sábado, 14 de abril de 2012

Doisneau

Há cem anos nascia Robert Doisneau, ele e Bresson, seus inspiradores (olha o húngaro André Kertész aí), seguidores e outros fotógrafos do velho e do novo continente, a maioria denominada fotojornalistas, responsáveis pelo encantamento que há anos sinto com as inúmeras fotografias que encontro, legados preciosos para a minha geração e para as gerações vindouras. 
Fica a homenagem. 

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Mstislav Rostropovich plays Bach

Frenesi fotográfico

Eu quero essa imagem, pronto. Ai vem outra, feito. Ah, essa eu não posso perder, clic. Clic clic clic clic é a nova compulsão sem limites dos aficionados pelas câmeras fotográficas, lentes e acessórios de seus celulares, os aparelhos cujas funções secundárias superaram a própria razão de existirem. 
Os celulares são os novos apêndices acoplados nas mãos e produzem efeitos distintos como a síndrome dos dedos nervosos, que causa movimentos espasmódicos e involuntários ávidos para transmitir mensagens de texto e espalhar novidades nas diversas redes sociais e, principalmente, captar todas as imagens possíveis, até mesmo as impossíveis e as pouco prováveis ou carentes de bom senso. 
Parece que tudo deve ser fotografado, desde o prato de comida, o cafezinho, até os próprios pés, sem esquecer das pessoas encontradas nos diversos ambientes e os desvalidos moradores de rua - aqui, mudo o tom: Já não basta o infortúnio sofrido pelo imenso contingente de moradores de rua, ainda devemos perturbá-los para captar suas imagens e, pior, publicá-las na internet? 
As pessoas não conversam, não convivem mais, compulsivamente apreendem imagens e assim acreditam estar satisfeitas.
Outro dia vi uma charge interessante: Um fotógrafo profissional, com seus equipamentos pendurados no pescoço, pedia licença a pessoas amontoadas que tiravam fotos com seus celulares e se diziam fotógrafas. 
Eu não sei se a super exposição alimenta o frenesi fotográfico ou se dele é resultante.

O questionável padrão feminino atual


Nossa visão está saturada com a super exposição. Nós estamos saturados e, às vezes, sequer percebemos. Começo pelo padrão, eu, que cresci na contracorrente e depois de desenvolver o meu próprio gosto nela permaneço. Cabelos quilométricos? Nunca tive e não quero ter. Trejeitos cabeçais não fazem a minha cabeça - o trocadilho é proposital. Comportamento, poses, trajes ditos ou considerados sensuais não se encontram em minha realidade, não com esse propósito. Considero o rosto lavado e a pele bem cuidada o auge da beleza e sou fielmente adepta da naturalidade. Por tudo isto, talvez, eu ainda não entenda o padrão feminino atual, escravo da super exposição tanto na aparência quanto no comportamento e no próprio pensar. Não, não retomo o batido discurso feminista que, dedo em riste, apontava para a coisificação da mulher, mas, convenhamos e infelizmente, cada vez mais as mulheres se adequam ao pior padrão possível.
Pego a imagem acima como parâmetro original: Uma foto tirada há setenta anos, em uma piscina pública qualquer, o policial conferia a propriedade do traje feminino de banho, que, por lei, no máximo poderia estar x centímetros acima do joelho. 
As pernocas continuam as mesmas, não há mais policiais preocupados com trajes de qualquer espécie, mas, ainda visualizo mãos que medem e definem normas, desta feita em direção oposta, e desvirtuam a máxima do menos é mais. Eu torço pela conscientização das pernocas, de todas as pernocas, e pela real valorização da mulher. Erramos feio, cada vez mais.        

Lamenting poetry



"Look, I'm protected
by the alibi of poetry,
I'm writing a poem.
And my need for meaning
grants me high credit
for zig-zag writing.
But no, I will not use exponents
of collective protection
exclamation mark, question mark, break.
I will use torment. West Balkan hardship.
Goodwill can come only from arrival:
I was combing my hair and a book arrived:
'Cutting the Chaos'. Elegantly
it became a part of my hairdo.
The fact os: One book, One poem,
One desired way.
I felt protection is... past, and
I keep emotion as a mask.


I exhausted my artistic strength. All
you could put in an ominous box
is working happiness."

terça-feira, 10 de abril de 2012

Julio e Louis, dois cronópios da melhor estirpe



Esta belíssima foto de Louis Armstrong no Egito, me fez lembrar o texto de Cortázar sobre a apresentação do músico em Paris, e o aparecimento dos cronópios, eles, Cortázar e Armstrong, dois cronópios por excelência.

"Louis, enormíssimo cronópio

Concerto de Louis Armstrong em Paris, no dia 9 de novembro de 1952.


Entre estes dois textos há quase quinze anos, mas não creio que se note muito: sempre que falo de jazz me sai uma voz parecida.
Cronologicamente, o primeiro cronópio foi Louis; em 1952 escrevi estas páginas publicadas na revista Buenos Aires literária graças à amizade de Daniel Devolto e de Alberto Salas. Anos mais tarde os cronópios fizeram sua entrada em massa pela via do livro e chegaram a ser bastante conhecidos nos bares, reuniões internacionais de poetas, revoluções socialistas e outros lugares de perdição. Acho justo reeditar este texto que, diferentemente dos outros, é história, cronópios verificáveis, sem contar que me enternece muito e que Narciso etc.


A referencia ao passarinho mandão na primeira frase corresponde a um ciclo do qual alguns poemas inéditos deixaram um testemunho um tanto sigiloso.


