segunda-feira, 1 de março de 2010

Abobrinhas rápidas

Primeiro de março, teoricamente começou a brincadeira do ano novo de fato, posterior ao réveillon e ao carnaval. Essa ideia comum, essa condescendente elasticidade da folga nunca funcionou para mim. Não há folga prolongada, nunca houve. E para sentir um teco a mais de ansiedade, eu percebo que a ida ao supermercado ridiculariza de vez nossa precária noção de tempo: 2009 terminou há cinquenta e nove dias, os enfeites e as ofertas de natal foram recolhidas, ainda existem panetones, frutas secas e cerejas a preço de banana e os ovos de páscoa já estão expostos, pendurados bem próximos de nossas cabeças. Decididamente, o comércio acelerou nosso envelhecimento.

Outro dia li artigo sobre a maternidade nos moldes antigos e a repercussão desse movimento. Céus! Um mês e meio após a comemoração dos meus vinte e um anos o pimpolho nasceu e eu tive que esquecer os temores característicos das mães inexperientes e, literalmente, arregaçar as mangas para lavar no tanque previamente esterilizado as fraldas de algodão (o pediatra, que foi meu pediatra, proibiu o uso da máquina de lavar), fervê-las em balde reservado para as roupas do bebê, passá-las, ferver as mamadeiras, os bicos das mamadeiras e tudo mais utilizado para chazinhos, sucos e papinhas. Liquidificador era outro utensílio desconsiderado: Os ingredientes frescos e recém cozidos das papinhas eram passados na peneira previamente escaldada com água fervente. Lembro o quanto eu me sentia esterilizada com tudo isso e também grata pela ausência de chupeta, senão seria uma coisa a mais para ser fervida. Durante quatro meses eu dormia três horas por dia, porque justo no penúltimo ano do curso de Direito, as aulas começaram quatorze dias depois do nascimento do garotão. Lógico que meu leite se foi com todo o cansaço. Os bebês das minhas amigas usavam fraldas descartáveis, papinhas da Nestlé, as mamadeiras e as chupetas caiam no chão e eram reutilizadas sem qualquer frescura, quanto muito uma sopradinha ou o passar da mão da zelosa mãe. Todas as crianças cresceram e todas as mães sobreviveram.
Sabemos que a maioria das mulheres posterga a maternidade em prol da carreira escolhida. A maternidade nos moldes antigos pressupõe mães em tempo integral e pais participativos. Caso contrário, será mais uma forma de aumentar nossa atávica culpa.

Tristeza. Cada vez que leio quem serão os candidatos sinto tristeza e penso no trabalho que terei para ir ao posto eleitoral e não votar. Por favor, não me tomem por exemplo, eu não sirvo pra coisa. Não consigo votar no “menos pior” e não dissocio vida pessoal, histórico dos feitos e vivências, das aspirações políticas dos candidatos. Para mim, o voto no Brasil não deveria ser obrigatório.
Tenho capacidade danada para perceber os recursos utilizados para aprimorar aparências e condutas. Eu não voto em aparências, nem em promessas.

Imagem de Lilian Brassman 

Um comentário:

Gerana Damulakis disse...

É mesmo, o comércio acelerou o nosso envelhecimento; não tinha pensado nisso, mas é verdade.

Está certa, nada de votar nas aparências. Seguirei, como você, Saramago em Ensaio sobre a lucidez.