sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Colcha de retalhos

Há tempos não comia um robalo tão gostoso quanto o de hoje. Robalo acompanhado por batatinhas cozidas e tomates frescos preparados de um jeito especial, para mim inédito, tudo com manjericão picado. Aliás, pedi reforço no manjericão e vieram folhas frescas, inteiras, com o delicioso perfume que o manjericão tem.

É engraçado como o jeito de pessoas recém conhecidas me faz lembrar o jeito de pessoas que conheci e assim, arranjei uma maneira meio inusitada de perceber um tantinho melhor o outro e não achar que todos são bons e honestos até que provem o contrário. Esse jeito de olhar eu já vi antes; esse jeito de falar, essa postura do corpo, essa insegurança disfarçada, esse sorriso, essa boa ou má educação, esse tique, essa mania. Não faço parte dos privilegiados capazes de conhecer o outro em segundos, minutos, talvez. Minha mãe era assim. Nunca errou. Confesso que algumas vezes eu gostaria que ela tivesse errado.

Pão escuro, folhas de rúcula (adoro rúcula), cream cheese, salmão defumado, limão e azeite. Salada de frutas e cappuccino com raspas de chocolate. Ar condicionado na medida certa, som ambiente gostoso, do lado de lá da parede de vidro a rua movimentada e do outro lado um monte de livros. Nada poderia estragar esse almoço, salvo alguns paquidermes que ocupam mesas sem nada consumir, outros que ocupam o lugar sem nada consumir e ainda falam muito ALTO e aqueles que juntam oito ou mais cadeiras em torno de uma mesinha que cabem duas, no máximo três cadeiras. Na semana passada eu quase perguntei se a reunião de condomínio estava no fim, mas a turma de engravatados falantes foi poupada do meu bom humor, graças a uma amiga que encontrou outra mesa que vagava naquele exato momento. Quando estou sem companhia, para minha alegria, encontro mulheres que almoçam sozinhas e perguntam se eu gostaria de compartilhar a mesa. Gosto muito dessa atitude, que sempre foi tão comum no exterior, e confesso que anos atrás me sentia um bichinho meio estranho, nas vezes que tentei ser gentil e compartilhar a mesa que ocupava sozinha.

Gosto muito da obra de Angelopoulos, de Costa Gravas e de
Cacoyannis, que reforçam a parte da Grécia que tenho em mim. Considero impossível não render-se aos enfoques que esses três cineastas tem do homem, da sociedade, dos conflitos, da política, dos sentimentos, dos valores e da vida. Os três extremamente talentosos. Excepcionais.

Leio duas tragédias de Eurípedes: As Troianas e Medeia. Às vezes é necessário buscar nas tragédias gregas a fórmula que resgata parte da essência da qual somos feitos.

Um livro delicioso de ler, presumo mais para as meninas, é Things I wish my mother had told me, de Lucia Van Der Post. Vai do como trabalhar e ter uma vida, aos cuidados com a casa, sem deixar de passar pelo comportamento ideal no primeiro encontro. Reconheço que algumas coisas mamãe deixou de me contar, ou, justamente por ser minha mãe, eu decidi não escutar. Confesso que minha rebeldia foi meio tola.

Sinto falta dos filmes de Katharine Hepburn e Spencer Tracy. Que dupla encantadora e genial!

Li a relação das cinquenta atrizes mais bonitas da história do cinema e fiquei decepcionada com algumas escolhas e com a falta de outras. Toda a relação que compreende qualquer coisa mais, ou melhor, de alguma história, já começa fadada ao fracasso.

Para meu pai, a mais bonita era Ava Gardner, que tinha o tipo que ele apreciava, e minha mãe considerava Tyron Power o mais bonito, além de fazer o seu tipo. O meu tipo está em construção.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Rather than love, than money, than fame, give me truth
















"And now, after two rambling years, comes the final and greatest adventure. The climatic battle to kill the false being and victoriously conclude the spiritual revolution."
Alexander Supertramp

Palm Springs
Salton Sea
Arizona
Colorado river
South Dakota
Hoover Dam
Nevada
Fairbanks

"So, in two seconds, away we went, a sliding down
The river, and it did seem so good to be
Free again and all by ourselves on the big
River and nobody to bother us."
Mark Twain – The adventures do Huckleberry Finn

"We are, finally, all wanderers in search of knowledge. Most of us
hold the dream of becoming something better than we are, something
larger, richer, in some way more important to he world and
ourselves. Too often, the way taken is the wrong way, with
too much emphasis on what we want to have, rather than what
we wish to become."
Louis L’Amour – Education of a Wandering Man

"Ivan Ilych’s life had been most simple and most ordinary and therefore
most terrible."
Leo Tolstoy – The Death of Ivan Ilych

"All nature is your congratulation, and you have cause momentarily
to bless yourself. The greatest gains and values are farthest from being
appreciated. We easily come to doubt if they exist. We soon forget them.
They are the highest reality… The true harvest of my daily life is somewhat
as intangible and indescribable as the tints of morning of evening.
It is a little star-dust caught, a segment of the rainbow which I have
clutched."
Henry David Thoreau – Walden, or life in the woods.

"There is a pleasure in the pathless woods
There is rapture on the lonely shore
There is a society where none intrudes
By the deep sea and the music in its roar
I love not man the less, but Nature more."
Lord Byron

"Rather than love, than money, than fame, give me truth."
Henry David Thoreau

"I want to go up to them and say stop
don’t do it – she’s the wrong woman
he’s the wrong man, you are going to do things
you cannot imagine you would ever do."
Sharon Okis

"I have lived through much and now I think I have found what is needed for
happiness. A quiet, secluded life in the country with the possibility of
being useful to people.”
Tolstoy
















































































Into the wild (2007) - directed by Sean Penn, based on Jon Krakauer's book about Christopher McCandless' life.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Pluma e brisa

Existe tanta coisa para escrever, ideias, descobertas, fases novas e do lado de fora, o mundo anda mais esquisito, as pessoas escancaram suas piores características ao invés de tratá-las para que os defeitos diminuam ou desapareçam, esquecemos alguns regras básicas para a vida, os melhores paradigmas são desconsiderados e os valores atuais – pseudo valores atuais - só ajudam a aumentar o assunto para escrever cada vez mais.
E eu ando mais leve? aberta? fácil na convivência? não me preocupando mais com o que não merece qualquer preocupação, os hormônios em dia, a fala mais solta, a mente leve e graças às responsabilidades seguidas cumpridas sozinha sem regatear um momento sequer ao longo de tantos anos, aprendo a maravilha dos espaços e das dimensões antes não percebidas e penso e liberto a mente, mas paro um pouco se me lembro daquele bendito contador lá em baixo, que inventei de colocar aqui e acho estranho (será que cada acesso aumenta 100 números ou mais?), então, por enquanto, as coisas ficam meio ditas, meio pensadas e outras totalmente esquecidas.

