegado de reunião, que estava em dúvida sobre a caracterização da responsabilidade civil? Impossível. O jeito foi depois acelerar bem o passo e aproveitar a regra da ladeira a baixo.
Percebo que está na hora de cortar o cabelo quando comento com meu filho minha intenção e ele pergunta: Tirar o volume? Quando o prendedor que uso não consegue manter todas as mechas acima da nuca; quando sinto calor com o cabelo solto; quando deixo o cabelo secar naturalmente – sempre deixo o cabelo secar naturalmente – e seco ele adquire vontade própria e ora parece o cabelo de uma cantora de rock, ou de uma good girl with bad thoughts.
Comentei em outro texto que não me preocupo com eventuais centímetros a mais ou a menos, não faço parte da turma histérica e ameaçadora ‘cortar só as pontas' nem ligo para o jeito que será cortado. Não peço para ficar parecida com a Juliette Binoche, nem com a Lena Olin, porque sei que por mais que levem fotos, mostrem a revista, não há jeito de ficar com a cara de outra pessoa. Por isso, escolho um bom profissional, confio e não fico atenta para ver o que fazem com meu cabelo, simplesmente relaxo e aproveito para descansar. No meu caso, uma boa profissional e dona da Princesa (uma Akita elegante e toda branca), que sempre me atende com carinho, atenção e com quem solto sonoras risadas.
Gostei do resultado, meu filho gostou do resultado, meu cachorro me reconheceu e voltei a prender todas as mechas acima da nuca quando tenho vontade, além de não me preocupar se as manhãs de outono ficarem mais frias e o cabelo secar naturalmente.
Uma coisa que não consigo entender e a cabeleira solta em qualquer ocasião. Do supermercado à festa habillé, não importa se o vestido é longo, cheio de detalhes e a maquiagem mais do que caprichada, o quilométrico cabelo segue solto e não muda.
São elegantes as mulheres que se preparam para uma festa e arrumam seus cabelos com maestria: Não consideram os penteados super elaborados e tão artificiais, nem os cabelos presos sem qualquer criatividade, do mesmo velho jeito tradicional como se tivessem setenta, oitenta anos de idade. Talvez seja uma questão de estilo, quem sabe.

sábado, 28 de março de 2009

Leite derramado

Enquanto discutimos sobre as interrupções das gravidezes de meninas com menos de 10 anos de idade, estupradas várias vezes, durante anos, comumente em seus próprios lares pelos pais biológicos ou pelos homens que suas mães trazem para dentro de suas casas, os chamados padrastos, meninas são estupradas ou contra elas são praticadas cruéis agressões sexuais.
Enquanto discutimos sobre as interrupções das gravidezes de meninas com menos de 10 anos de idade, crianças, meninas e meninos, são vítimas de criaturas cruéis e gravemente enfermas.
Enquanto discutimos sobre as interrupções das gravidezes de meninas com menos de 10 anos de idade, descobrimos através da mídia, que o material obtido durante o maltrato o abuso e o estupro de crianças é divulgado em redes de informação de criaturas cruéis e gravemente enfermas.
Quando começarmos a discutir o que fazer para que crianças, meninos e meninas, nunca mais sejam abusados, maltratados, estupradas, talvez, consigamos evoluir e, aos poucos, com extremo esforço, mereçamos ingressar na espécie humana.

Nossas crianças, as crianças deste país, deste planeta

É inconcebível que crianças sejam abusadas e violentadas.

É inconcebível que quase a metade das vítimas de violência sexual, diariamente atendidas em hospital paulista, seja composta por meninas com menos de doze anos de idade.

É a nossa sociedade enferma e perversa que necessita de fármaco urgente e eficaz.

Todas as crianças devem ser salvas deste mal e somos nós que continuamos a errar.

A discussão, a maior discussão deveria ser sobre a solução para que as crianças jamais sejam vítimas de violência, abuso, maltrato, de qualquer espécie.

The New York Times
Alexei Barrionuevo
Em São Paulo
No Brasil, debate sobre aborto intensifica-se à medida que aumentam casos de abusos contra meninas.
A sala de espera do Hospital Pérola Byington lembra sob vários aspectos um pequeno parque infantil. Garotas brincam no piso frio ou balançam-se para frente e para trás de maneira hiperativa em cadeiras de plástico, enquanto as suas mães olham com a expressão triste para o painel digital de números vermelhos na parede, que indica a vez de cada uma na fila.
Mas esta é uma clínica de saúde para mulheres, especializada no tratamento de vítimas da violência sexual. Dos 15 casos do gênero que o hospital atende em média a cada dia, quase a metade envolve crianças de menos de 12 anos.
Embora grande parte do Brasil tenha ficado furiosa devido ao caso da garota de nove anos de idade que abortou gêmeos neste mês, após alegar ter sido estuprada pelo padrasto, casos como o dela são bastante comuns na clínica.
A história de estupro e gravidez envolvendo uma pessoa de tão pouca idade parece ter pego a nação despreparada, e fez com que voltasse à tona um debate tenso a respeito dos direitos à reprodução no país que possui a maior população católica do mundo.
Mas médicos, funcionários de clínicas e outros especialistas dizem que o caso dela é sintomático de um problema generalizado de abuso sexual de garotas menores de 18 anos - algo que há muito tempo é negligenciado e que só tem piorado."Infelizmente, isso está se tornando cada vez mais comum", diz Daniela Pedroso, uma psicóloga que trabalha aqui há 11 anos.
Pesando apenas 36 quilos e mal chegando aos 1,22 m de altura, a garota de nove anos de idade, de Alagoinha, uma cidade do nordeste brasileiro, foi submetida a um aborto na 15ª semana de gravidez em um dos 55 centros autorizados a realizar esse procedimento médico no Brasil. Aqui o aborto só é legal em casos de estupro ou quando a mulher corre risco de vida.
A ação dos médicos gerou uma onda de controvérsia. Um arcebispo brasileiro excomungou sumariamente todos os envolvidos - os médicos por terem realizado o aborto e a mãe da mulher por ter permitido a operação -, exceto o padrasto, que é acusado de ter estuprado a menina durante vários anos.
"A lei de Deus está acima de qualquer lei humana" disse José Cardoso Sobrinho o arcebispo, que argumentou que, embora o estupro tenha sido ruim, o aborto foi ainda pior. A tempestade intensificou-se quando uma alta autoridade do Vaticano apoiou as excomunhões. Mas depois a conferência dos bispos brasileiros anulou a decisão de Sobrinho, afirmando que a mãe da criança agiu "sob pressão" dos médicos, que afirmaram que a menina morreria caso fosse até o fim da gravidez, e que somente os médicos que realizam "sistematicamente" o aborto podem ser expulsos da igreja. Finalmente, a principal autoridade de bioética do Vaticano, o arcebispo Rino Fisichella, também criticou a posição inicial, afirmando: "Ao que parece, a credibilidade dos nossos ensinamentos recebeu um golpe aos olhos de muitos, porque a decisão foi considerada insensível, incompreensível e destituída de compaixão".
O caso fez com que viessem à luz outros casos de meninas que foram estupradas e engravidadas por familiares, especialmente na região nordeste, que é mais pobre.
O número de abortos legais feitos por meninas de dez a 14 anos de idade mais do que dobrou no ano passado. Em 2008 foram registrados 49 desses casos, contra 22 em 2007, segundo o Ministério da Saúde. Esses números dizem respeito a um universo de 3.050 abortos legais realizados no ano passado em um país de mais de 190 milhões de habitantes. Mas a grande maioria dos abortos praticados no Brasil não é legal. O Ministério da Saúde calcula que a cada ano sejam praticados no país cerca de um milhão de abortos clandestinos e sem condições de segurança.
As leis brasileiras referentes ao aborto estão entre as mais rígidas da América Latina. Somente o Chile, El Salvador e a Nicarágua, que proibiram totalmente o aborto, seja qual for o motivo, são mais rígidos quanto a isso, segundo o Centro de Direitos Reprodutivos, que apoia o direito ao aborto.
Em algumas regiões da América Latina, e, mais notavelmente na Cidade do México, onde os abortos durante o primeiro trimestre da gravidez são agora legais, as leis foram relaxadas. Mas em outras áreas e países, os legisladores tentaram tornar mais rígidas as restrições ao aborto.
Há 20 anos, o Brasil contava apenas com um centro para a realização do aborto. Hoje, além das 55 clínicas que fazem aborto, cerca de 400 outras tratam pacientes que foram vítimas de abuso sexual. "Ainda não é suficiente", afirma Beatriz Galli, advogada de direitos humanos da Ipas, uma organização que exerce pressões pela expansão dos direitos reprodutivos da mulher. A maioria das clínicas financiadas pelo Estado fica em capitais que, em certas regiões, só podem ser alcançadas após uma viagem de barco de até 11 horas de duração, e elas encontram-se concentradas na região sudeste, que é a mais rica do país.
Os indivíduos que são contrários ao aborto, e que representam a maioria no Congresso brasileiro, estão pressionando para tornar a legislação para o setor ainda mais rígida. Dentre as cerca de 50 propostas relacionadas ao aborto que estão sendo avaliadas no Congresso, pelo menos 40 procuram criminalizar ainda mais o procedimento, segundo um estudo realizado pelo Centro Feminista de Estudos e Assessoria, um grupo brasileiro que apoia leis de aborto menos restritivas. Uma delas tornaria obrigatória a inserção de rótulos nos exames caseiros de gravidez com advertências como "A pena para o aborto varia de um a três anos de prisão".
O acesso às clinicas legais de aborto é um desafio. A menina de nove anos de Alagoinha procurou ajuda médica após reclamar de dores. Mas, como não havia um centro legal de aborto perto da sua casa, ela teve que ser levada a uma clínica pública em Recife, a 225 quilômetros da sua cidade. Lá, os médicos afirmaram que o útero dela era muito pequeno para abrigar um bebê, e muito menos dois.
O padrasto da garota de nove anos foi preso e acusado de estuprar tanto ela como a sua irmã de 14 anos de idade em diversas ocasiões, segundo declarou mais tarde a polícia.
O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, disse lamentar a decisão do arcebispo de excomunhar os dois médicos, afirmando que estes agiram corretamente ao salvar a vida da garota. "Ela provavelmente precisará de décadas de tratamento psicológico para voltar à vida normal", disse o presidente.
Aqui no Hospital Pérola Byington, os médicos dizem que os abortos são muitas vezes necessários para proteger a vida das vítimas da violência sexual. Dos 47 abortos que o hospital realizou no ano passado, 13 foram feitos em garotas de menos de 18 anos de idade, todas elas vítimas de estupro.
Segundo os médicos da clínica, em mais de 80% dos casos, pais e padrastos cometeram abuso sexual. "Uma parcela da sociedade brasileira ainda não deseja deixar de tratar as mulheres como se elas fossem uma propriedade", afirma Jefferson Drezett, ginecologista e coordenador do serviço prestado pelo hospital às vítimas de abuso sexual. "Isso tem que mudar".
No início deste mês, uma mulher de 21 anos entrou no hospital com a filha de seis anos de idade. A menina havia sido molestada pelo padrasto da mulher, que deseja que ele seja preso.
A mulher, que não quis que o seu nome fosse publicado, sentou-se para passar por uma entrevista em uma sala que tem cadeiras pequenas e bonecas, e que é usada para a avaliação psicológica das vítimas. Ela disse que morou com o padrasto até os 14 anos de idade, quando se sentiu desconfortável com as investidas dele e pediu a mãe para deixá-lo.
Lutando para conter as lágrimas, ela diz temer que o homem abuse sexualmente de crianças que ainda moram com ele, incluindo as filhas do próprio filho dele, que tem a idade aproximada da menina que foi vítima de abuso.
"Não queremos acreditar no que aconteceu", diz ela. "Achamos que isso só acontece na televisão, que é um conto da carochinha. Mas a realidade é que pode acontecer com qualquer família, e, quando acontece, é muito difícil lidar com isso".
Mery Galanternick, no Rio de Janeiro, contribuiu para esta reportagem.
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2009/03/28/ult574u9257.jhtm

quinta-feira, 26 de março de 2009

Consciência e atitude - as ações eficazes de cada um para a proteção deste planeta


Contra o aquecimento do nosso planeta uma pequena atitude. Uma ação mínima que há dois anos aconteceu na australiana Sidney. Um quase nada que ao menos serve para fazer pensar, para querer saber mais sobre o tema, sobre as consequências do aquecimento global.
O Aquecimento global é um fenômeno climático de larga extensão observado através do aumento da temperatura média da superficial global nos últimos 150 anos. Certas causas naturais, além das ações provocadas pelo homem, são estudadas para explicar esse fenômeno.
Devido aos efeitos potenciais sobre a saúde humana, economia e meio ambiente o aquecimento global é fonte de grande preocupação.
Importantes mudanças ambientais têm sido observadas e foram ligadas ao aquecimento global. Os exemplos de evidências secundárias citadas abaixo (diminuição da cobertura de gelo, aumento do nível do mar, mudanças dos padrões climáticos) são exemplos das conseqüências do aquecimento global que podem influenciar não somente as atividades humanas mas também os ecossistemas.
O aumento da temperatura global traz a mudança do ecossistema; algumas espécies podem ser forçadas a sair dos seus hábitats (possibilidade de extinção) devido a mudanças nas condições ambientais enquanto outras podem espalhar-se, invadindo outros ecossistemas.
O aquecimento da superfície favorecerá o aumento da evaporação nos oceanos o que fará com que haja na atmosfera mais vapor de água e aumentará cada vez mais o efeito estufa.
Assim, a superfície terá um aquecimento médio de 4 a 6°C, além de pesados aguaceiros e mais erosão.
O aumento do número de mortos, desabrigados e perdas econômicas previstas devido ao clima severo atribuído ao aquecimento global será piorado pelas densidades crescentes de população em áreas afetadas, assim, já observamos o aumento do número de ciclones tropicais no Atlântico Norte e toda a devastação que causam às cidades litorâneas próximas.
Efeitos adicionais antecipados incluem aumento do nível do mar de 110 a 770 milímetros entre 1990 e 2100, repercussões na agricultura, possível desaceleração da circulação termoalina, reduções na camada de ozônio, aumento na intensidade e freqüência de furacões, a baixa do pH do oceano e propagação de doenças como malária e dengue. Um estudo prevê que 18% a 35% de 1103 espécies de plantas e animais serão extintas até 2050, baseado nas projeções do clima no futuro.

Autômato

Sexta-feira à noite
Os homens acariciam o clitóris das esposas
Com dedos molhados de saliva.
O mesmo gesto com que todos os dias
Contam dinheiro, papéis, documentos
E folheiam nas revistas
A vida dos seus ídolos.

Sexta-feira à noite
Os homens penetram suas esposas
Com tédio e pénis.
O mesmo tédio com que todos os dias
Enfiam o carro na garagem
O dedo no nariz
E metem a mão no bolso
Para coçar o saco.

Sexta-feira à noite
Os homens ressonam de borco
Enquanto as mulheres no escuro
Encaram seu destino
E sonham com o príncipe encantado.

Marina Colasanti

Imagem obra de David Hockney

quarta-feira, 25 de março de 2009

Pares e casais vazios

Em outro texto comentei sobre a triste visão de casais em restaurantes, que mal trocam uma palavra e demonstram, com imensa nitidez, o quanto são infelizes, incompletos, obrigados, enfastiados. Igualmente comentei sobre casais formal e aparentemente felizes, atores de teatro que são.
Era muito divertido frequentar restaurantes com minha mãe, porque ela tinha a exata e imediata visão e nunca errava. Minha mãe tinha a capacidade de enxergar as pessoas como realmente são e também se entristecia com tamanho vazio existente entre os casais.
Mudo um pouco o enfoque e comento sobre homens e mulheres que almoçam durante a semana em conhecido e movimentado restaurante na área de avenida Paulista.
As mulheres tratam de negócios e o fazem com extrema competência e profissionalismo. Falam, olham, agem como profissionais diretas e competentes. Os homens profissionais, em frente dessas mulheres profissionais, mantêm o olhar vazio, o comportamento autômato e a mente longe, bem longe.
Alguns, poucos, parecem que ouvem com atenção a conversa sobre as vantagens de certo produto, de certa aplicação e quando conseguem – porque elas falam sem parar – fazem algum comentário, mas possuem o nítido olhar de homens que planejam o passo seguinte à sobremesa, sem que talvez nenhum negócio tenha sido fechado.
Na semana passada fui almoçar com uma amiga e observei, comentei sobre os pares profissionais próximos, além de ter chamado minha atenção um casal que destoava de todo o cenário, do mundo atual.
Ele literalmente encantado, amoroso, carinhoso, realmente educado, dedicado de fato, só tinha olhos e braços e mãos para ela, além de uma aliança enorme no dedo anelar da mão esquerda. Ela, sem aliança alguma, mas com alguns anéis imensos (como evitar comentários tipicamente femininos?) não era bonita, tinha os cabelos pretos compridos super alisados, a pele morena, a sobrancelha bem fina e era carinhosa com ele, sua mão sempre apoiada no peito dele, no ombro dele, no braço dele. Não se sentaram de frente, mas um ao lado do outro. Serviram-se juntos no bufê, ou melhor, ele a serviu com gentileza e educação e ela não demonstrou qualquer surpresa com essa atitude (como? ainda existem homens que servem as mulheres durante a refeição, sem que sejam garçons?), o tempo todo ele esteve de verdade preocupado com o bem estar dela. Conversaram muito e o olhar de um ficou no olhar do outro, como se mais ninguém estivesse lá, ele literalmente hipnotizado por ela. Ele não era falso ou hipócrita em suas atitudes e em momento algum demonstrou qualquer desconforto por estar em restaurante conhecido e bem frequentado. Aquele homem era feliz ao lado daquela mulher e toda a sua atenção foi dedicada a ela, a ponto de minha amiga achar que estavam em lua de mel. Após o almoço pensamos pedir um curso, talvez uma palestra a moça, para que ela ensine a todas nós a arte de realmente encantar – encantar a alma. Ah, não venha me dizer que tudo se resume a sexo, porque alguns homens mantêm relação sexual satisfatória fora do insatisfatório casamento, mas nem de longe tratam as mulheres (ao menos as duas de suas vidas) como aquele homem fez. Raríssima visão.


Reli as palavras soltas aí, em cima, e parecem apologia da infidelidade. Não! Longe disso. Não acredito que enganar, mentir, desrespeitar traga qualquer mérito, muito pelo contrário. Apenas vi um homem com comportamento real e bem diferente do que há tempos vejo. Ele estava encantado, embasbacado, maravilhado. Aliás, farei outro exercício: Casados os dois saíram do restaurante e foram à joalheria retirar a aliança da moça do conserto. Pronto.
O fato é que não importa a idade, o nível social e cultural, infelizmente, a grande maioria dos homens perdeu a gentileza em algum momento entre o dia do nascimento e o dia da saída da maternidade embalados em cueiros e aconchegados nos braços de suas progenitoras.
O comportamento da maioria das mulheres auxiliou a rarear a gentileza do homem (e as progenitoras também tem considerável parcela de responsabilidade no jeito que educaram seus pimpolhos), mas na vida a tendência é a evolução, o aprimoramento, o que não acontece com os relacionamentos amorosos.
Por isso, adapto a 'frase enlatada': avô rico, pai remediado e dos netos ninguém sabe, para avô homo neanderthalensis, filho hobbit e neto australopitheco. Sobre a evolução feminina? Talvez as progenitoras também tenham errado com suas pimpolhas.

segunda-feira, 23 de março de 2009

domingo, 22 de março de 2009

Famílias e bichos

Um filme leve divertido e gostoso de assistir é My Family and other animals (2005) sobre a infância do famoso ambientalista naturalista e zoólogo inglês, Gerald Durrell, durante os anos que sua família viveu na ilha de Corfú (1935-1939).
Gerald Durrell nasceu na Índia, em 1925. Três anos depois, com a morte de seu pai, a família mudou-se para a Inglaterra e em 1935, trocaram Londres pela ensolarada ilha grega. Lá, o garoto Gerald encontrou o médico, cientista, poeta e filósofo Theodoros Stephanides, que se tornou seu amigo e mentor na observação e pesquisa da fauna.
A diversão maior está nas características distintas de cada membro da bem humorada família: Mãe e quatro filhos (o mais velho, Lawrence Durrell, se tornou diplomata e reconhecido escritor, poeta e dramaturgo) e no comportamento dos moradores da ilha.

"Corfu an isle where mountains meet the sea, a lighter purple on the blue; and grey-green olive-trees, sun-kissed, show silver glinting through."

Gize



Google satélite - A piramide de Gizé, uma das sete maravilhas (do mundo antigo, como passaram a ser chamadas).

Ilimitado

Condenado estou a te amar
nos meus limites
até que exausta e mais querendo
um amor total, livre das cercas,
te despeça de mim, sofrida,
na direção de outro amor
que pensas ser total e total será
nos seus limites da vida.

O amor não se mede
pela liberdade de se expor nas praças
e bares, em empecilho.
É claro que isto é bom e, às vezes,
sublime.
Mas se ama também de outra forma, incerta,
e este o mistério:
- ilimitado o amor às vezes se limita,
proibido é que o amor às vezes se liberta.

Affonso Romano de Sant'Anna

Imagem de Doisneau

M.A.S.H.





É muito bom reservar algumas horinhas para curtir um bom livro, ouvir música ou assistir a TV em paz, ainda mais se encontramos algum filme que nos traz boas recordações e diversão. É impossível não se render às críticas, ao humor, à irreverência, ao estilo de M.A.S.H. e sugerir ao filho que também assista, para que ele se divirta e conheça mais a obra de Altman da década de setenta.
Donald Sutherland e Elliot Gold estão sensacionais e não foram superados na série de TV posterior, estrelada por Allan Alda.

sábado, 21 de março de 2009

Manuel Bandeira

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o
cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora
de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário
do amante exemplar com cem modelos de cartas
e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

Imagem de Doisneau

Com uma amiga dessas, quem precisa de mais amigas?

