terça-feira, 15 de julho de 2008

Pronto-socorro

No pronto-socorro encontramos médicos generalistas e habitualmente experientes, que conseguem diminuir o mal estar e determinar a realização de exames imediatos, com diagnósticos rápidos e eficientes. O resultado de um hemograma, que pode demorar até uma semana, no pronto-socorro é definido em uma hora. Enquanto escrevo penso quando foi que inventei a moda de ir ao pronto-socorro sozinha e com tristeza me lembro que foi quando voltei para minha cidade e sem qualquer auxílio tive que enfrentar situações muito ruins. Aprendi o caminho e os procedimentos. Aprendi a fingir ser forte e a ter paciência.
Fato é que passei muito mal no escritório e com muito esforço consegui dirigir até minha casa. Tentei descansar, minimizar os efeitos e na manhã seguinte, fui ao pronto-socorro para descobrir o motivo e diminuir tanto mal estar. É óbvio que minha intenção era em seguida ir para o escritório, por que não admito que, às vezes, uma pausa é necessária.
Fiquei sob cuidados médicos por quatro longas e cansativas horas, com direito à glicose, dramin e cloridato de ranitidina direto na veia. O dramin deixou minha voz pastosa e lenta; deixou minha mente lenta e isso me fez sentir considerável angústia, porque eu estava sozinha e queria permanecer atenta.
Não sei por que a enfermeira – céus! que enfermeira – insistiu que deveríamos ficar lado a lado, na sala de enfermagem, enquanto seus incompetentes assistentes empreendiam a busca por nossas veias. Não sei por que também, presumem que todas as pessoas tenham a mesma tolerância e reação diante de agulhas, que são incompatíveis com qualquer parte do corpo humano. Ainda penso qual a melhor maneira para esclarecer a aquela senhora, que a paciente que estava ao meu lado e zelosa perguntou se o medicamento que lhe foi receitado não agravaria seu estado de “pré-diabética”, não brincou quando insistia em dizer que “estava tudo escuro”, quase vomitou, demonstrou claramente sua reação sofrida à medicação e desmaiou. Pelo amor de Deus, tire a agulha da moça! Espera o quê, minha senhora? Tire a agulha da moça! E a maldita agulha ainda ficou por um tempo, enquanto nós éramos retirados para a sala de repouso, onde deveríamos estar desde o começo, para que cuidassem da infeliz. Quase meia hora depois, a moça pré-diabética saiu inconsciente da sala de enfermagem, deitada em uma maca, sem qualquer agulha espetada em sua veia. Finalmente, tiraram o medicamento.E ela estava sozinha!

Quem me conhece sabe como me senti e qual seria minha reação. A droga é que o dramin me deixou prostrada. Eis o principal motivo da minha angustia: Senti-me responsável por aquela mulher, inconsciente e só Deus sabe com quais danos decorrentes do medicamento mal indicado. Quis ir até os fundos daquele pronto-socorro e encontrá-la, saber como estava, chamar alguém seu conhecido, ajudar, não deixá-la sozinha e desamparada nas mãos daqueles profissionais.
Na sala de repouso, frasco de glicose e complementos pendurado no teto, observei uma garota japonesa que dormia, enquanto o seu próprio frasco se esvaziava. Nenhuma assistente de enfermagem, ninguém. Quando o líquido do frasco dela terminou, peguei meu frasco do suporte e fui chamar a assistente de enfermagem para ajudar a garota.
O meu celular tocou, tive que atender por conta do barulho e me angustiei mais ainda por que eu não conseguia formar uma sentença completa.
Lembrei muito do pôster que havia em qualquer hospital e consultório no meu tempo de garota: A enfermeira bonita, com chapeuzinho branco e uma cruz vermelha, o dedo indicador encostado nos lábios a pedir silêncio. Pois silêncio é palavra desconhecida da gritante enfermeira e de suas assistentes saltitantes. Salto de borracha silencioso? Nunca ouviram falar. Toctoctoctoctoc, o maldito barulho do salto alto da assistente de enfermagem, que talvez se sentisse em alguma passarela ou boate, menos num hospital. Em qualquer lugar o barulho daquele salto incomodaria: toctoctoctoctoc, pisava firme a baixinha espevitada vestida de branco. Sob o efeito dos medicamentos, voltei à sala de enfermagem para que tirassem a agulha. Lá estava a enfermeira ocupada a preencher papéis. Quando uma das assistentes começou a tirar os esparadrapos, imperativa ela a impediu e ordenou: “Deixa que dessa moça eu tiro”. Naquele momento eu não entendi o motivo de fazer-me esperar mais ainda, muito menos da atenção desnecessária daquela senhora. Pois, enquanto ela tirava a agulha me olhava direto nos olhos e tentava me convencer com as seguintes palavras: “Sabe aquela moça que passou mal, foi medo da agulha, viu? Ela está bem e tem medo de agulha, entendeu?” Entendeu?
Escrevo e exponho neste espaço, com a esperança que a moça pré-diabética esteja bem, leia blogs e responda: Passou.
Imagem de Friedlander

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