Parece que o passarinho mandão mais conhecido como Deus soprou no flanco do primeiro homem para animá-lo e lhe dar espírito. Se em vez do passarinho fosse Louis quem estivesse ali para soprar, o homem teria saído muito melhor. A cronologia, a história e outras concatenações são uma imensa desgraça. Um mundo que começasse por Picasso em vez de acabar nele seria um mundo exclusivamente para cronópios, e em todas as esquinas os cronópios dançariam tregua e dançariam catala, e Louis sopraria durante horas em cima do poste de luz fazendo cair do céu enormes pedaços de estrelas de calda e framboesa para as crianças e os cachorros comerem.
São coisas que você pensa quando está encaixado num assento do teatro de Champs Élysées e Louis vai aparecer a qualquer momento, pois esta tarde ele despencou em Paris feito um anjo, quer dizer veio pela Air France, e dá para imaginar a imensa bagunça na cabine do avião, com numerosos famas munidos de pastas cheias de documentos e orçamentos e Louis entre eles morrendo de rir, apontando com o dedo as paisagens que os famas preferem não olhar porque sentem náuseas, coitados. E Louis comendo um cachorro-quente que a garota do avião lhe trouxe para agradá-lo e porque se não trouxesse Louis correria atrás dela por todo o aeroplano até conseguir que a garota lhe fabricasse um cachorro-quente. Nesse meio-tempo chegam a Paris e lá em baixo estão os jornalistas, por isso tenho agora a foto do France-Soir e Louis ali cercado de caras brancas, e sem nenhum preconceito acho realmente que nessa foto sua cara é a única cara humana entre tantas caras de repórteres.
Agora veja só como são as coisas nesse teatro. Nesse teatro onde certa vez o grandissimo cronópio Nijiinsky descobriu que há balanços secretos no ar e escadarias que levam à alegria, dentro de um minuto Louis vai aparecer e aí começa o fim do mundo. Claro que Louis não tem a menor ideia de que no mesmo lugar onde apóia seus sapatões amarelos um dia pousaram as sapatilhas de Nijiinsky, mas justamente o bom dos cronópios é que eles nunca se preocuparam com o que aconteceu algum dia ou se aquele senhor no camarote é o príncipe de Gales. 
Nijiinsky tampouco teria se interessado em saber que Louis tocaria trompete em seu teatro. Essas coisas são para os famas e também para as esperanças, que se ocupam de reunir crônicas, estabelecer as datas e encadernar tudo com pelica e lombada de pano. Esta noite o teatro está copiosamente invadido por cronópios que, não satisfeitos de se espalharem pela sala toda e subir até nos lustres, invadem o palco e se esticam pelo chão, amontoando-se em todos os espaços disponíveis ou não disponíveis, para imensa indignação dos lanterninhas que ontem mesmo, no concerto de flauta e harpa, tinham um público tão bem-educado que era um prazer, sem falar que esses cronópios não dão boas gorjetas e sempre que podem se ajeitam por conta própria e não ligam para o lanterninha. 
Como os lanterninhas são em geral esperanças, ficam sensivelmente deprimidos com esses comportamentos dos cronópios e soltando suspiros profundos acendem e apagam suas lanternas, o que nas esperanças é um sinal de grande melancolia. Outra coisa que os cronópios logo fazem é começar a assobiar e a gritar de forma escandalosa, pedindo a presença de Louis que dando risadas os deixa esperando um pouquinho só para se divertir, de modo que a sala do teatro de Champs Elysées balança feito um cogumelo enquanto os cronópios entusiasmados pedem por Louis e uma infinidade de aviões de papel voam por toda parte e se metem pelos olhos e pescoços dos famas e esperanças que se retorcem indignados, e também de cronópios que se levantam enfurecidos, seguram o avião e o devolvem com uma força terrível, razão pela qual as coisas vão de mal a pior no teatro de Champs Elysées.
Agora aparece um homem que vai dizer algumas palavras ao microfone, mas como o público está esperando Louis e esse homem vem estorvar, os cronópios ficam furiosíssimos e o increpam de maneira veemente, abafando por completo o discurso do homem de quem só se vê a boca abrindo e fechando, o que o faz parecer-se de maneira extraordinária com um peixo num aquário.
Como Louis é um enormíssimo cronópio, sente pena do discurso perdido e surge de repente por uma portinha lateral, e a primeira coisa que se vê dele é seu grande lenço branco, um lenço que flutua no ar e atrás dele um jato de ouro também flutuando no ar e é o trompete de Louis, e atrás, saindo da escuridão da porta, a outra escuridão cheia de luz de Louis avançando no palco, e o mundo se acabou e o que vem agora é total e definitivamente a casa caindo e o final do blablablá.
Atrás de Louis vem a rapaziada da banda, e lá está Trummy Young, que toca o trombone como se tivesse nos braços uma mulher nua e de mel, e Arvel Shaw, que toca o contrabaixo como se tivesse nos braços uma mulher nua e de sombra, e Cozy Cole, que se debruça sobre a bateria como o marques de Sade sobre as bundas de oito mulheres nuas e fustigadas, e depois vêm outros dois músicos cujos nomes não quero lembrar e que estão ali acho que por um erro do empresário ou porque Louis os encontrou debaixo da Pont Neuf e viu que estavam com cara de fome, e além do mais um deles se chama Napoleão e isto é um argumento irresistível para um cronópio enormíssimo como Louis.
A essa altura o apocalipse já está desencadeado, porque basta Louis levantar sua espada de ouro e a primeira frase de When it's sleepy time down South cai sobre as pessoas como uma carícia de leopardo. 
A música sai do trompete de Louis como as fitas faladas das bocas dos santos primitivos, desenha-se no ar sua escrita quente e amarela, e atrás desse primeiro sinal se desencadeia Muskat Ramble e na platéia a gente se segura em tudo o que for segurável e também no que houver dos vizinhos, de maneira que a sala parece uma vasta sociedade de polvos enlouquecidos e no meio disso tudo Louis está com os olhos em branco atrás do trompete, com o lenço flutuando numa contínua despedida de algo que não se sabe o que é, como se Louis precisasse dizer adeus o tempo todo a essa música que cria e que se desfaz no mesmo instante, como se soubesse o preço terrível dessa maravilhosa liberdade que é a sua. Evidentemente que a cada refrão, quando Louis riça o riço de sua última frase e a fita de ouro se corta como uma tesoura fulgurante, os cronópios do palco pulam vários metros em todas as direções, enquanto os cronópios da platéia se agitam entusiasmados em suas poltronas e os famas que foram ao concerto por engano ou porque era preciso ir ou porque custa caro se entreolham com um ar estudadamente amável, mas naturalmente não entenderam nada, suas cabeças doem de maneira horrorosa e de modo geral gostariam de estar em casa ouvindo a boa música recomendada e explicada pelos bons locutores ou em qualquer outro lugar, a vários quilômetros do teatro de Champs Elysées.
Uma coisa digna de se considerar é que, além da imensa montanha de aplausos que cai sobre Louis quando termina seu refrão, o próprio Louis se apressa a mostrar-se visivelmente encantado consigo mesmo, ri  com sua grandíssima dentadura, sacode o lenço e vai e vem pelo palco, trocando frases de alegria com seus músicos e completamente satisfeito com o que está acontecendo. Então, enquanto Trummy Young empunhou seu trombone e está produzindo uma fenomenal descarga de som concentrado em massas metralhantes e escorregantes, Louis enxuga a cara cuidadosamente com o lenço, e junto com a cara, o pescoço e acho que até o interior dos olhos, a julgar pela maneira como os esfrega. Nessa altura dos acontecimentos vamos descobrindo os utensílios que trouxe para estar no palco como se estivesse em casa e se divertir à vontade.
Logo de saída utiliza a plataforma de onde Cozy Cole à maneira de Zeus profere raios e centelhas em quantidades sobrenaturais para guardar uma pilha composta de uma dúzia de lenços brancos que vai pegando à medida que o anterior se transforma em sopa. Mas naturalmente todo esse suor sai de algum lugar e em poucos minutos Louis sente que está desidratando, de modo que aproveita um terrível corpo-a-corpo amoroso de Arvel Shaw com sua dama morena para tirar da plataforma de Zeus um extraordinário e misterioso copo vermelho, estreito e altíssimo, que parece um copo de dados ou o recipiente do Santo Graal e beber nele um líquido que provoca as mais variadas dúvidas e hipóteses por parte dos cronópios presentes, porque não falta quem sustente que Louis toma leite, enquanto outros urram de indignação diante dessa teoria e declaram que em semelhante copo não pode haver outra coisa senão sangue de touro ou vinho de Creta, que vem a ser a mesma coisa com outro nome.
Enquanto isso Louis já escondeu o copo, está com um lenço seco na mão, e então sente vontade de cantar e canta, mas quando Louis canta a ordem estabelecida das coisas para, não por alguma razão explicável mas somente porque tem que parar enquanto Louis canta, e dessa boca que antes inscrevia as bandeirolas de ouro cresce agora um mugido de cervo apaixonado, uma queixa de antílope contra as estrelas, um murmúrio de abelhas na sesta das plantações. Perdido na imensa  abóboda de seu canto eu fecho os olhos, e com a voz deste Louis de hoje me vêm do fundo do tempo todas as suas outras vozes, a sua voz de velhos discos perdidos para sempre, sua voz cantando When your lover has gone, cantando Confessin', cantando Thankful, cantando Dusky Stevedore. E embora eu seja apenas um movimento confuso dentro do pandemônio perfeitíssimo do teatro pendurado como um globo de cristal na voz de Louis, regresso a mim mesmo por um segundo e penso em 1930, quando conheci Louis num primeiro disco, em 1935, quando comprei meu primeiro Louis, o Mahogany Hall Stomp de Polydor. E abro os olhos e ali está ele num palco de Paris, e abro os olhos e ali está ele, depois de vinte e dois anos de amor sul-americano ali está ele, depois de vinte e dois anos ali está ele cantando, rindo com toda a sua cara de menino irreformável, Louis cronópio, Louis enormíssimo cronópio, Louis alegria dos homens que te merecem.
Agora Louis acaba de descobrir que seu amigo Hugues Panassié está na platéia, e isso naturalmente lhe dá uma alegria enorme, de maneira que corre até o microfone e dedica a ele sua música, e com Trummy Young faz um contraponto de trombone e trompete que é para rasgar a camisa em tiras e jogá-las para cima uma por uma ou todas juntas. 
Trummy Young arremete feito um bisão, com umas batidas e umas quedas que te amassam as orelhas, mas agora Louis se insinua pelos espaços vazios e não se ouve outra coisa além de seu trompete, e então se percebe mais uma vez que quando Louis sopra, cada macaco no seu galho e alto lá. Depois é a reconciliação, Trummy e Louis crescem juntos como dois álamos e fendem o ar de cima a baixo com uma facada final que nos deixa a todos docemente estúpidos. O concerto terminou, Louis já deve estar trocando de camisa e pensando no hambúrguer que lhe vão preparar no hotel e no banho que vai tomar, mas a sala continua cheia de cronópios perdidos em seu sonho, montes de cronópios que procuram a saída lentamente e sem vontade, cada um com seu sonho que prossegue, e no centro do sonho de cada um, Louis pequenino soprando e cantando."