Camilla Rosemary Shand, a sra.Parker Bowles, mãe dedicada e mulher fidelíssima do oficial do exército Andrew Parker Bowles (amigo do príncipe de Gales, ex-namorado da princesa Ana e afilhado da rainha mãe) foi a maior incentivadora do casamento do século da linda Diana e tornou-se mundialmente conhecida através do Camillagate e demais situações pra lá de interessantes na qualidade de amante oficial de um príncipe de verdade - e quem se envolveria com um príncipe de verdade?
Pois em 1898, aos vinte e nove anos a bisavó de Camilla, Alice Edmonstone Keppel, tornou-se a amante oficial de Eduardo VII, então com 57 anos (filho da rainha Vitória e trisavô do príncipe atual), que desde 1862 era casado com a princesa dinamarquesa Alexandra, mãe de seus seis filhos. O relacionamento da bisavó de Camilla com o tataravô de Charles durou doze anos e era ela quem acompanhava o rei nas viagens oficiais ao exterior, além de estar ao lado dele no leito de morte. E a rainha Alexandra? Está mais do que provado que duas mulheres não ocupam o mesmo lugar e que alguns homens tem memória muito fraca e seletiva. Coincidentemente, Alice Keppel morreu no mesmo ano que sua famosa bisneta nasceu. Como dizem que certas características genéticas ressurgem em gerações futuras, a filha de Alice Keppel, Violeta Trefusis, só fez fugir do marido em 1920, para passar seus dias com a escritora Vita Sackville-West. Mas, por sua vez, Camilla ultrapassou a famosa bisavó e deixou de ser apenas a amante oficial do príncipe para se tornar a princesa consorte, além de receber os títulos de Duquesa da Cornualha e de Rothesay. Foi ou não foi um super upgrade?

Acreditaram os românticos que ao se casar com a aparente bruxa o príncipe sapo desencantaria e viveria feliz para sempre, mas se esqueceram da supernanny e desconheciam – ou fingiam desconhecer – Janet Jenkins, que recentemente surgiu na mídia após ter faturado cerca de 20 mil euros por seis cartas recebidas do mesmo príncipe, de quem também teria sido amante. Os entusiastas poderiam criar versinhos: Janet traiu Camilla que traiu Diana que casou com o príncipe que não consegue amar ninguém.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Here comes the Super Sparkling Girl

O principal material empregado em medicina nuclear é o tecnécio-99m, emissor gama com energia aproximada de 140 KeV, que pode ser detectado com um contador de cintilância. A cada seis horas a radiação emitida pelo tecnécio cai pela metade. Sua eliminação ocorre pelos rins.