Ando sem paciência para fatos já conhecidos e não apreciados, bem como entristecida com certas atitudes que ainda acontecem – ainda acontecem em 2009! – e mostram que a evolução comportamental e valorativa, às vezes, escorrega ladeira a baixo. O mundo é machista, minha filha. Velhas fórmulas desgastadas ainda não saíram de moda. Sou feliz porque pari filho homem, mas reconheço que o preparei para um tipo raro de mulher. Fidelidade canina não é mera expressão. A atitude de algumas mulheres me enjoa. A atitude de alguns homens me revolta. Gerir pessoas (não importa quantas), negócios (não importa o tamanho), recursos (não importa se públicos ou privados) requer duas coisas: Competência e vocação. Honestidade é qualidade esquecida, mas não desaparecida. Criança é palavra desrespeitada. O sexo ficou doente. Prazer e perversão não são sinônimos. Violência não é normal. A fé verdadeira ampara e fortalece o bem. Vender a alma para acumular dinheiro não dá certo. A verdade não é manipulável. Amizade entre homem e mulher é possível, se a mulher mantiver todos os pingos nos is. O amor não tolera falsidade. Não há nada melhor do que água mineral para matar a sede. Alimento saudável e saboroso faz bem para a alma. A felicidade não está no jardim vizinho, em alguém, na coisa desejada, no amanhã que custa a vir, mas aqui, agora, na simplicidade e dentro de cada um.


Imagem obra de Gustav Klimt

Conversa corrida

-Jura? Mas foi exatamente o que você ouviu? Que maravilha! Puxa! não acredito.
-Nem eu.
-Por quê? Não entendi. Essa não é uma das coisas que você mais queria ouvir?
-Sim, era. É. Mas esse ouvir não é inédito.
-Palavras.
-Palavras.
-Tem força.
-Sim, tem. Palavras verdadeiras tem força e se concretizam através de atitudes imediatas e certas. Jamais se perdem no vazio. As verdadeiras.
-Como era mesmo a frase que ouvimos semana passada naquela peça?
-Ah, lembrei. Perfeita.

-Por que tanta demora?
-Outras palavras.
-Quais?
-Projeto, chão, ambição, acordo, ganho.
-Reparou que acabam em o ...
-Controlar, manipular, centralizar.
-Agora, acaba em pastel de queijo.
-Crocante e fresquinho.
-Tudo isso se resume em vontade.
-Sempre se resumiu em vontade.
-Então, por quê a constante busca fora?
-Por que não se realiza dentro.
-À vontade.
-Pela manutenção.
-Que palavras!
-Palavras.

Duke Ellington

Duke Ellington é homenageado na nova moeda de 25 centavos de dólar.
O jazzista foi escolhido em votação realizada no distrito norte americano de Colúmbia.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Símbolos e mitologia

De repente lembrei-me da hidra – o famoso lembrar repentino, sem controle, regido pela sabedoria intuitiva que nos torna simples instrumentos - e resgato da mitologia, que desde pequena aprendi com meu pai, a exata imagem que ressurge: A hidra lamuriosa, plena de truques, ardilosa, insidiosa com aparência encantada e essência difícil ruim.
Ô Heracles, virtuoso e destemido Heracles, não se esqueça das famélicas e ressentidas cabeças que restam, todas menos uma que a natureza se encarregou de matar. Alimente-as com perdão e distância, deixe que aprendam, finalmente aprendam, o sabor dos feitos desfeitos. Deixe que sintam o amargor da dor da total ausência de pudor do simulado colorido para aliviar o interior solitário excessivamente cinzento. Sempre cinzento. Desde o útero pesado e cinzento. Desejo e culpa. Culpa sem desejo algum. Solidão temerosa. Opressão dos melhores sentidos. Doze tarefas, doze desígnios reunidos num só, único.
Ô Heracles, sábio herói a compensar sua própria ascendência com a excessiva dedicação sugada por hidra por hera. Como deter a própria natureza? Nem Heracles.