quarta-feira, 7 de março de 2012

Charlotte Gainsbourg - The Operation

Talvez não ser, é ser sem que tu sejas


Nossas crianças são todas as crianças do mundo

A gentileza e a solidariedade exercem especial e irresistível apelo sobre mim, me cativam imediata e fortemente, me emocionam. Constituem base sólida para o perdão e o acolhimento. 
Assimilamos costumes equivocados e padronizamos nosso comportamento da pior forma possível.
Falta-nos gentileza e solidariedade, por isso, a vida se apresenta dura e há tanta miséria. 
Essa, a miséria, é o auge da ausência de solidariedade e de gentileza em nós, é o não reconhecer-se no outro, a empatia atrofiada.

Sugiro a atenção voltada a este vídeo The Invisible Children (here, there and everywhere) e, se possível, sua divulgação e compartilhamento em outros blogs e sites. A notoriedade conferida aos algozes retirará seus insuportáveis e vazios poderes. Transformar a internet em instrumento para a boa mudança é conferir-lhe qualificação valiosa, é reconhecer sua abrangência ao mesmo tempo que a  capacita da criação de um mundo verdadeiramente melhor. 
Igualmente nos faz relembrar nossos próprios umbigos, os umbigos infantes e jovens diariamente explorados por adultos cruéis. A guerrilha ugandense transforma-se na metáfora do descaso que dedicamos às crianças e jovens daqui, do mundo.  

domingo, 4 de março de 2012

No vale la pena vivir para ganar, vale la pena vivir para seguir tu conciencia - Eduardo Galeano

Das minhas mãos saem acalentos





















No indispensável período de indulgência, necessário para a recuperação do corpo e da mente, em parte me inspirei nas preciosas receitas de minha mãe, em Nigella Lawson e em Annabel Langbein para o preparo de alimentos restauradores e saborosos - o perfeito equilíbrio entre o corpo e a mente, a cura.
O texto abaixo é de Nigella, sobre o seu livro “How to be a domestic goddes”, aproveitem:

This is a book about baking, but not a baking book – not in the sense of being a manual or a comprehensive guide or a map of a land you do not inhabit. I neither want to confine you to kitchen quarters nor even suggest that it might be desirable. But I do think that many of us have become alienated from the domestic sphere, and that it can actually make us feel better to claim back some of that space, make it comforting rather than frightening. 
In a way, baking stands both as a useful metaphor for the familial warmth of the kitchen we fondly imagine used to exist, and as a way of reclaiming our lost Eden. This is hardly a culinary matter, of course: but cooking, we know, has a way of cutting through things, and to things, which have nothing to do with the kitchen. This is why it matters.
The trouble with much modern cooking is not that the food it produces isn’t good, but that the mood it induces in the cook is one of skin-of-the-teeth efficiency, all briskness and little pleasure. Sometimes that's the best we can manage, but at other times we don’t want to feel like a post-modern, post-feminist, overstretched woman but, rather, a domestic goddess, trailing nutmeggy fumes of baking pie in our languorous wake.
So what I’m talking about is not being a domestic goddess exactly, but feeling like one. One of the reasons making cakes is satisfying is that the effort required is so much less than the gratitude conferred. Everyone seems to think it's hard to make a cake (and no need to disillusion them), but it doesn’t take more than 25 minutes to make and bake a tray of muffins or a sponge layer cake, and the returns are high: you feel disproportionately good about yourself afterwards.
This is what baking, what all of this book, is about: feeling good, wafting along in the warm, sweet-smelling air, unwinding, no longer being entirely an office creature; and that’s exactly what I mean when I talk about ‘comfort cooking’. Part of it too is about a fond, if ironic, dream: the unexpressed ‘I’ that is a cross between Sophia Loren and Debbie Reynolds in pink cashmere cardigan and fetching gingham pinny, a weekend alter-ego winning adoring glances and endless approbation from anyone who has the good fortune to eat in her kitchen.
The good thing is, we don’t have to get ourselves up in Little Lady drag and we don’t have to renounce the world and enter into a life of domestic drudgery. But we can bake a little - and a cake is just a cake, far easier than getting the timing right for even the most artlessly casual of midweek dinner parties.
This isn’t a dream; what’s more, it isn’t even a nightmare." 

Silence contains just words



To meet “Me”


Veer off the national highway onto the prefectural road,
turn left again onto a village road and come to he end
“Me” lives there
It’s a “Me” that is not myself


It’s a modest house
a dog barks at me
some vegetables are planted in the yard
As always I sit on the ledge of the house
a cup of roasted-leaf tea is served
no greetings are offered


I was given birth by my mother
“Me” was birthed by my words
Which is the true me?
I am sick and tired of this topic, but
as “Me” suddenly starts to wail
I choke on my tea


The shriveled breasts of a senile Mom
that’s the dead-end of my birthplace,
says “Me”, sobbing terribly
But as I gaze at the daytime moon in silence
its slowly begins to settle in my mind
that the beginning and the end go farther than that


The day has ended
Listening to frogs
we fall asleep in futons placed side by side
both “Me” and I are now ‘the sparkling dust of universe’

O perdão




Alteramos a máxima cartesiana “penso, logo, existo” para “penso, logo, incomodo” e, às vezes, através de nossos pensamentos nos tornamos  eficientes no auto-incomodo.
Este tema surgiu em conversa entre amigas queridas, mestras da fluidez, da leveza, do ânimo e do entusiasmo e, também, exímias provocadoras de libertadoras catarses - o perdão. 
Parece fácil, não? Afinal, perdoar presume vontade e querer perdoar deveria ser suficiente, mas não é.
Em primeiro lugar considere o indivíduo e seus amalgamas, seus valores e limitações, suas crenças, sua totalidade complexa. O senso comum ou o bom-senso tem sua importância, porém, entre a ofensa ou tristeza recebida e a capacidade de perdoar pode haver um abismo.
Todos sabem que o impacto do mal recebido é proporcional à intimidade permitida e quanto mais íntimo o agressor, mais contundente sua atitude negativa e mais complexo o perdão.
Em segundo lugar considere o arrependimento de quem causou o mal e projete o pior cenário: O causador do mal é incapaz de sentir empatia e não reconhece o prejuízo por ele causado, logo, não sente qualquer arrependimento. 
Ora, se a ofensa foi causada por pessoa íntima incapaz de sentir-se arrependida, o perdão pode situar-se anos luz de distância e para acontecer exigiria os empenhos e desprendimentos da Madre Teresa e da Irmã Dulce somados. 
Como se vê, perdoar pode não ser fácil.
É necessário perdoar? Sim, e esta é afirmação plena de “se" e “depende". Regra geral perdoar é necessário para libertar-se e seguir adiante, embora, é possível seguir adiante sem perdoar. 
Em particular ao cristão que professa a oração primária e nela acredita, a incapacidade de perdoar, no mínimo, gera a incongruência no momento do perdão solicitado: “perdoai as nossas ofensas, assim como perdoamos aos nossos ofensores”, opa! Mas aquela ofensa é imperdoável, então, Senhor, por favor perdoe todo o mal que eu causei e desconsidere a minha incapacidade de perdoar o mal recebido, pedido que poderia ser complementado com a mágoa nossa de cada dia nos dai hoje, pois não? Não é à toa que a incapacidade de perdoar pode prejudicar a própria fé e aumentar ainda mais a abrangência negativa da ofensa recebida: “Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas” (Mateus, 6:14-15) - os que têm fé necessitam do perdão do divino, necessitam perdoar para serem perdoados.
Assim, o dilema persiste e se amplia: Como perdoar quem não se arrepende e como não perdoar se também peço perdão?
O perdão é libertador: Libera o ofendido e lhe retira o mal recebido (ou deveria retirar-lhe o mal recebido) e libera o agressor da culpa. No entanto, o perdão presume o total esquecimento? Ele é incondicional? E a questão inicial: Como perdoar quem não se arrepende? O perdão pode ser confundido com tolerância ou permissão? 
Cá entre nós, se já não bastasse toda a tristeza recebida, você ainda assume a incumbência de resolver todos os dilemas correlatos e as questões filosóficas e éticas que há milênios afligem a humanidade?
Simplifique sua vida e apazigue sua mente com solução solitária e eficaz: Perdoe a você mesmo e liberte-se. Liberte-se da culpa e de todo o sofrimento inútil. Liberte-se. Imagine a quantidade imensa de pessoas que deixam irmãos, amigos, filhos, pais, amantes desaparecem de suas vidas antes de trocarem preciosas palavras de clemência e absolvição, imagine a quantidade imensa de assuntos mal resolvidos que poluem nossa vida emocional, liberte-se. Você mesma pode terminar todos os assuntos dentro de si e isso é essencial. Trata-se de um ritual libertador: Represente mentalmente uma conversa entre almas, o acerto e o perdão celebrado em outra dimensão, ofereça e peça perdão e aos poucos você se sentirá eximida e fora desse acerto, você perceberá que a sua participação no relacionamento negativo findou e com ele terminaram todas as tristezas inacabadas e ocas. E se no futuro surgirem pensamentos e sentimentos tristes, é para o local desse ritual libertador que você os mandará. É para isso que existem os rituais, com eles criamos lugares seguros nos quais descansam nossos sentimentos mais profundos de alegria ou trauma, sentimentos que não precisamos carregar.

Oliver Sacks

sábado, 3 de março de 2012

Padrão de beleza


Em janeiro deste ano, fiquei encantada com a quebra de absurdos parâmetros da foto de capa do magazine M, do Le Monde, feita por Martin Schoeller, de Clint Eastwood com suas rugas, manchas na pele, cabelos e sobrancelhas brancas.
O padrão de beleza e de aceitação atual é, no mínimo, cruel e impõe qualificações pouco ou nada valorosas. Já era tempo de desconsiderar a frivolidade vigente. 


sexta-feira, 2 de março de 2012

Ton Koopman and Jordi Savall - Bach

She faced herself at last, the story runs



A sheet of ocean

I have memories of
buying a sheet of beautiful ocean.
In a market with a ceiling of blue sky
I happened to see a man selling oceans
who, like a carpet merchant, was spreading them out and rolling them up, spreading them out and rolling them up,
though like a landscape seen in an afternoon nap
I can’t clearly remember what the market was like.

I was able to 
go to the ocean, without drowning, balanced,
because like a vessel just launched
I had a brilliantly drawn waterline.
But that lasted only for a while.
When we moved, I rolled it up again
and put it in the shed behind our new house
along with junk and forgot about it.

From the crack by the door of the shed a seagull
suddenly flew up this morning, flapping its wings, to my consternation.
Reviving at this late date — what can I do?
What can I do with the ocean
that has started flooding the backyard
without even giving me time to redraw the waterline that has peeled off?

Kazue Shinkawa

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Diversas

É impossível deixar de apreciar a criatividade dos poucos sonhos que recordo. Imagino que são plenos de simbolismo, alguns de fato são, por isso de complexa análise e interpretação. Embora afirmem que sonhamos todas as noites, mesmo que não lembremos de nossos sonhos, eu considero estranho o aparente vácuo que encontro entre um sonho recordado e outro. 
Mais estranha é a lembrança de sonhos antigos mesclados à situações reais atuais - déjà vu manda lembranças para toda a família. 
O sonho criativo mais recentemente foi a três, quatro dias atrás e é uma pena que eu não possa descreve-lo em detalhes coloridos e bem humorados, por envolver situação e criaturas inusitadas. Ficou a nítida sensação que estive em outro lugar ou minha lembrança também é mantida em outro lugar.


Existem perguntas de formato simples, compostas por duas ou três palavras, que demandam explicações complexas, às vezes, nada lisonjeiras. É triste quando a experiência prevalece e extingue a possibilidade de devir. Algumas motivações e tentativas deveriam ser dispensáveis, inexistir.


Dois fatores inéditos: O tempinho diário dedicado ao exercício da mente e o aprendizado contemplativo. Aos poucos deixo de lado características que eram marcantes e aprimoro minha personalidade em nova cadência. A isso, também, chamam maturidade.


Se a arte imita a vida a vida também imita a arte, mais precisamente o rosto de Alec Baldwin em algumas cenas específicas de "It’s complicated”.


No tempinho de relaxamento comecei a jogar xadrez com o computador ao mesmo tempo que aprendo a controlar a impaciência, eventual desconcentração, a impulsividade e a natural tendência de sacrificar peões e proteger a raínha mais do que o próprio rei. Também passei a resolver palavras cruzadas, utilizar caneta e olhar cada vez menos os resultados. A tudo isso também chamam maturidade.

Imagem de Adrian Sommeling

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Oscar 2012


Eu gosto de assistir ao vivo a  premiação do Oscar, torcer pelos meus favoritos, me emocionar com as reações dos escolhidos, apreciar os mais belos vestidos e smokings, e o raro porte elegante de poucos privilegiados, mas ainda me impressiono com o mau gosto e o exagero que impera.
Meryl Streep e Christopher Plummer eram meus escolhidos, é admirável o trabalho desses dois artistas ímpares. Confesso que a nomeação Max von Sydow, outro excelente ator, me fez pensar em um empate na categoria melhor ator coadjuvante, mas Plummer já merecia esse Oscar desde a sua impecável interpretação de Lev Tolstoi, em “The Last Station”, de 2009.
É na reação e expressão surpresa ou desapontada que os artistas nomeados abandonam as técnicas de interpretação assimiladas e se igualam ao público, tornam-se comuns. 
Outro encanto desse premiação da indústria de entretenimento, que prima pela vaidade, beleza e juventude, foi a disputa inédita e abrangente, que incluiu dois atores octogenários, duas atrizes sexagenárias e dois galãs cinquentenários, todos ativos, bem sucedidos e com vários filmes realizados na última década. Esse não é o padrão do cinema americano e se o Oscar 2012 iniciou nova forma de considerar os profissionais mais experientes, então, há esperança na alteração do nosso próprio comportamento frente à velhice.
Agora, resta a apreciação dos filmes e dentre os premiados dois já haviam chamado minha atenção: “A Separation˜, de Asghar Farhadi, “Saving Face”, de Daniel Junge e Sharmeen Obaid-Chinoy, além do nomeado “Tinker Tailor Soldier Spy”, de Tomas Alfredson com a interpretação primorosa de Gary Oldman. 
A surpresa da noite? Para mim foi ouvir o inesperado “se agapo poli” (eu te amo muito, em grego) dito pelo diretor-roteirista de “The Descendants”, Alexander Payne ou Alexandros Papadopoulos, filho de emigrantes gregos. Para as melhores fotos dos participantes do Oscar 2012 acesse o link da academy awards 

domingo, 26 de fevereiro de 2012

No more clichés

Beautiful face
That like a daisy opens its petals to the sun
So do you
Open your face to me as I turn the page.

Enchanting smile
Any man would be under your spell,
Oh, beauty of a magazine.

How many poems have been written to you?
How many Dantes have written to you, Beatrice?
To your obsessive illusion
To you manufacture fantasy.

But today I won't make one more Cliché
And write this poem to you.
No, no more clichés.

This poem is dedicated to those women
Whose beauty is in their charm,
In their intelligence,
In their character,
Not on their fabricated looks.

This poem is to you women,
That like a Shahrazade wake up
Everyday with a new story to tell,
A story that sings for change
That hopes for battles:
Battles for the love of the united flesh
Battles for passions aroused by a new day
Battle for the neglected rights
Or just battles to survive one more night.

Yes, to you women in a world of pain
To you, bright star in this ever-spending universe
To you, fighter of a thousand-and-one fights
To you, friend of my heart.

From now on, my head won't look down to a magazine
Rather, it will contemplate the night
And its bright stars,
And so, no more clichés.

O que de mais belo soube sempre o disse, de repente, a alguém que não conhecia

Pode ser difícil, conflituoso até, o exercício do “e se” praticado solitariamente, você e seus botões mais falantes, ou em conjunto com alguém que a estima, sincero e íntimo o suficiente a ponto de bem conhece-la e a sua vida.
"E se" eu não tivesse feito aquela escolha, não tivesse adotado aquela atitude, não tivesse dito aquelas palavras, não tivesse agido daquele jeito, não tivesse me omitido, não tivesse deixado de lado aquela coisa, valor, sentimento e tudo mais que  faz parte da nossa vida? 
"E se" eu tivesse considerado minhas expectativas, tivesse sido mais egoísta, tivesse posicionado minha vida em primeiro lugar? 
"E se" eu não tivesse mudado de cidade, de país, de planeta? Costumam ser tantos os “e se”, ainda mais em uma vida plena e independente cujas rédeas estão bem firmes nas mãos, que não raro surgem Cíclopes e Lestrigões imaginários capazes das piores torturas internas, superáveis através dos seguintes entendimentos básicos:
1- Circunstâncias e sentimentos - Com o tempo circunstâncias e sentimentos perdem força, são esquecidos, apesar de serem os fatores que mais influenciam as diversas escolhas feitas ao longo da vida. Portanto, tenha em mente as circunstâncias e seus sentimentos no momento de cada escolha crucial.
Um exemplo banal: Se hoje você tem certeza que aquele par de sapatos caríssimos, de grife internacional, vermelhos com bolinhas roxas e fivelas lusco-fusco são de amargar, certamente, quando os compro você os considerou lindos e a sua cara, quem sabe o melhor investimento do ano e seu passe definitivo para a felicidade. Ora, escolher sapatos é ato de menor importância se comparado com a escolha da carreira, das reações diante da vida, do que se imaginava ser o verdadeiro grande amor.
2- Todos são mestres - Por mais complicado que possa ser considere mestres, professores, todas as pessoas que passaram por sua vida porque, certamente, com elas você aprendeu o que deveria, o que precisava aprender, mesmo o conhecimento anverso, que não deveria ser.
3- O devir - Este tem jeito meio surreal, transcendente, mas acredite que você está exatamente onde deveria estar, do jeito que deveria estar o que, no final, retira pesos, correntes, ônus abusivos e confere especial pertinência à todas as escolhas que a trouxeram até aqui.   