Ora direis contar estrelas, acompanhada pela aparente banalidade na execução de exames realizados nas catacumbas hospitalares, normalmente no antepenúltimo subsolo, onde estão instaladas as unidades de medicina nuclear.
A começar pelo preparo: Pode tudo, menos utilizar roupa com qualquer metal e uma única condição proibitiva: a gravidez. Quando a enfermeira quis minha confirmação de que não havia qualquer possibilidade de eu estar grávida, não pude evitar o meu melhor rostinho de terna desprotegida e meiga dúvida. O bom humor faz toda a diferença.
Quero saber mais sobre o fármaco (sim, utilizam a palavra fármaco e acho que é para inibir mais ainda o paciente) que será aplicado por essa agulha diretamente espetada na veia da minha mão: O que é, quais são os efeitos, as contra-indicações, quanto tempo ficará no meu organismo e o que devo fazer para não prejudicar outras pessoas, afinal, por um período serei a Super Sparkling Girl com poderes sensacionais.
E quem diria que fármaco e tecnécio seriam palavras latinas? sânscritas? gregas, portanto, incompreendidas pelas maioria dos mortais.
A enfermeira trabalha no mesmo lugar há quinze anos e não vê a hora de mudar-se ‘para o interior’ (não importa qual interior) para dedicar-se ‘ao social’. Durante a série de perguntas de praxe começou a olhar-me com ar de comiseração e foi saber do biomédico se o tal do fármaco deveria ser aplicado na sala de espera ou ‘diretamente no aparelho’. Como, não entendi? Esse tecnécio é meu! Pois, lá fui eu deitar naquela coisa dura, estreita e fria, na sala com cor de praxe (por favor, senhores engenheiros, arquitetos, decoradores de salas de exames, se a cor das paredes não afeta o resultado dos procedimentos realizados, então, utilizem matizes diferentes do bege sem qualquer graça, para que os pacientes pacientes possam se sentir menos pacientes do que são), a agulha espetada na mão e o amigo fármaco injetado por uma seringa, enquanto as imagens eram vistas por alguém, eu não sabia quem, até que mexi um pé (sim, eu mexi um pé) o que fez surgir aos pulos e gritos uma criatura com metro e meio, avental branco, bigode, óculos e forte sotaque da zona leste: Não pode mexer! Não pode mexer! Pena que eu ainda não estava Super Sparkling.
Olho para a enfermeira, pergunto se o rapaz nervoso não gostaria de ir agora pro interior com ela pra se dedicar ao social e espero a volta da criatura à sala. Infelizmente, não é a primeira vez que me submeto a cintilografia e sei muito bem como me comportar, principalmente, quando sou bem orientada. Não devo me mexer naquele exato momento de total descontração e alegria? Então, diga: não se mexa, que virarei estátua. Uma estátua muito lindinha.
Reconhecido pelo biomédico o exagero da própria atitude, enquanto eu colocava meus tênis e pensava para onde ir durante as duas próximas horas de espera antes do retorno para nova leitura do contador de cintilância, aproximou-se com mais candura e orientou-me a beber água, muita água e a fazer xixi, muito xixi. E tomar cuidado na hora da higiene para que não ficasse qualquer resíduo que fatalmente brilharia no resultado do exame. Manchete de primeira página: A Super Sparkling Girl fez xixi brilhante.
Água, muita água, adoro água, um lanche básico e estava pronta para minha leitura quando toca o celular e falo sobre trabalho. Não agora, não depois dessas últimas semanas tão puxadas com excesso de coisas realizadas. Dou um tempinho, leio mais sobre a psique humana, ligo para meu filho, comento em que fase estou e combinamos o horário que ele me buscará – lógico, após eu passar na sorveteria que gostamos, não resistir a um sorvete de misk na casquinha super crocante, comprar uma caixa de isopor média com sorvete para casa e tomar um café esquisito no Starbucks, que vejo da janela na lanchonete do hospital.
Na realização do exame, na fase séria e cansativa, o mesmo filho de italianos, torcedor do palmeiras e apreciador de mar, que antes estava tão nervoso e outra biomédica. Dois profissionais? O chato é que podemos perceber, pelo cuidado que dedicam e pela retomada de imagens em determinadas posições, que encontraram algo. Não sei o que. Reconheço que fazer novamente esse exame me entristeceu.
O primeiro fiz em 2007, após a cirurgia e o regime de iodo, para detectar eventual metástase. Sim, às vezes eu escrevo detalhes insignificantes para não comentar outras coisas.

Outono

quinta-feira, 19 de março de 2009

Ser consciente

Se tivéssemos a real capacidade de entender o que significa amar, teríamos comportamentos bem diferentes, diríamos palavras bem diversas, viveríamos nossas vidas de forma desigual e faríamos com que a felicidade do ser amado fizesse parte da nossa própria felicidade.
Isso é um resumo de vida construtiva, saudável e feliz, cuja viabilidade é plena, a realização ao alcance de todos e a execução de extrema facilidade, desde que tenhamos a real capacidade de entender o significado de amar.
Para compreender o real significado do amor é necessário ser consciente.
Em relação à consciência consideramos duas possibilidades básicas: Estar consciente e Ser consciente.
Estar consciente é fazer uso da razão ou da capacidade de raciocinar e de processar os fatos que vivenciamos. É ser capaz de pensar e ter ciência das nossas ações físicas e mentais. A consciência permite-nos a lucidez e a percepção que temos em relação ao mundo.” Uma dose a mais daquele vinho tinto espetacular, por exemplo, pode alterar o estado de nossa consciência.
Ser consciente não é um estado momentâneo em nossa existência, mas refere-se à nossa maneira de existir no mundo. Está relacionado à forma como conduzimos nossas vidas e, especialmente, às ligações emocionais que estabelecemos com as pessoas e as coisas no nosso dia a dia. Ser dotado de consciência é ser capaz de amar!
O Ser consciente vincula-se ao lado subjetivo e compreende o sentido ético de nossa existência. “A consciência não é um comportamento, nem algo que possamos fazer ou pensar. A consciência é algo que sentimos. Ela existe antes de tudo, no campo da afeição e dos afetos. Mais do que uma função comportamental ou intelectual a consciência pode ser definida como uma emoção.

A consciência é um senso de responsabilidade e generosidade baseado em vínculos emocionais de extrema nobreza com outros seres (animais, humanos) ou até mesmo com a humanidade e o universo como um todo.”
A consciência nos orienta para o caminho do bem, nos impulsiona a tomar decisões aparentemente irracionais, baseia nossas atitudes cotidianas, nossa bravura, coragem, nosso sacrifício. “A consciência nos abraça e conduz pela vida afora, porque está em plena comunhão com o mais poderoso combustível afetivo: o amor.”
Todas os seres conscientes se emocionam com vários fatos da vida, sentem as belas melodias, apreciam a exuberância da natureza, se alegram com os gentis atos de amor, vibram frente à superação de obstáculos pelas pessoas,
se comovem com situações trágicas, se indignam diante do desrespeito e da injustiça, exercem a compaixão. "A consciência genuína nos impulsiona a ir ao encontro do outro, colocando-nos em seu lugar”.
Todos que são conscientes sentem empatia.
Somente os conscientes possuem julgamento moral interno, senso ético, sentem culpa, remorso, inquietação mental, constrangimento por terem desapontado, magoado, enganado alguém.
Por outro lado, os seres desprovidos de consciência são calculistas, frios, incapazes de tratar as pessoas com verdadeiro respeito e consideração, não possuem
escrúpulos, não sentem culpa nem remorso, desconhecem o arrependimento, são dissimulados, mentirosos, manipuladores e visam apenas seu próprio benefício, o que é prático e vantajoso para si. Porém, para sua total infelicidade, são incapazes de estabelecer vínculos afetivos verdadeiros e de se colocar no lugar do outro. Desconhecem a empatia.
O gradativo aprendizado resulta em maior compreensão e as palavras ouvidas, as ações propostas não realizadas, a dureza e as constantes omissões adquirem real dimensão.


Citações do livro "Mentes perigosas" de Ana Silva
Imagem de Lemony Snicket's a series of unfortunate events (2004)

quarta-feira, 18 de março de 2009

Indiscutível talento

Era uma vez um ator britânico, filho de dois atores britânicos (Margaret Scudamore e Roy Redgrave), que era embalado pela mãe com sonetos shakespearianos e foi considerado um dos maiores atores ingleses do século XX e um dos melhores intérpretes da obra de Shakespeare, que também virou Sir, Sir Michael Redgrave, e casou-se com a atriz Rachel Kempson, Lady Redgrave, com quem teve três filhos, todos atores: Vanessa, Corin e Lynn, que cresceram e se casaram e tiveram filhos. Vanessa casou-se com o cineasta Tony Richardson, com quem teve Joely Richardson e Natasha Richardson e, depois, teve Carlo Gabriel Nero, roteirista e cineasta, filho do ator Franco Nero. Corin casou-se duas vezes, teve cinco filhos e a segunda, Jemma Redgrave, também é atriz e, por sua vez, Lynn é feliz em seu único casamento e seus três filhos, nenhum deles ator ou atriz.
Conto essa pequena história que merece um gráfico genealógico, resumo bem as informações e até embaralho um pouco os dados só para dizer que sempre admirei a arte de Vanessa Redgrave e sua verdade no ativismo sócio-político e aprendi a admirar as atuações de suas filhas (quem consegue esquecer Natasha
Richardson em The Parent Trap de 1998?) e que fiquei triste com a morte prematura de Natasha e a dor da mãe Vanessa.

Eu sei, mas não deveria

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos
e a não ter outra vista que não seja as janelas ao redor.

E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E porque não olha para fora logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.
E porque não abre as cortinas logo se acostuma acender mais cedo a luz.
E a medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem.
A comer sanduíche porque não dá pra almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra.
E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja número para os mortos.
E aceitando os números aceita não acreditar nas negociações de paz,
aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita.
A lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.

E a ganhar menos do que precisa.
E a fazer filas para pagar.
E a pagar mais do que as coisas valem.
E a saber que cada vez pagará mais.
E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e a ver cartazes.
A abrir as revistas e a ver anúncios.
A ligar a televisão e a ver comerciais.
A ir ao cinema e engolir publicidade.
A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição.

As salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro.
A luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
Às bactérias da água potável.
A contaminação da água do mar.
A lenta morte dos rios.

Se acostuma a não ouvir o passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães,
a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer.

Em doses pequenas, tentando não perceber, vai se afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá.
Se o cinema está cheio a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço.
Se a praia está contaminada a gente só molha os pés e sua no resto do corpo.

Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo
e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se
da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que
gasta, de tanto acostumar, se perde de si mesma.