As neuras do feriado prolongado


Imagem de Norman Rockwell

Todos os gostos

Algum dia você resolve entrar no restaurante que fica naquele sobrado charmoso na ladeira conhecida, distante duas quadras da mais paulistana das avenidas e se encanta com as plantas bem cuidadas que caem pela parede, que estão em vasos, em jardineiras, então, (lembra das jardineiras com espinhos feiosos e sente saudade por que o amor verdadeiro não cede espaço, nem deixa de existir) repara na mesa com tampo de mosaico e sabe que algum dia montará seu próprio quebra-cabeça de ladrilhos multicoloridos quebrados do jeito que você quer. Repara nos pôsteres de bichos engraçadinhos, de plantas, em especial de dois amorosos porquinhos aconchegados sobre a grama acompanhados pela frase eles são nossos amigos e decide que daquele dia em diante o restaurante será conhecido como o amigo dos porquinhos.
Duas sensações iniciais ruins: Sobre o aparador gelado alguns pratos com coisas totalmente desconhecidas e o fato de não servirem coca-cola. Como não tem coca-cola? falei indignada, nem pepsi? Justo a coca-cola que eu considerava essencial para conseguir engolir a comida que servem em restaurantes perto do trabalho tão, mas tão diferente do alimento delicioso saudável e leve preparado pela minha mãe... Seis meses de almoço vegetariano e alguns adeptos adicionais ao amigo dos porquinhos, fizeram com que a coca-cola comprada no posto da esquina perdesse a razão de ser e me dão a sensação que ajudo meu organismo, que respeito cada vez mais meu slow food no work, se possível, sem nada falar – aprendi a deixar bem claro que durante os almoços da semana não quero pressa, nem falar sobre trabalho.
Delicio-me com vegetais, verduras, grãos, frutas (sempre gostei de vegetais, verduras, grãos e frutas, afinal, fazem parte da refeição mediterrânea que me seduz) doces, sucos diferentes, comida quente saborosa, o adocicado casado com o salgado do jeito que aprecio e a mistura criativa genial que incentiva o paladar com sabores diferentes e dispensa – não sei onde encontram tanta criatividade – qualquer animal amigo no preparo. Tenho uma hora para o almoço e lá fico uma hora, a curtir do jeito que gosto a salada, a sopa (três tipos de sopas diferentes todos os dias) o prato quente, o suco diferente e mastigo mais e não falo, nem penso e adoro o silêncio, que só é interrompido se, às vezes, algum grupo de gralhas aparece e atrapalha a especial harmonia. As pessoas que habitualmente frequentam aquele restaurante têm o jeito dos que se respeitam, se curtem e entendem que a refeição é momento sagrado.
Não, não virei vegetariana, por que nos finais de semana, se der vontade, vou com filho à churrascaria, como picanha com prazer e mesmo durante a semana curto muito o sanduíche com pão especial cream cheese salmão defumado limão e azeite de outro recanto próximo que também escolhi para mim, mas reconheço que sou mais feliz sem comer carne todo dia, sem beber coca-cola toda hora, sem anestesiar o paladar com comida de qualidade ruim.
No entanto, confesso que não vejo qualquer graça na proteína de soja e continuo a achar engodo chamarem de feijoada o que não é feijoada, bacalhoada o que não tem bacalhau e hambúrguer o que não tem carne. Tampouco uso bolsa e sapato de 'couro vegetal'. Sem exageros, sem ser radical.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Mamta Sagar

the song,
when it fell
crumbled
collapsed,
the earth shuddered
flowed in red
tomorrow’s history
(and the lines that remain out of it)unsung songs
quiver and quake
in soil and sludge
shattered dreams
buried wishes
flayed bodies

the last rays like pyre
set the river ablaze.

* * *

hara hara mahadeva!
shouts from throats filled with poison
rend these bodies

poison in the throat
seeps into the vein,
poison of the mind
renders the body blue

blue poison spreads across the sky
turns the corals and pearls in the ocean’s
depth blue
this is the time
the cradle of death swings with a lullaby
laa . . . laa . . . la lullaby

child, take care –
the butcher’s knife glistens
in the pool of flesh and blood
just two inches below the navel
sharpness slits through
even before the scream is out
manhood is proved and achieved

The breast, the vagina,
breast-milk, the monthly
flow of blood – have all
different meanings
in the politics of dharma

here, hands, feet, head, torso,
love, affection, sorroware
all soaked in blood

a wink of sleep for the pain
a tear or two for the hated
a little compassion in the heart
that is dharma.

Carnaval do jeito que eu quis

O que mais você precisa neste tempo de carnaval?
Cair na folia para descarregar todo o peso e renovar a energia para os próximos trezentos e tantos dias do ano? Sumir, se divertir, dar um tempo para tentar ser feliz e se esquecer de tudo, virar outra pessoa ou a pessoa que você sempre guardou aí, dentro, para depois voltar à mesmice morna e aguentar as escolhas mal feitas ao longo da vida? E por falar em vida, não seriam estes os dias que ela pulsa mais forte e plena de exageros, sem amarras, sem limites, o suor misturado ao ritmo a sensualidade independente e de ninguém?

Por treze anos o melhor companheiro que toda a mulher poderia querer, carioca bonito sorriso lindo braços fortes e protetores sempre alegre e animado carinhoso querido com suingue e muito samba no pé o corpo cuidado moreno gostoso, tudo entendia pelo olhar, não há nada melhor do que assistir a um show na praia, abraçados, sob o luar e o mundo de estrelas, de um lado o Pão de Açúcar, do outro a igreja matriz de Paraty, sob os pés a areia, a grama do Pacaembu e a do Morumbi, o ginásio candango com jeito de nave espacial, o rio de água gelada e pedras de Penedo o frescor do verde de diferentes cores de Visconde e vizinhanças.
Dizem que quem assistiu a um desfile assistiu a todos, mas não é bem assim; e, sim, todos deveriam ao menos uma vez na vida curtir o ensaio na quadra de alguma boa escola do Rio e o desfile principal na avenida, de preferência em algum lugar seguro e confortável, com visão privilegiada e vibrar com a entrada da bateria e deslumbrar-se com o som da bateria e encantar-se com o ritmo contagiante do Olodum na terça da bênção no Pelô em Salvador. E depois do banho daquele mar, daquele sol que brilha e avermelha a pele branca a cerveja gostosa e gelada e os melhores bolinhos de aipim e camarão que ninguém consegue imitar.
Dei graças a estes dias de carnaval que serviram para descansar sem horário, sem necessidades, sem tempo para nada, os músculos soltos leves, a mente solta e leve, o coração solto suave e leve, os ombros soltos e leves tão leves como jamais foram, o carinho retribuído pelo filho e pelo cão. Aqui, a sentir o frescor do verde oasis no meio de tanta construção, a curtir a lentidão na saborosa ingestão dos alimentos sem tempo, sem correr, sem o massacrante ter que. É exatamente isto que eu quis nestes dias de carnaval, além de bons filmes, boas leituras, plantas tratadas, a suave moleza e, de repente, me dei conta que era noite de Oscar, alguns filmes e atores que tanto aprecio e um único canal a passar a celebração – por que insistem na infeliz tradução simultânea? – e ainda consegui assistir a premiação da melhor música, do melhor ator, atriz, filme. Achei muito legal a presença de tantos atores e atrizes, cada um a homenagear algum indicado (o jeito carinhoso de Shirley MacLain falar com Anne Hathaway foi coisa de mãe boa conselheira). E o susto das crianças casadas, futuros pais de família e atuais donos de um rebelde dachshund, salsichinha aparentemente encrenqueiro ou mais incompreendido do que rebelde (na noite da mesma tarde que almoçamos juntos, em um restaurante diferente num bairro antigo da cidade, e nossa chegada rápida graças ao competente GPS), ao assistirem Mamma Mia e se lembrarem do rosto desta tia. Tia, por favor, fala com a minha irmã que anda desanimada e quer parar de advogar. Falo. Quem diria que Bollywood chegaria à Hollywood e nos traria a feliz lembrança de 1998, do único canal que assistíamos naquela ilha grega plena de musicais da MTV Indiana. Não quis mais nada neste tempo de carnaval, salvo quebrar a rotina, descansar e esquecer o relógio, em paz.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Jude Stéfan

Par désespoir de l'amour qui n'est
pas échu Par désespoir de la mort
qui déjà m'a prévu Par désespoir
du sexe qui nous fut à charge Par
désespoir de l'homme qui n'est que

misère Par désespoir du temps qui
n'est que poussière Par désespoir de
l'art qui n'a pas visité Par dés-
espoir de l'âme que l'on n'a pas
trouvée Par désespoir de soi qui
ne sut que honte Par dés-
espoir du suicide qui n'est qu'
alibi Par désespoir du monde
illusion Par désespoir où s'en-
fouir ? Dans l'étude par oubli
dans le stupre par malchance mais dans la mer pour s'y laver

* * *

Ils vont tête baissée sur leur entente
ils échangent leurs gestes

en secret se pressent les pieds
et dorment l'un pour l'autredu haut de leurs larmes jusqu'à leurs pardons
ils s'enchantent
chaque mardi d'un chemin de lierres et de lenteurs
à peine s'effleurant
puis follement s'abouchent
en pressant ses lèvres il serre son foulard
noir comme sexe et rouge sang
Il l'attend déjà demain dans l'ombre
chaque matin sied à leur visage
changeant d'alarmes en chuchotis
quand elle entre dans son espérance
Elle essuie ses pleurs
ou lui chante dans la nuit
alors ils se nomment animal ou ange
avant que leur manquent les mots
paupières allongées
ils se cherchent outre le corps
en cris et silences d'extase Il
raidit longtemps son âme en elle
tous cheveux renversés

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Vinhos, comidinhas e bom papo

"A parte dura desta humana lida
é dizer sim na hora do não,
escolher mal entre silêncio e grito,
entre a noite e a explosão
do dia.

Ceder quando devíamos negar, dizer
não em lugar de afirmar, partir
quando era bom amar, fechar-se
em vez de resgatar
a vida.

Sermos tão incertos e indecisos,
perdendo o trem, a hora,
o agora: mas a gente
não sabia."

Lya Luft

Com o jeito que é só dele, meu filho me lembra que trabalho começa de manhã e acaba no final da tarde para recomeçar no dia seguinte de manhã, que há o tempo de descanso e que a noite não foi feita para trabalhar, noite após noite, até bem tarde, porque ele sabe como foi o tempo passado do trabalho demasiado e não quer que a mãe dele repita a dose, agora, que a vida é presente. Ele está certo. Sou grata por seu lembrar conjugado com amar, mesmo se ao telefone respondo, quase peço mais meia hora, mais uma horinha e que ele não deixe de atender o celular quando eu ligar para avisar que cheguei em casa e sobrevivi à garagem do prédio de escritórios que fica um breu depois de certa hora e o caminho até a garagem do meu prédio, que tem lá seus meandros. Foi nesse horário doido de extremos, que deve ser reparado o quanto antes, que recebi o convite para nos encontrarmos na casa de uma amiga e colocarmos a vida em dia na noite que o marido dela sai para ministrar aula. Reencontramos-nos na Cultura, em noite de autógrafos (outra pausa feita no horário além do horário) de livro do qual o marido participou. Temos que nos reunir em casa. Pois lá fomos. O que levar? Algumas meninas costumam preparar gostosuras com as próprias mãos, ou, as mãos das mães e das empregadas, mas eu não tenho tempo durante a semana para preparar algo a mais e comprar, com esse forte calor, seria trabalhoso por que não teria onde guardar durante o dia, assim, a saída foi levar as duas melhores garrafas de vinho tinto (Chileno e da Toscana) que encontrei na loja perto do escritório. A diferença adicional foi a colorida sacola reciclável e reutilizável que fiz questão de comprar, ao invés de deixar que embalassem as duas garrafas. A melhor rota do trabalho para o Campo Belo, diversas sugestões, e saio correndo, já meio atrasada, no momento exato que mais uma coisinha poderia ser feita.
Gosto muito dessas reuniões em volta da mesa, nós mulheres, durante horas a beliscar as comidinhas e a bebericar o vinho servido em belas taças de cristal. Gosto dessa magia que o encontro de mulheres proporciona, do riso solto, do relaxar, das conversas infinitas e tão variadas que só mulheres sabem manter, dos rostos rosados pelo vinho maroto. Gosto do carinho que trocamos, dos planos, dos sonhos, do ânimo, do incentivo, das mazelas semi ditas e do tempo que não parece passar. Combinamos que esses encontros serão mensais.


Imagem de Gary Winogrand

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Adélia Prado

Quando fui ferida,
por Deus, pelo Diabo, ou por mim mesma,
- ainda não sei -
percebi que não morrera, após três dias,
ao rever pardais
e moitinhas de trevo.
Quando era jovem,
só estes passarinhos,
estas folhinhas bastavam
para eu cantar louvores,
dedicar óperas ao Rei.
Mas um cachorro batido
demora um pouco a latir,
a festejar seu dono
- ele, um bicho que não é gente -
tanto mais eu que posso perguntar
Por que razão me bates?
Por isso, apesar dos pardais e das reviçosas folhinhas
uma tênue sombra ainda cobre meu espírito.
Quem me feriu perdoe-me.

Imagem de David Hockney

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Afetividade

afetividade
a.fe.ti.vi.da.de sf (afetivo+i+dade)
1 Faculdade afetiva; qualidade de quem é afetivo.
2 Capacidade de exprimir-se na linguagem a emoção que nos despertam as idéias enunciadas, bem como a de despertar nos outros idêntica emoção.
3 Psicol Suscetibilidade a quaisquer estímulos ou disposição para receber experiências afetivas; o estudo dessas experiências.
Datação
1913 cf. CF2
Acepções
■ substantivo feminino
1 qualidade ou caráter de quem é afetivo
2 Rubrica: psicologia.
conjunto de fenômenos psíquicos que são experimentados e vivenciados na forma de emoções e de sentimentos
3 Rubrica: psicologia.
tendência ou capacidade individual de reagir facilmente aos sentimentos e emoções; emocionalidade Etimologiaafetivo + -i- + -dade; ver faz-Sinônimos afeccionabilidade; ver tb. sinonímia de meiguice

Como anda a sua afetividade ?
Pare dois segundos e pense nesta pergunta tão inesperada quanto inusitada. Quem sabe algum dia perguntarão sobre a sua afetividade e você terá a resposta pronta e não se sentirá surpresa, mas, ao contrário, você surpreenderá, tal qual cachoeira com água abundante e gelada que, de repente, surge no cenário retorcido do cerrado em tempo de seca.
Chuááááááá barulho de água abundante e gelada.
Imagine um lugar distinto público normal aceitável inserido na cordialidade que pessoas estranhas e respeitosas mantém ao tratarem, com competência, sobre tema do maravilhoso mundo dos negócios.
Para evitar qualquer engano procure no dicionário o significado de afetividade antes de responder como anda. Puxa, não há qualquer dicionário por perto? Então, responda o que surgir na mente. Quanto mais privilegiada a mente, melhor a resposta. Assim, do jeito mais parecido com água abundante e bem gelada. O único esforço, pequeno esforço, é não permitir que o rostinho seja o espelho da criança que brinca por dentro.

Imagem de Diane Arbus

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Sobre o verdadeiro amor

Essa é a história de uma menina e de um pássaro encantado que se apaixonaram. O pássaro voava para longe e voltava sempre, contando histórias de onde passou. Sofrendo com as constantes partidas do amado, a menina resolveu prendê-lo. Engaiolado, o pássaro mudou. Perdeu as cores nas asas; ficou sem canto. A menina também se entristeceu e acabou por abrir a gaiola. O pássaro agradeceu e partiu e ela passou a ver o mundo como um lugar encantado. Começou a se enfeitar e a se fazer bela, sempre à espera de um reencontro.
A moral dessa história é sabedoria imprescindível aos amantes, apaixonados, casados e namorados; aos pais e aos filhos, aos avós e ao netos, aos amigos : Não há amor que resista a perda da liberdade. Se não houver liberdade, não existe possibilidade que o amor dure.
O que amamos quando amamos alguém? Essa pergunta não tem resposta nem solução. Ela é terrível porque quer dizer que eu estou amando você por equívoco, já que você é apenas o espelho onde uma outra coisa aparece.

