terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Thanatos e esperança

Algumas coisas são tão polêmicas, não pela reação que causam na sociedade, mas pelo embate travado em nosso interior. É impossível desconsiderar os parâmetros adquiridos ao longo da vida e as referências que nos foram disponibilizadas. Baseada nisso, acredito em milagres. Acredito em recuperações inexplicáveis, em curas inesperadas, em soluções surpreendentes. Acredito, aceito, agradeço e não questiono.
No entanto, sempre surgem as nuanças tão diferenciadas. Quando eu era adolescente, do nada e em manifestação intuitiva, meu pai pediu que eu findasse seu sofrimento se algum dia ele ficasse preso, enfermo, a uma cadeira de rodas. O velho ateniense sempre me dedicou sua irrestrita confiança. No final de sua vida ele ficou dois anos preso a uma cadeira de rodas, por conta da hemiplegia decorrente de alguns AVC e do câncer na pleura. Foram dois anos de muito amor e dedicação. Foram também dois anos de egoísmo, por que não queríamos que ele morresse para que não ficássemos sozinhas, minha mãe e eu. Nosso esforço em favor de manutenção de sua dignidade foi imenso.
A crença dele sobre a eutanásia era clara.
Por sua vez, minha mãe sempre acreditou na evolução da medicina, nas curas de todos os males e na perseverança. Tentar e tentar e tentar e não desistir.
Expando o tema e o enfrento sob a ótica jurídica: Quanto interesse haveria para diminuir o tempo e aumentar o ganho. É inadmissível que a morte de alguém esteja sob o domínio de seus herdeiros e principais beneficiários. Assim como é injusto depender de qualquer decisão judicial sobre o tema. O que eu faria? Não sei. Quero ser e sempre fui justa e correta, pois minha mãe e eu nos dedicamos ao meu pai e meu filho e eu nos dedicamos a minha mãe. Ele morreu no hospital e ela morreu em casa, sem que soubéssemos, em meus braços, em frente ao neto amado que tentou de todas as maneiras traze-la de volta e independente da profissional atuação dos paramédicos presentes. Eu não tive que decidir em favor da eutanásia. Mas se eu tivesse que decidir, somente o faria após a balizada, clara, expressa e confiante manifestação de dois médicos nos quais confio, e somente eles. E desde que os milagres não ocorressem e que a paz divina me permitisse serenidade e justiça. Sim, eu tentaria, tentaria e tentaria até não poder mais.

Nenhum comentário: