Sermos conscientes da magnitude de tudo que emanamos, do jeito que emanamos, das reações que causamos é o primeiro degrau de uma escada chamada vida (parafraseando o famoso verso de e e cummings).
Quando acordo triste, cansada, desanimada, consequencias diretas da noite mal dormida, do excesso de horas trabalhadas, de alguma discussão desnecessária com pessoa por mim amada, de alguma preocupação, da carinhosa vigília se meu filho ou o cão estão tristes ou doentes, da tradução seguida pela livre interpretação que faço dos resultados de certos exames aos quais me submeto antes de apresentá-los aos médicos, das injustiças que vejo diariamente, da incompetência que vejo habitualmente (adquiri especial aversão pela incompetência, principalmente, a incompetência conhecida e disfarçada), da perda constante de nossa capacidade de nos indignarmos.
Quando acordo triste, cansada, desanimada, identifico meu estado e faço pequenas coisas para melhorar meu jeito e rezo e ouço música e presto atenção em detalhes pelo caminho que faço e me esforço para sorrir e dizer o primeiro bom dia e me concentro para realizar o melhor trabalho e almoço sozinha porque preciso guardar energia e grande parte da nossa energia é gasta ao falar. E nesses almoços tenho o prazer de conhecer pessoas novas que oferecem suas mesas, que se sentam à minha mesa e com elas sempre aprendo algo, reconheço o necessário e recebo sinais fundamentais. Sempre recebemos presentes diários, sempre.
Sei que uma palavra meio torta minha, um olhar mais duro, um sentimento negativo afetará alguém que, por sua vez, afetará outro alguém e assim por diante. Por isso, o segundo degrau da mesma escada é o constante esforço pela gentileza.
Não concordo com o que dizem sobre o nosso comportamento depender do comportamento do outro ("meu comportamento depende do seu", ou coisa parecida) e garanto que não gosto que façam qualquer ingerência sobre minha vida ou meu jeito.
Ouço gritos, não respondo com gritos por que não gosto de gritos, nunca gostei. Não estou acostumada a gritos e nunca estarei. Agressão e maltrato não fazem parte da minha essência. Portanto, minha reação não depende da ação recebida e sempre haverá o esforço da gentileza.
Duas vezes, na volta do almoço, encontrei uma senhora que tentava locomover-se em sua cadeira de rodas pelas calçadas esburacadas e irregulares da região próxima à avenida Paulista. Uma cadeira de rodas sem os aparatos e facilidades dos modelos motorizados que mais parecem mini carros de golf. É com esforço que sozinha ela movimenta as rodas com as próprias mãos. O que essa senhora com certeza não precisa - e ninguém mais precisa - é de um pedestre de terno e gravata que caminha bem rápido, sem qualquer cuidado e quase a tira do caminho. Foi incrível a atitude daquela criatura. Incrível. Não é o traje que faz a pessoa boa, nem a torna gentil.
Falta-nos o mínimo de gentileza para começarmos a transformar este mundo num lugar melhor.
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