O que eu amo na realidade é essa outra coisa. Você, eu amo indiretamente. Pode até ser que eu deixe de amar você no dia em que eu perceber que este obscuro objeto de desejo não está mais sendo refletido em você. Os namorados têm que se acostumar com isso.
As pessoas que não sabem viver sozinhas estão o tempo todo mendigando aprovação das outras. É preciso aprender a viver só, aprender a fazer silêncio, para poder conviver com o outro, porque dentro de cada um mora uma grande solidão. Há um lugar dentro da gente que ninguém vai, somente nós. E nem nós mesmos sabemos como é esse lugar. Então temos que aprender a respeitar a solidão do outro e a nossa própria solidão. Há pessoas que não suportam a solidão do outro, acham que, quando o outro quer ficar sozinho, é uma indicação de que ele não está amando.
O amor pode se revelar a coisa mais triste quando descobrimos que não amamos quem pensamos amar e só nos resta alimentar da nostalgia que rosto algum poderá satisfazer.
Há um verso da Adélia Prado que diz “O amor é a coisa mais alegre, o amor é a coisa mais triste, o amor é a coisa que eu mais quero.” O amor está fadado a uma nostalgia pelo fato de que a gente sabe que o desejo da gente é possuir a pessoa amada. A sabedoria nos mostra que não é possível possuir nada, nem mesmo a nós mesmos. Então, porque eu nunca possuo, existe sempre uma pitada de nostalgia. É precisamente essa pitada nostálgica que torna o amor belo. O amor desapareceria se houvesse a certeza da posse.
Penso que é uma coisa muito boa a gente estar feliz com uma paixão correspondida. Tudo isso que eu falei não quer dizer que a gente não tenha a felicidade em uma paixão correspondida.
Só que a gente nunca pode ter certeza. É como se tivesse um passarinho no dedo, mas o nosso desejo é botá-lo na gaiola. É aquela história da menina e do pássaro. Eu me lembrei agora da frase do apóstolo Paulo, do Novo Testamento, em que ele diz: “Tendo como se não tivesse.”
Veja a questão dos filhos. Quando era mais jovem, meus filhos estavam naquela fase difícil da adolescência. Saíam, passavam a noite inteira fora, era perigoso. Vários filhos de amigos nossos morreram em desastres, em confusões, era aquela angústia permanente que eu tinha. Até que um dia me dei conta de que precisava aceitar a possibilidade da morte dos meus filhos. Do contrário, estava perdido. Meus filhos podem morrer a qualquer momento, a pessoa amada pode morrer a qualquer momento. Ou pode simplesmente ir embora… O que é pior do que morrer. Quando ela morre, fica minha, sabe? Se ela morrer eu sei que não vai me trair com ninguém. Está guardadinha na fotografia.
Tem aquele poema do Cassiano Ricardo em que ele fala: “Por que é que mais me comove o seu retrato quando você mesmo está presente? É porque ele está eterno, fixado, fora do tempo.” A possibilidade da perda existe, temos de aprender a conviver com ela. Se eu tiver medo de perder meus filhos, a minha tentação vai ser colocá-los em uma gaiola para que eles não se percam e, ficando numa gaiola, aí é que eles se perdem. É muito esquisito, mas tenho que aceitar o sofrimento de saber que eles podem voar e nunca mais voltar. Então tem sempre uma pitada de tristeza. Adélia estava certa.
O poeta Drummond diz que “amor com amor não se paga” porque todas as coisas do amor são gratuitas, você não paga nada. O caso é o seguinte: quando estou amando, posso amar sem ser amado. O amor pode ser solitário. O amor pode ser um ou pode ser dois. O amor que é apenas um é triste, pois não tem correspondência. A felicidade vem exatamente quando você tem os dois. Aí sexo fica sendo coisa de dois, porque é coisa do amor.
Acho comoventes as cartas de amor. Tem uma tela do pintor Vermeer que é uma mulher lendo uma carta. É um quadro que tenho no meu quarto. A carta só tem sentido quando os dois estão separados. A carta é um sinal de solidão. A gente escreve não para dar informação. As informações não têm a menor importância, porque elas não fazem parte da essência da carta de amor. O que faz uma carta de amor é o fato de que um tocou aquela folha e o outro vai tocar a mesma folha de papel. Assim, você toca a carta, mas o outro não está lá. É por isso que a carta de amor tem essa beleza triste.
Você não pode deitar com o telefone, nem abraçá-lo. Aí, a gente só fala coisas bobas. Numa carta você pode dizer que passou por uma rua, sentiu cheiro de jasmim, tantas coisas assim. No telefone, parece que essa intimidade é perdida porque ele não tem poder para guardar o amor.
O problema é que, mesmo se você imprimir o e-mail, não é possível guardar um perfume. Falta ao e-mail esse poder mágico das cartas de amor, mas é claro que você pode usá-los. Mas há desvantagens: na carta, você sabe que há intervalos e é nessa distância que acontece a saudade. O e-mail é tão fácil que não deixa isso acontecer. Por outro lado, têm possibilidades que a gente não explora.
No filme “Alguém tem que ceder”, há uma hora deliciosa que os personagens estão na cama e começam a se comunicar por Internet. E aquele se comunicar pela Internet é o início de um comunicar-se pela pele.
Acho que existe muita fantasia sobre o fato de que os velhos não têm mais desejo e poder sexual. Eu acho que eles não têm desejo porque a vida vai ficando tão chata e a relação vai ficando tão frouxa, sem sentido, que realmente as pessoas não têm desejos umas pelas outras. O problema não é hormonal. Eu me lembro de um caso gozadíssimo de um senhor de Minas, que era casado e muito respeitado. Era um casal símbolo da solidez. Mas a mulher dele morreu. Ele já estava com uns 70 anos e resolveu arrumar umas namoradas muito atrapalhadas. Até que a família se reuniu para dar um “chega pra lá” nele. Ele olhou para a família, deu um tapa na mesa e disse: “Eu tenho minhas necessidades sexuais. Está encerrada a conversa.”
O nosso desejo é sempre o de engaiolar o outro e levá-lo para caminhos que são nossos. Todos nós, o tempo todo, falamos sobre nós mesmos. Isso acontece não só no falar. Eu brinco que tenho vontade de inaugurar uma nova técnica de psicanálise em que o psicanalista pede que a pessoa leve à análise as fotografias que tirou no último ano. E nas fotografias dela está revelado o que ela considera como realmente importante. Porque quando eu fotografo, faço uma escolha.
É preciso que haja saudade para que o amor cresça. O cotidiano é terrível. A Lya Luft escreveu, depois que o amado dela morreu, o Hélio Pelegrino, que, como eles viveram pouco tempo, não houve tempo para a banalização da relação. O amor vive muito de fantasia, de encantamento. O cotidiano faz isso: a gente olha para a pessoa sempre tendo o perigo de se perder o encanto.
Não acredito que haja uma relação amorosa que seja só de encantamento. Mas acho que uma relação amorosa que não tiver, de vez em quando, uma experiência de encantamento, é uma relação amorosa que não vai durar. Você me perguntou se eu acho que é possível viver junto amando. Eu acho que sim. Mas isso só é bom se preservar essa relação de encantamento e os dois não virarem sócios na empresa chamada casa, matrimônio.
A arte de conversar é a sexualidade sob a forma da eternidade: É o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. É preciso dizer o seguinte: não adianta falar “ah, vamos dialogar”. Eu brinco sempre com a minha mulher, quando um está meio ruim com o outro, que é conversando que a gente se desentende. Tem que dar um tempo. Mas a relação amorosa acontece exatamente na conversa, quando você pode levar o outro para os seus caminhos. É a conversa que abre para o mundo interior, o que seduz a outra pessoa. Mas isso não quer dizer “vamos dialogar”, meio mecânico. Isso não funciona. Há determinadas coisas que não têm técnica, a gente precisa prestar atenção. É prestando atenção que a gente percebe quando é hora de falar e de se calar.
Há muitos casamentos que são equívocos e é bom mesmo que se desfaçam para as pessoas terem outras oportunidades na vida. Agora, o segredo de você ficar amando, isso eu não sei.
É preciso aprender a viver sozinho, a fazer silêncio. Assim, a gente pode conviver com o outro. A possibilidade de perda sempre existe e temos que aprender a lidar com ela também. Quem a gente ama pode voar a qualquer momento. O que digo é que, por favor, leiam a história da menina e do pássaro encantado. Porque a coisa mais terrível nos enamorados é a tentativa de controlar, de engaiolar. E não há amor que resista à perda da liberdade. Ela é mais importante que o amor. A liberdade é o ar que o amor respira. Se não houver liberdade, não existe a possibilidade de que o amor dure.

Rubem Alves

Novas mulheres

“Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.

Há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência.”