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Ella Fitzgerald & Duke Ellington orch. - Sweet Georgia Brown

Espero que me digam se sou feliz, real, ou simplesmente uma espuma de cinza em muitas mãos

É um exercício imaginar o que você faria se descobrisse que seu bilhete foi premiado no sorteio de algum jogo oficial qualquer e você tem 70 milhões de reais à imediata disposição. Qual seria a sua primeira atitude? Qual seria o seu comportamento? O que eu faria? Bom, por segurança e até que eu providenciasse sistemas protecionais pertinentes e não ostensivos, eu mandaria para bem longe as pessoas que me são mais caras e após receber o prêmio eu também me afastaria por um curto período para melhor pensar. 
Eu teria em mente que qualquer valor tem sua capacidade, logo, uma parte desse dinheiro seria utilizado para gerar mais dinheiro, porque diferente de muitos, eu não deixaria de produzir - a vida é meio vazia sem uma atividade séria e remunerada. Eu negociaria quaisquer pendências, as melhores aplicações e criaria uma associação (ou outra pessoa jurídica qualquer) para prover recursos (materiais, médicos, jurídicos, educacionais) aos mais necessitados e minha opção seria pelas crianças e pelos velhos. Eu não concebo a ideia de receber tanto sem nada retribuir. Seria inadmissível. Eu zelaria por essa associação e cooptaria profissionais éticos e honestos de diversos segmentos para, conjuntamente, realizar a boa diferença. Eu não daria vinda mansa aos meus, mas lhes proporcionaria os melhores meios para, através do trabalho, realizarem seus bons sonhos. Eu faria algumas surpresas, sem dúvida, porque a vida também requer regalos. Eu vigiaria a arrogância para que ela não se instalasse e não perderia a noção de quem realmente sou. Eu faria o esforço necessário para, em detrimento das facilidades, jamais perder a minha capacidade de sentir indignação. Isso tudo se eu ganhasse 70 milhões em algum sorteio oficial qualquer. 
Vocês repararam nos valores citados em filmes antigos? O super bandido demandava alguns milhares de dólares para não contaminar toda a água do planeta; a obra de arte almejada e exposta em um museu famoso valeria, no máximo, cinquenta mil dólares e esse montante garantiria o resto da vida mansa ao personagem ladrão; no filme “The Italian Job”, de Gary Gray, com Donald Sutherland, Mark Wahlberg, Edward Norton e Charlize Theron, aquele, com uma porção de mini Coopers em corrida urbana frenética, sobre o roubo em Veneza de 35 milhões de dólares em barras de ouro, valor que dividido garantiria a aposentadoria e a realização de todos os sonhos de sete malfeitores. Caramba! Em 2003, ano daquela produção, 35 milhões de dólares era muito dinheiro e poderia ser dividido por sete, ou mais, com sobra. Hoje, lemos, sabemos e ouvimos sobre rios de milhões de dólares, de reais, de euros, que insatisfazem, não sete, mas um único ladrão. 
Se por ventura eu aprimorasse o exercício inicialmente proposto e resolvesse vender o meu bilhete premiado, obviamente por um preço bem maior, para quem necessitasse legalizar dinheiro ilícito? Bom, de início eu teria alguma dificuldade para justificar a mudança de status social: Herança ganha? Casamento bem sucedido? Sorte nos negócios? Dinheiro achado e não reclamado não é roubado? A simplicidade costuma ser regra: Fulano ganha x, gasta y, tem patrimônio no valor de w. Se o patrimônio do Fulano ou de seus filhos profissionalmente malsucedidos, os Fulaninhos Júniores, de seus pais humildes, sr. e sra. Fulano de Fulano, irmãos, cunhados, primos e amantes, todos tão humildes quanto os pais, de repente, é inundado por um rio de dólares, reais ou euros, sem um bilhete premiado de algum jogo oficial que justifique tamanha felicidade, então, no mínimo, deveria garantir uma boa explicação.
Não é apenas a deterioração das principais bases de uma sociedade que o rio monetário caudaloso e corrupto garante. Ele também mina o comportamento de cada um de nós e nos torna suscetíveis ao desmando e ao erro. Assim, diariamente a manutenção de máquinas, edifícios, procedimentos também é corrompida. O empresário percebe mais lucro com a venda de produtos contaminados, o funcionário público recebe mais para virar o rosto ou fazer menos, o empregado sabota a máquina para fraudar o seguro e a seguradora não paga o tratamento de saúde devido e pertinente. Os valores aumentam cada vez mais e demandam exercícios imaginativos periódicos: O que você faria se descobrisse que seu bilhete foi premiado no sorteio de algum jogo oficial qualquer e você tem 700 milhões de reais à imediata disposição. Qual seria a sua primeira atitude? Qual seria o seu comportamento? 
     