Pablo Neruda

Certas experiências semelhantes que ocorrem em determinadas fases desta vida e os comentários espirituosos que fazemos, sempre rendem sonoras risadas, além da certeza de que esta geração, a minha geração, transforma conceitos, ideias e cria novos comportamentos.
Um pouco cansadas, nem tão cansadas, mas bem conscientes do caminho percorrido até agora, das dores das alegrias das vitórias dos fracassos e da estrada à frente muito mais interessante e do nosso caminhar, nem tão célere, nem tão lento, no ritmo certo, na melhor cadência, suavemente, com as expectativas no lugar os sonhos na medida certa e a imensa descoberta que permite o amar-se e a deliciosa convivência com uma e todas que estão em nós. Um tantinho assim de confusão, e por que não, afinal, filhos não teremos mais e os netos algum dia virão e percebemos que poderíamos nos permitir o bom humor e a leveza dos comentários espirituosos – calma, querida, nem tão espirituosos assim, por que você se sente como se sente e aos poucos descobre que os outros não a vêem do jeito que você se sente, mas como uma mulher, baby, uma mulher interessante e pronta de verdade para a vida que você quer.
Estamos na fase das pesadas muralhas que desmoronam e deixam à mostra belos jardins internos cultivados com esmero e amor sem fim. Tempo demasiado foi dedicado à construção desse monte de pedra pesada sobre pedra pesada que agora ruem como cartas príncipes reis rainhas proteções, nem tão protetoras, que eram contra o forte sopro da matilha de lobos que vivem do lado de lá, e alguns entraram e sairam, sim, porque na vida, assim como em toda história encantada, existe o lobo mau que derruba casa de porco que usa roupa de menino, engana a garotinha no meio da floresta e engole a vovozinha inteira, que ressurge firme e forte após a cesárea que o caçador fez na barriga do bicho - eis que o lobo devolve à luz a velhinha de touca e camisola, que sobrevive, e as velhinhas sempre sobrevivem. Como perdem tempo esses lobos, para no fim terem na própria lobice a única e pior companhia, a essência de lobo esperto com alma de escorpião que mata sapo e mata tudo que sente pela frente pelos lados por trás, seca a vida, muda o rumo, impõe compasso e repete as mesmas atitudes até que, bem, até que certo dia, mamãe ganso e Esopo mandam de lembrança uma loba com essência de loba esperta e alma de escorpião fêmea e aí a coisa pega (lobas espertas com almas de escorpiões fêmeas são megeras de verdade, que não parecem ser megeras, por isso, também, muito difíceis de lidar) descobriram?

Pipas multicoloridas voam livres e belas no céu do mais belo azul que pode existir. Somos pipas. Risos soltos, cabelos ao vento (com a licença poética da melhor calibradora alquimista que põe no devido lugar tudo o que a perversão alheia desandou) porque de chapeuzinho, caçador e vovozinha todas temos um pouco.
Espere mais trinta anos para permitir-se dizer o que lhe der vontade e fazer as coisas ridículas que surgirem em sua cabeça, porque agora, ora, ora, menina moça ainda, derruba muralhas e sabe que no universo a ser descoberto, graças a Deus, o comportamento conquistado oscila entre a terra e o mar.


Imagem impressionante similaridade

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Anyone else, but you

Your part time lover and a full time friend
The monkey on your back is the latest trend
Don't see what anyone can see
In anyone else, but you
Here is the church and here is the steeple
We sure are cute for two ugly people
I don't see what anyone can see
In anyone else, but you
We both have shiny happy fits of rage
I want more fans, you want more stage
I don't see what anyone can see
In anyone else, but you
I'm always trying to keep it real
Now I'm in love with how you feel
I don't see what anyone can see
In anyone else, but you
I kiss you on the brain in the shadow of the train
I kiss you all starry eyed
My body's swinging from side to side
I don't see what anyone can see
In anyone else, but you
The pebbles forgive me, the trees forgive me
So why can't you forgive me?
I don't see what anyone can see
In anyone else, but you
I don't see what anyone can see
In anyone else, but you.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Chuva de verão

Algumas vezes sou pega pela chuva forte no meio da rua e continuo a andar, sem medo da água, sem pressa, sem nada temer, sem qualquer problema com cabelo que não é alisado com chapinha, química e outras coisas que as mulheres fazem para parecer do jeito que não são; quando muito, prendo o cabelo já molhado acima da nuca e deixo a água da chuva levar embora o que não presta e se impregna na gente e vem de dentro e vem de fora e vem do nada. As chuvas de verão esfriam a cabeça e fortalecem a menina sapeca, que pula nas poças de água e se diverte.

Imagem de Margaret Mee

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Barrigudinhos e tanquinhos.

Recebi o texto abaixo por e-mail de amiga mana muito querida e rendeu boas risadas na curta pausa que fiz, para um cappuccino gostoso e cremoso, entre os inúmeros relatórios do dia. Manter o bom humor, todos sabem, é fundamental.
Nós duas trocamos ideias sobre tudo: relacionamentos - futuros e futuríveis, comportamentos, trabalho, mães, sobre a vida. Entre nós existe uma sensação interessante de urgência? necessidade? um pressentimento que me faz pensar nela e ligar na hora para dizer algo bem humorado, soltar alguma brincadeira inesperada que a faça rir quando ela mais precisa rir, e dela para mim, quando a carga pesa e ela sente e telefona para me emprestar parte de sua força, no momento que eu mais preciso de força.
Não combinamos essas atitudes, apenas intuímos.
No final do dia lembrei-me de parte desse bem humorado conselho e imaginei o que eu diria a minha filha, se eu tivesse uma filha.
Querida, comecei, não se case com alguém mais vaidoso do que você por que o conteúdo do moço deve ser bem limitado e a competição será cruel. Tampouco se case com alguém desleixado e que não cuide da própria saúde (mental e física).
Tudo na medida certa, meu amor, porque as atitudes contam muito, muito mais do que palavras, caráter é essencial, bom coração é pressuposto e um cheirinho de lavanda inglesa na medida certa faz um bem danado. Pausa: Acabo de descrever meu pai.
Alguém honesto, verdadeiro, dedicado, bem humorado, que tenha barriguinha, por que não, mas que saiba fazê-la rir do mesmo jeito que Gerard Butler fez com Hilary Swank (P.S. I love you, de 2007) na cena que usava meias, suspensório, cueca samba canção estampadinha e balançava a barriga fora de forma da maneira mais sexy que conseguiu. Naquele filme Gerard Butler tem barriga e conteúdo da melhor qualidade, Jeffrey Dean Morgan tem barriga e ótimo conteúdo, Harry Connick Jr é o homem tanquinho e Lisa Kudrow dá um show ao explicar seu jeito de tratar os homens.
Observe, filha. Observe bem antes de escolher, pense antes de começar a amar e não acredite que barriga garanta caráter.


Namore um barrigudinho! (palavras de uma psicóloga experiente). Tenho um conselho valioso para dar aqui: se você acabou de conhecer um rapaz, ficou com ele algumas vezes e já está começando a imaginar o dia do seu casamento e o nome dos seus filhos, pare agora e me escute! Na próxima vez que encontrá-lo, tente disfarçadamente descobrir como é sua barriga. Se for musculosa, torneada, estilo "tanquinho", fuja!
Comece a correr agora e só pare quando estiver a uma distância segura. É fria, vai por mim. Homem bom de verdade precisa, obrigatoriamente, ostentar uma barriguinha de chopp. Se não, não presta.
Estou me referindo àqueles que, por não colocarem a beleza física acima de tudo (como fazem os malditos metrossexuais), acabaram cultivando uma pancinha adorável. Esses, sim, são pra manter por perto. E eu digo por quê. Você nunca verá um homem barrigudinho tirando a camisa dentro de uma boate e dançando como um idiota, em cima do balcão. Se fizer isso, é pra fazer graça pra turma e provavelmente será engraçado, mesmo. Já os "tanquinhos" farão isso esperando que todas as mulheres do recinto caiam de amores - e eu tenho dó das que caem.
Quando sentam em um boteco, numa tarde de calor, adivinha o que os pançudos pedem pra beber? Cerveja! Ou coca-cola, tudo bem também. Mas você nunca os verá pedindo suco. Ou, pior ainda, um copo com gelo, pra beber a mistura patética de vodka com "clight" que trouxe de casa. E você não será informada sobre quantas calorias tem no seu copo de cerveja, porque eles não sabem e nem se importam com essa informação.
E no quesito comida, os homens com barriguinha também não deixam a desejar. Você nunca irá ouvir um ah, amor, "Quarteirão" é gostoso, mas você podia provar uma "McSalad" com água de coco. Nunca! Esses homens entendem que, se eles não estão em forma perfeita o tempo todo, você também não precisa estar. Mais um vez, repito: não é pra chegar ao exagero total e mamar leite condensado na lata todo dia. Mas uma gordurinha aqui e ali não matará um relacionamento.. Se ele souber cozinhar, então, bingo! Encontrou a sorte grande, amiga. Ele vai fazer pra você todas as delícias que sabe, e nunca torcerá o nariz quando você repetir o prato. Pelo contrário, ficará feliz.
Outra coisa fundamental: homens barrigudinhos são confortáveis! Experimente pegar a tábua de passar roupas e deitar em cima dela. Pois essa é a sensação de se deitar no peito de um musculoso besta. Terrível! Gostoso mesmo é se encaixar no ombro de um fofinho, isso que é conforto. E na hora de dormir de conchinha, então? Parece que a barriga se encaixa perfeitamente na nossa lombar, e fica sensacional.
Homens com barriga não são metidos, nem prepotentes, nem donos do mundo. Eles sabem conquistar as mulheres por maneiras que excedem a barreira do físico. E eles aprenderam a conversar, a ser bem humorados, a usar o olhar e o sorriso pra conquistar. É por isso que eu digo que homens com barriguinha sabem fazer uma mulher feliz.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Calvin




Milagres

Quero fazer os poemas das coisas materiais,
pois imagino que esses hão de ser
os poemas mais espirituais.
E farei os poemas do meu corpo
E do que há de mortal.
Pois acredito que eles me trarão
Os poemas da alma e da imortalidade.
E à raça humana eu digo:
-Não seja curiosa a respeito de Deus,
pois eu sou curioso sobre todas as coisas
e não sou curioso a respeito de Deus.
Não há palavra capaz de dizer
Quanto eu me sinto em paz
Perante Deus e a morte.
Escuto e vejo Deus em todos os objetos,
Embora de Deus mesmo eu não entenda
Nem um pouquinho...
Ora, quem acha que um milagre alguma coisa demais?
Por mim, de nada sei que não sejam milagres...
Cada momento de luz ou de treva
É para mim um milagre,
Milagre cada polegada cúbica de espaço,
Cada metro quadrado de superfície
Da terra está cheio de milagres
E cada pedaço do seu interior
Está apinhado de milagres.
O mar é para mim um milagre sem fim:
Os peixes nadando, as pedras,
O movimento das ondas,
Os navios que vão com homens dentro
- existirão milagres mais estranhos?

Walt Whitmann

Imagem de Imoge Cunningham

Una elegía

En la época de mi madre
las mujeres eran probables.
Mi madre se sentaba junto a mi abuela
y las dos eran completamente de carne y hueso.

Yo soy apenas una secuela estable
de aquel exceso de realidad.

Y en la ansiedad del pasado indefinido,
en el aspecto durativo de elegir, escribo ahora: una elegía.

En la época de mi madre
las mujeres eran perdurables,
completamente hueso y carne.
Mi madre se ponía el collar
de plata y de turquesas
que mi padre le había traído de Suecia
y se sentaba a la mesa como una especia exótica,
para que todo se volviera más grande que la vida,
y cualquier ficción fuera posible.

En la época de mi madre, las mujeres
eran un quid: mi madre nos contó
a mi hermano y a mí: ‘cuando salía de la escuela,
iba a buscar a mi padre al trabajo,
en Santa Fe, y los compañeros le decían es un biscuit,
tu hija es un biscuit, y nunca supe qué querían decir,
qué era un biscuit’, un bizcocho estando muy enferma,
una porcelana exquisita todavía para nosotros,
y mi hermano apurándola: ‘¿Y?’

No sé qué es un biscuit, ¿una especia exótica.
algo de todos modos, especial? Igual
andaba delicadamente por la casa, rozando los ochenta
como se roza una herida
con una gasa.

En la época de mi madre
las mujeres eran muy visibles.
Mi madre se miraba en los espejos
y yo no llegaba a abarcar
su imagen con mis ojos. Me excedía,
la intuía a lo lejos como algo que se añora.

Como ahora,
una elegía.

A la criatura adorable
fijada en lo remoto de la foto,
que ya a los ocho años parecía
más grande que la vida: te extraño,
aunque no te conocía. Eso fue antes
que a mí me dieras vida
en un tamaño apenas natural.

Igual,
una elegía.

Y a la otra de la foto que espero
conservar, la mujer bella que sostiene
el libro ante la hija de un año
en el engaño de la lectura:
te quiero por lo que dura, y es suficiente
leer en el presente, aunque se haya apagado
tu estrella.

Por ella,
una elegía.

Ahora soy la fotografía
y vos el líquido revelador. Tu muerte
me convierte en yo: como una ciencia aplicada
soy la causa y el efecto,
el ensayo y el error, este vacío
de la nada que golpea el corazón
como cáscara vacía.

Una elegía,
cada vez con más razón

Mirta Rosemberg