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

I have a box full of poems about whiteness that tell stories of happiness





The connoisseur


When it came to happiness she was a gourmet,
a connoisseur of small moments and extravagance.
Like a hummingbird, free as jazz, she floated away.


She wasn’t immune to love. But her need to stay
on top of things meant she didn’t rate romance
when it came to happiness. She was a gourmet


of the ungraspable now, savoring on the spot, without delay,
what the rest of us reheat at a bitter distance.
Like a hummingbird, free as jazz, she floated away.


I envied her of course, which isn’t to say
her dance, her casual way, didn’t leave me in a trance.
When it came to happiness she was a gourmet.


To recognize contentment was her gift, her forte,
sipping the nectar from selected instants
like a hummingbird. Free as jazz, she floated away


from me with the old line: 'Is there anything I can say
to make this easier for you?' Not a chance.
When it came to happiness she was a gourmet.
Like a hummingbird, free as jazz, she floated away.


Billy Rambles

Simplificar a vida, ou, a excelência ao alcance de todos

Vejo cafeteiras cada vez mais sofisticadas, fantásticas e algumas preparam cafés gostosos a ponto de, eventualmente, tentarem esta que vos escreve (eu gosto de chás e leite com chocolate). Máquinas que se transformam no centro das cozinhas (quem sabe da casa inteira) e são manuseadas com tamanha destreza, a ponto de demandarem um barista particular para o preparo do cafezinho de cada dia. 
Sem dúvida estamos mais sofisticados e nossa sofisticação nos leva à escolha do melhor vinho, o melhor azeite, a melhor água mineral, o melhor grão de café, a melhor flor de sal e tanta melhoria amplia nosso conhecimento sobre coisas antes impensáveis, ou, desconsideráveis, além de fortalecer nossa ansiedade e complicar a vida. 
Volto às super cafeteiras e a inevitável lembrança que trazem do brick, como há séculos, na Grécia e na Turquia, é chamada a mini panelinha bem barata, com formato diferente, que com água filtrada e café de boa qualidade moído fino, sem erro, prepara o melhor café. Repare bem, cara senhora, caro senhor, para usar essa panelinha à toa não é necessário filtro de qualquer espécie, energia elétrica, tampouco prática e habilidade. E se vocês têm por perto uma tia idosa, também conhecerão o futuro através da leitura mágica da borra no fundo da xícara.

A simplificação da vida é exercício saudável, necessário e nos remete ao passado. Hoje, graças à complexidade que nos impusemos, a excelência é sobrecarga

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Caetano Veloso, un vestido y un amor

Eu fui às touradas em Madri e quase não volto mais aqui, para ver Peri beijar Ceci

Tirolesa, bailarina, havaiana, que atire o primeiro punhado de confete quem na infância não participou da folia carnavalesca.
Eu gostava das brincadeiras, da guerrinha de água com bisnagas plásticas, dos confetes jogados para o alto e do desenrolar rápido e meio mágico das serpentinas. Eu gostava do banho de piscina depois da algazarra e também gostava de saber que meu pai andava por perto para proteger a filha amada.  
Depois, o carnaval transformou-se no tempo dos quereres, a quase obrigação de viajar para longe do corre-corre de São Paulo, ou mesmo do Brasil, até encontrar o melhor motivo para correr para o Rio de Janeiro, na contracorrente do próprio carioca, que corria para Itaipava, Búzios e, sim, algumas vezes também seguir o fluxo dos que  saíam do Rio no carnaval. Aquele foi o tempo que perdi o sotaque meio europeu, uma parte do jeito tão peculiar de filha dos meus pais, um punhado da atávica (e aparente) frescura e aprendi a gostar de bolinhos salgados e cerveja gelada em alguma praia paradisíaca perto de Paraty, e dos bolinhos de aipim com camarão do Bracarense no final de um dia inteiro de praia. Céus! Bem lembro que pensei a primeira vez: Se a minha mãe me visse nesse boteco... Eu gostava do Rio, do jeito da cidade, dos passeios, da diversão, das pessoas, do relaxamento, do bem-querer e do amor. Eu adorei quando fui ao ensaio de uma escola de samba tradicional (escolhida à dedo por quem sabia, para a perfeita segurança e aproveitamento da princesa greco-paulista), quando fui ao desfile na Sapucaí - aquele espetáculo foi arrebatador, quando acompanhei um bloco alegre em Ipanema e também ao curtir os divertidos e desengonçados jogadores de volei de praia, homens grandes, barbados e másculos, todos vestidos de mulher a brincar na areia de Copacabana. 
Hoje, não acompanho a movimentação nem resultados de desfiles, e o carnaval é a deliciosa oportunidade de reaver a minha cidade, a São Paulo vazia, que nessa época tem o ritmo das décadas de sessenta e setenta, do bom tempo da infância.
Aos poucos o carnaval transforma-se em metáfora de vida.   

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Each drop of ink contains a fair supply



A bunch of 52 keys 

Lights
Camera
Action!
Let’s peep through the first keyhole.
This key doesn’t fit.
This one is too rusty.
Throw it away, far away.
This key is in Saturn.
Unhook all the red keys.
This one wrapped in rubber
Doesn’t show where it’s from.
A key will bend when upturned suddenly.
A key found on a street is never useful.
A useful key, you never find on a street.
Dukkha is a woman who has dropped her key.
You cannot open it with dukkha, only with a key.
Old keys, in bunches of four, three, two.
Leave this for the man with swine rabies.
Reserve these for others with a similar condition.
A car key for a car.
A free key for a free rider.
A key is not a toy.
Wait
Let’s begin at the beginning,
Let’s peep through the first keyhole.
This key doesn’t fit.

Maung Pyiyt Min


(Imagem obra de Georgia O’Keeffe)